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Montezuma Cruz

Plantio direto favorece o agroextrativismo no Pará


 
 

MONTEZUMA CRUZ
Agência Amazônia 

 

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ALTO GUAJARÁ, Abaetetuba, PA – A vitrine do sistema de plantio direto de base agroecológica para agricultura familiar da Embrapa Amazônia Oriental fica aqui, a 80 quilômetros de Belém, no Baixo Tocantins. Esse modelo, concebido pelo pesquisador Otávio Lopes, 62 anos, surgiu para melhorar a fertilidade do solo, com a imediata interrupção do sistema predatório de derruba-e-queima da mata virgem ou da capoeira (mata secundária), característico do cultivo na Região Amazônica.

O sistema é adaptável a várias regiões brasileiras. Dependendo das condições de cada lugar, é possível utilizar outras espécies vegetais, diferentes de leguminosas, para formação de palhada. Plantio direto favorece o agroextrativismo no Pará - Gente de Opinião

É preciso anotar rápido para acompanhar o raciocínio do engenheiro florestal com Ruy Rangel Galeão, 48. Com mestrado em silvicultura e manejo florestal, ele está acostumado a mostrá-la todos os meses para visitantes de diferentes regiões brasileiras. 

"Venha cá conhecer o nosso banco de germoplasma para multiplicação", ele convida. "Por mim, isso tudo ia pro chão, mas o meu filho fez um curso na Emater e veio com essas idéias de não queimar e fazer o plantio direto", conta Juarez Simões da Silva, 61, sete filhos e 13 netos. "Mudar eu sei que é difícil, mas a gente muda", afirma esse fabricante de farinha amarela, da qual se orgulha. "Olha, poucos acreditavam nesse negócio de associação; só cinco acertaram de verdade", ele conta. Ele vende a farinha a R$ 1,10, a mesma que chega ao mercado a R$ 1,70. 

Plantio direto favorece o agroextrativismo no Pará - Gente de OpiniãoQuando voltou do curso na Emater-PA, Edson Alves da Silva, 32, filho do agricultor, viu-se vítima de chacotas entre os detentores da tradicional roça brasileira neste pedaço da Amazônia. "Eles falavam que eu era doido e que nada do que aprendi ia dar certo". 

No lote de 120m x 95m de seu Juarez vem sendo plantadas 10 mil mudas de ingá-cipó no espaçamento 0,5m x 05m. Ao lado estão as linhas de cultivares de mandioca Baía Maranhense 24, Potu, Mari, Pretinha, resistentes a doenças, mas em menor proporção nos solos encharcados. É o plantio de mandioca testemunha. Bem próximo fica um viveiro de 12,5m x 45m, com poço d'água, de onde saem tubetes e mudas para outras regiões do estado.

No sítio também trabalham, associados ao plantio direto agroecológico, Raimundo de Nazaré, 50, e Gutenberg Simões da Silva, 67, irmão de seu Juarez. A derrubada feita no entorno desse mandiocal e das ingazeiras proporcionou 150 toneladas de cobertura verde, que facilitam a rotação de cultura. Mas a fertilidade do solo só é medida ao longo do tempo, explica o pesquisador Galeão.

Parar de desmatar e queimar é uma ordem, e ela vem de um dos mais ousados pesquisadores da Embrapa Amazônia Oriental: Otávio Manoel Nunes Lopes, mestre em solos e nutrição e hoje, mais do que nunca, conhecedor das vantagens agronômicas das espécies leguminosas ingá e Acacia mangium, que crescem rápido e produzem uma fartura de biomassa. "Na agricultura familiar existem diferenças: uns tem acesso a tecnologias, outros não; no Pará, 10% têm acesso, porque dispõem de alguma infra-estrutura, enquanto 90% não possuem insumos modernos", ele adverte, num discurso anti-degradação. Plantio direto favorece o agroextrativismo no Pará - Gente de Opinião


Ingá agora é fertilizante orgânico
 

ABAETETUBA – Nativa, a ingá só dava fruto. Hoje ela serve como adubo ou fertilizante orgânico. O sistema de plantio direto utilizado no Brasil costuma ser aplicado à agricultura empresarial e não à familiar, lembra Lopes, sem, no entanto, fazer comparativos entre os sistemas utilizados nas regiões sul e centro-oeste. A repetição do ciclo com procedimentos adotados desde o primeiro ano faz o plantio de ingá exigir 20 mil mudas/ano, informa.

Cortada com um ano, ela produz 160 toneladas de massa verde por hectare e 70 t de massa seca para a melhoria do solo. Em cima da palhada é que se planta a mandioca. Em solo com água, observa Lopes, já se obteve 88 t de raiz/ha da cultivar Maranhense 2, sem adubação química.

O sistema de plantio direto sobre a palhada de leguminosas na Amazônia, um método suficientemente capaz de proteger e recuperar o solo e de proporcionar melhor qualidade de vida às pessoas. "Esse método representa menor custo com mão-de-obra e insumos", proclama o pesquisador. O plantio direto agroecológico permite a rotação de culturas de subsistência. De cada mil pequenos, cem têm acesso à mecanização. 

Por ser agroecológica, emprega soluções naturais sem a utilização (ou utilização mínima, quando indispensável) de insumos como mecanização agrícola em todas as fases dos sistemas de produção, corretivos da acidez do solo, fertilizantes químicos, inseticidas, fungicidas e herbicidas. "A produtividade aumenta graças ao efeito benéfico causado no solo pela matéria orgânica resultante da decomposição das palhadas", explica. Lembra que a matéria orgânica deve ser prioridade no manejo de solos tropicais.

"Alguns doutores visitantes falam aqui no Pará em sustentabilidade; nós a praticamos". Lopes prevê para brevemente a obtenção de sementes de ingá no próprio local de produção, "livrando o agricultor da situação penosa". "Mudar cabeças se faz, conhecendo primeiro o homem que está no campo, pronto para absorver conhecimentos", alerta. Finalmente, uma previsão: "Só haverá saída quando o agricultor não precisar mais de nada, nem do trator". 

Plantio direto favorece o agroextrativismo no Pará - Gente de Opinião
ENTENDA AS ESPÉCIES

● Acácia (Acácia mangium) é uma nova árvore capaz de produzir madeira de excelente qualidade, crescer 5m por ano ou 321,93 m³/ha em 5 anos e produtos apícolas e tanino de boa aceitação nos mercados nacional e internacional. Na Índia, a espécie vem sendo empregada em substituição à Teca (Tectona grandis), com vantagem e maior lucratividade. Rende até US$ 91.856,75 por hectare, desconsiderando o aproveitamento da madeira de desbaste, do tanino, do mel extraído das folhas e flores, da própolis, da cera, da geléia real e da forragem das folhas que contém 41% de proteína.

Sua madeira é largamente utilizada nas indústrias de base florestal para a fabricação de papel e celulose; móveis de excelente qualidade, portas, carvão, MDF, madeira-cimento, aglomerados, laminados, tábua de fibra de madeira e cimento (WWCB), OSB e moradias, a exemplo do que vêm sendo feito nas Filipinas. O reflorestamento de Acacia Mangium permite a recuperação dos solos degradados e impróprios para a agricultura. 

Plantio direto favorece o agroextrativismo no Pará - Gente de Opinião● Ingá-cipó (Ingá edulis) é uma árvore de tronco curto e copa ampla quando cultivada na floresta pode alcançar até 15 metros de altura. Tem folhas compostas e flores pequenas branco-esverdeadas. O fruto é linear, alongado como uma vagem (pode alcançar até 1m), cuja polpa, além de abundante, sendo branca, é doce, macia e algo fibrosa. Frutos muito refrescantes e doces.

Sementes pretas. Frutificação durante a primavera e verão. Na Amazônia e na Mata Atlântica as ingás são árvores gigantescas habitadas por inúmeros pássaros e insetos variados. É ótima para compor reflorestamentos e para fazer sombra refrescante para as pessoas que tem pressa de terem árvores grandes.Também é usada na medicina caseira, com utilidade no tratamento da bronquite (xarope) e como cicatrizante (chá).

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Fonte: Montezuam Cruz - Agênciaamazônia é parceira do Gentedeopinião e do Opinião TV.

* O conteúdo opinativo acima é de inteira responsabilidade do colaborador e titular desta coluna. O Portal Gente de Opinião não tem responsabilidade legal pela "OPINIÃO", que é exclusiva do autor.

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