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Programa Mais Médicos: o consenso de uma só parte


Antonio Carlos Lopes - Diretor da EPM/Unifesp e presidente da SBCM*

Dias atrás, os ministros da Educação e da Saúde se reuniram em Brasília com diretores de escolas de medicina federais para apresentar relatório, elaborado pela comissão de especialistas do MEC, liderada pelo Prof. Adib Jatene, referente a itens da Medida Provisória 621/2013. Tendo lugar à mesa diretiva, por ser coordenador do Fórum Nacional de Dirigentes de Escolas de Medicina das Instituições Federais de Ensino Superior (FORMED/Ifes), pude fazer uma análise crítica do desenrolar do encontro.

O que era para ser um fórum democrático para discussões de ideias e revisão de equívocos do Programa Mais Médicos ganhou rumo inesperado. Com pompa e circunstância, o MEC e o MS anunciaram a desistência de ampliar o curso de medicina de seis para oito anos de duração, sendo a residência médica obrigatória na atenção básica e urgência e emergência nas áreas de Clínica Médica, Cirurgia, Ginecologia e Obstetrícia, Pediatria e Saúde e Comunidade.

Assim sendo, a residência médica se caracterizaria como uma espécie de serviço civil obrigatório, meta que há muito tempo tentam alcançar sob severas críticas da academia, das entidades médicas e de diversas outras forças democráticas do Brasil. Não satisfeitos, divulgaram publicamente que teriam aprovação unânime dos presentes à reunião. Isso não corresponde à realidade, uma vez que o FORMED recebeu parecer da Congregação de inúmeras faculdades de medicina deixando claro posicionamento contrário aos vários aspectos apresentados. De fato, quase que por unanimidade, aconteceu o oposto do que foi divulgado na mídia.

Mesmo que concordássemos, o aval ao governo jamais poderia ter saído de forma instantânea. Na reunião, tínhamos apenas diretores de faculdades públicas de medicina. Somos somente representantes da comunidade universitária e não podemos tomar uma decisão desse porte sem a consulta e aprovação de nossas congregações, órgãos máximos das escolas médicas.

Não poderíamos esperar nada diferente, afinal nos defrontamos hoje com uma série de propostas desconexas e perigosas que ameaçam desconstruir o Sistema Único de Saúde, ao invés de resgatá-lo.

A criação do serviço civil obrigatório para residentes tem outro nome para nós: exploração de mão de obra barata. Denota total falta de competência na elaboração de políticas consistentes para a saúde e evidencia que o governo só faz recorrer a improvisos em vez de traçar um projeto consequente a médio e longo prazos.

Do ponto de vista jurídico, seria necessário que os constitucionalistas se manifestassem, uma vez que a Constituição confere ao médico o direito de exercer a Medicina sem títulos de especialista ou mesmo residência médica.

Atitudes como essas têm sido duramente criticadas pelas entidades médicas e particularmente pela academia. São tão graves quanto conferir ao médico a responsabilidade de fazer saúde isoladamente, incumbindo a ele também a função de construir as paredes do ambulatório. Sozinho ele não faz milagre. Seu trabalho exige uma infraestrutura compatível para que seja dado o mínimo de atendimento médico. Adicionalmente, clama-se pela participação de outros profissionais da saúde na formação de uma equipe multidisciplinar, para que a medicina possa ser ao menos razoável.

Não é difícil entender o porquê das críticas das entidades e da academia, que realmente exercem a Medicina nos vários locais do país. Encaminhar médicos recém-graduados a regiões que não possuem as condições mínimas para o atendimento médico é expô-los a erros de diagnóstico, além de jogar dinheiro público pelo ralo. A Comissão Interinstitucional Nacional de Avaliação do Ensino Médico (CINAEM) há anos atestou que o médico, ao final da sua formação, não têm condições de exercer a Medicina. O aprendizado que se busca para o residente, ou seja, conhecer o SUS e reviver a cidadania, não vem cumprindo seu objetivo. Para mudar esse quadro, o que precisamos é atuar na formação do profissional, atualizando e flexibilizando o currículo médico.

Já colocamos essa tese publicamente: uma alternativa seria criar um sistema em que os municípios interessados, após se inscreverem no Ministério da Saúde, recebam a visita de representantes de uma comissão avaliadora – formada por elementos do governo, entidades médicas e sociedades de especialidade – para conferir se a cidade possui as exigências imprescindíveis para o trabalho do médico. Dessa forma seria possível documentar o retrato do SUS local, o que apontaria os investimentos prioritários para quem tem competência.

Outra opção é formular um programa em que todos os formandos em Medicina em colaboração com as Forças Armadas contribuíssem para o SUS. Já fazemos isso na Escola Paulista de Medicina, sendo que nossa mais recente força tarefa realizou 1500 consultas e 150 cirurgias, em 15 dias, mas com preceptoria responsável e de excelência.

Aos residentes que o MS tenta obrigar a trabalhar no SUS, o governo idealiza a preceptoria à distância, uma proposta que jamais funcionará. Ser preceptor é uma função de extrema seriedade e importância, e não pode ser estimulada somente pela remuneração.

*Prof. Dr. Antonio Carlos Lopes, presidente da Sociedade Brasileira de Clínica Médica (SBCM) e diretor da Escola Paulista de Medicina 

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