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Artigo: OS MUPPETS E O BRASIL


 
Bruno Peron Loureiro

 Nenhum outro programa de televisão, por mais mirabolante que seja, despertou-me tanta atenção e encanto como a série “Os Muppets” ou “The Muppet Show” do nome original. Sempre me apressava para sintonizar o canal e vislumbrar os novos episódios na minha infância. Punha a almofada no chão e me acomodava nela. O atrativo era a combinação entre bonecos e seres humanos na mesma cena, que usurpavam o mundo um do outro e confeccionavam uma interação inovadora naquele momento. Fantasia e realidade, imaginação e concretude se confundiam com a atuação dos personagens Caco, Piggy, Fozzie, Gonzo, Animal, entre outros.

E o que esta série tem a ver com o Brasil se nem havia sido criada aqui? O paralelo que traço parte do cenário realista pressagiado por uma professora de português que tive, aos catorze anos, ao afirmar diante dos alunos em uma de suas digressões: “Vocês vão ver cada coisa lá fora...”. Nunca mais esqueci este alerta. Ele teve impacto. A escola é um ambiente de harmonia artificial entre fantasia e realidade. Mais ainda na infância. O que prescrevem as apostilas são frases soltas sobre um mundo em conflito permanente.

A vida lá fora confirma a digressão da minha professora. Penso, entre outras injustiças que se celebram com indiferença, nas desigualdades que assolam o país e no contraste temporal em que vivem os segmentos sociais. Basta percorrer as periferias de cidades médias e grandes para notar a falta de infra-estrutura, o desemprego, o abandono, o significado do racismo e a desinformação. Realiza-se nelas o sonho de possuir carros que há vinte anos somente eram acessíveis a poucos, entre outros bens de consumo que dão a aparência de democratização quando saem de moda e se desvalorizam. Dois mundos que se imbricam.
 
Os avanços tecnológicos e o liame da modernidade tardam para alcançar as maiorias. Um dirige o carro do ano, enquanto outro limpa seu pára-brisa no semáforo e guarda-o contra furtos. A escola privada é para a minoria, enquanto os demais assistem à deterioração da pública, entre outros prejuízos que tem sofrido a garantia coletiva. O sonho de consumo de alguns é praxe para outros. Dizer somente que o Brasil está dividido em regiões é reducionista. O país, em vez, é um arquipélago de vidas que se encontram casualmente, mas não se reconhecem. Os Muppets representam este jogo entre dois universos. Boneco e realidade. Riqueza e pobreza. Inclusão e exclusão.
 
Eu gostava tanto da série, que até me presentearam um boneco do Caco, que é o que tem forma de sapo. O encanto me obrigou a guardá-lo de recordação. Tenho-o até hoje. Porém, o uso excessivo naquele momento, o desgaste do tempo, o reconhecimento da realidade e o desencanto de Caco com o que ia encontrando fê-lo perder os olhos, sofrer uns arranhões, torcer um braço, emagrecer por perder muitas bolinhas de isopor que o preenchiam. O eco da realidade e seu arquipélago o extenuaram. Ainda assim ele resiste. E o Brasil não perde a esperança.

Bruno Peron Loureiro é analista de relações internacionais e latino-americanista.

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