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Inovação pede risco, mas venture capitals seguem resistentes


Inovação pede risco, mas venture capitals seguem resistentes - Gente de Opinião

Todos gostam de falar em inovação. Mas, na prática, boa parte do mercado ainda joga pelo seguro. Segundo levantamento da Abstartups (Associação Brasileira de Startups) em parceria com a Deloitte, 65,1% das startups no país nunca receberam nenhum aporte externo. Os fundos de venture capital, apesar de cumprirem um papel relevante, têm se mostrado pouco dispostos a assumir riscos no Brasil. Em conversas que tenho pelo mercado, noto a preferência por parte dos fundos em ingressar no processo quando já há mais sinais de segurança no negócio. Ou uma disposição de investir pouco, devido aos riscos apresentados.

A tentativa de eliminar riscos desde o início acaba restringindo o espaço para ideias genuinamente novas. Essa busca por segurança penaliza a criatividade e sufoca a experimentação, fazendo com que projetos promissores sejam descartados antes mesmo de ganharem forma. O conservadorismo se manifesta tanto na escassez de capital disponível nas fases iniciais quanto na cultura de previsibilidade a qualquer custo.  

Segundo levantamento da plataforma Rentech Digital, empresa especializada em soluções corporativas, o Brasil conta com 53 fundos de venture capital registrados, número que permanece estável desde 2023. A maioria desses fundos está concentrada em São Paulo, Santa Catarina e Distrito Federal. Esses dados ajudam a explicar por que o capital de risco ainda é um recurso limitado para quem empreende fora dos grandes centros ou em estágios realmente iniciais.

Para que a inovação aconteça de fato em nosso país, é necessário ter apetite ao risco e construir uma nova narrativa menos acomodada. A ousadia não deve ser tratada como exceção, mas reconhecida como o motor da inovação. Para isso, é essencial ampliar o debate sobre como financiar e construir startups no Brasil, abrindo espaço para modelos que escapem da lógica tradicional.

Uma abordagem interessante é o bootstrapping, que consiste em sustentar as operações do negócio com os próprios recursos. Embora esse caminho seja mais lento, ele oferece total autonomia aos fundadores e afasta interferências externas que poderiam desvirtuar a essência do projeto. No entanto, essa opção exige um nível elevado de disciplina, domínio de processos e capacidade de gestão — atributos que ainda são escassos em grande parte das startups no Brasil.

Mas quando adotado dentro de estúdios de startups, ambientes estruturados para dar suporte à criação de novos negócios, o bootstrapping ganha mais potência. A organização fornece as condições para que empreendedores construam de forma mais eficiente, com times multidisciplinares, processos bem definidos e ciclos curtos de validação. Mesmo em um ecossistema que ainda oferece pouca margem para o risco, esse formato permite que novas ideias ganhem vida, evoluam e se testem com agilidade. 

Também vale destacar o seedstrapping, uma via intermediária entre o investimento-anjo tradicional e o bootstrapping. Nessa modalidade, um pequeno grupo de investidores entra com capital logo nas fases iniciais da ideia, mas também atua diretamente no desenvolvimento do negócio. Em vez de serem apenas financiadores, esses investidores se tornam parceiros estratégicos. A lógica por trás: é preferível construir ao lado de poucos sócios comprometidos do que depender de rodadas de captação que, muitas vezes, não saem do papel. Relatório da Carta, plataforma norte-americana especializada em gestão de ações para startups, mostra que apenas 15,5% das startups que levantaram uma rodada seed em 2023 conseguiram avançar para uma rodada Série A em até dois anos.

O ponto aqui não é negar a importância do venture capital, mas reconhecer que, em seu formato atual, ele contempla apenas parte do ecossistema. É preciso abrir espaço para alternativas que ampliem o acesso à construção de novos negócios, especialmente nos estágios iniciais, onde a margem de risco ainda é alta e a previsibilidade, baixa. Fornecer acesso não é só despejar capital. É criar as condições certas pra que ideias tenham o direito de existir antes de provar qualquer coisa. Optar por novos modelos de investimento é, na essência, apostar em novas formas de construir. E isso começa com uma mudança de perspectiva mais aberta, mais corajosa e mais comprometida com a criação.

*Bruno Perobelli é head de investimentos no theGarage

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