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Ballet numa casa de Pagode


 Ballet numa casa de Pagode - Gente de Opinião

Professor Nazareno* 

Mesmo sendo uma cidade considerada como o fim do mundo, Porto Velho, a esquecida e imunda capital das “sentinelas avançadas” por incrível que pareça recebeu uma companhia de balé internacional para uma inédita apresentação de apenas uma noite. O Russian State Ballet, uma seleção dos melhores bailarinos profissionais da Rússia, fez uma magnífica apresentação na capital dos rondonienses. Até aí tudo absolutamente dentro da normalidade uma vez que a embaixada russa em Brasília, assim como o Ministério do Exterior daquele país, tem como objetivo incentivar e popularizar esta dança em todo o Brasil e por isso este evento deverá percorrer todas as outras capitais brasileiras. O ineditismo do fato, no entanto, foi a escolha do local de apresentação do espetáculo: a Talismã 21, uma renomada casa de shows na periferia.

Considerada como uma das melhores casas de espetáculos de toda a região Norte do país, a Talismã 21 já deu mostras de sua notória competência e organização, não só para shows artísticos, mas principalmente para festas de formaturas e outras solenidades de grande porte. O problema é que a cidade de Porto Velho tem teatro. Logo dois: o Banzeiros, da Prefeitura Municipal e o outro “o maior teatro sem alvará do país” localizado na Esplanada das Secretarias bem no centro da capital. A companhia russa de dança deve ter estranhado o fato de ter que se apresentar em uma casa “pouco convencional” para esse tipo de espetáculo. Aliás, em quase todas as outras capitais, os russos se apresentam em amplos teatros e Centros de Convenções, coisas raras aqui. E mesmo sem entender balé, todos ali preferiam Tchaikovsky a barulhentas centrais de ar.

Mas valeu a pena, mesmo com uma hora de atraso e sentados em cadeiras de plástico. Numa cidade onde pagode, toada de boi-bumbá e músicas caipiras, o famoso “sertanojo” universitário, dão o tom musical das quentes e tristes noites, qualquer atração diferente já nos traz curiosidades. Apesar do alto preço, havia muita gente. Incrível, mas portovelhenses curtindo ballet deve ser coisa do outro mundo mesmo. Por isso, na entrada da casa de shows, viam-se vendedores ambulantes e também pessoas comuns, todos curiosos, perguntando o nome do pagodeiro que estava cantando. “Não é cantor de pagode, não, maninha!”, dizia a espantada piriguete com sua roupa curta. “É um monte de gente dançando como se fossem aquelas apresentações de Boi”, disse. Aí, outra matuta completou: “é Boi, sim. Até ouvi uma toada. Deve ser o Corre Campo”.

Numa “currutela” que nunca valorizou cultura nenhuma, uma vez que o Arraial Flor do Maracujá jamais teve lugar e data certa para acontecer, as festas juninas são geralmente realizadas em setembro ou outubro e o carnaval é no meio do ano, realizar um glamouroso espetáculo de ballet fora de um teatro de verdade é algo perfeitamente aceitável. Fatos bisonhos dessa natureza combinam com Rondônia, com seu povo e com suas autoridades: Porto Velho tem uma ponte, mas sem iluminação. Tem um Espaço Alternativo para caminhadas, mas está inacabado e também às escuras. Tem vários viadutos, mas como não foram terminados, estão apenas enfeando ainda mais o que já era feio e cujas carcaças estão para cair em cima dos transeuntes. Dançar “O Lago dos Cisnes” por aqui é como jogar pérolas aos porcos. Espero que os nobres bailarinos russos não tenham sido obrigados a tomar tacacá ou a comer angu com banana frita.

 

*É Professor em Porto Velho.

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