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ARTIGO: A GEOPOLÍTICA DO LÍTIO


 

Bruno Peron Loureiro

O Japão, embora não disponha de riquezas minerais, é um dos países mais poderosos do mundo, enquanto a Bolívia é rica em recursos naturais, mas um país desigual, explorado e pobre. Não urge discutir se é mais um exemplo de ironia da natureza ou de má administração das benesses com que alguns rincões do planeta são presenteados, porém incapazes de recompensar as mesmas terras de onde surgem.

A experiência da América Latina em mineração, com raras exceções, é de uma troca iníqua ou incapaz de materializar-se em retorno como políticas sociais à população, ainda que não só os Estados sejam responsáveis por política nesta área.

É cada vez maior a atenção internacional depositada na crosta salina ou reservatório de Uyuni, de 10 mil km², 180 km de comprimento e 80 km de largura no sudoeste do departamento de Potosi, Bolívia, que é uma das regiões com maior riqueza mineral no planeta. Esta área, que está 3.670 metros acima do nível do mar, possui jazidas de chumbo, prata, zinco, bismuto e resguarda os maiores projetos de mineração da América do Sul.

A informação mais notória, contudo, é de que a “pérola dos Andes” contém as reservas de lítio mais importantes do mundo, além de boro, magnésio, potássio e sal comum. Estima-se uma reserva em Uyuni de 9 milhões de toneladas de lítio, que é considerado o insumo do futuro em tecnologia. Alguns chamam-no de “petróleo do novo século” em referência ao papel deste recurso energético na centúria passada.

Não é à toa que virou moda prognosticar o uso massivo de carros elétricos, que supostamente provocariam menor agressão ao meio ambiente, e cresceu o uso de lítio em baterias de produtos eletrônicos com os que estamos habituados. O lítio é bastante empregado em computadores e telefones celulares, indústria aeronáutica e aeroespacial, e até como agente terapêutico em psiquiatria. É o mais leve dos metais dispostos na tabela periódica.

E como o lítio participa de um tabuleiro de geopolítica? A conhecida divisão internacional do trabalho entra em jogo novamente. Conquanto quisessem os bolivianos assegurar a exploração nacional das jazidas de Uyuni, empresas privadas asiáticas e européias já estão de olho num potencial que poucos são capazes de transformar num produto de alto valor agregado. Restam à Bolívia poucas saídas entre vender o lítio ou deixá-lo soterrado sem rendimento algum.

Porções territoriais de Argentina, Bolívia e Chile na região andina possuem 70% das reservas mundiais de lítio, o que não é nada dispensável em face do aumento do preço desta matéria-prima estes últimos anos. Pergunto por que o Japão, um país tão pequeno, formado praticamente por quatro ilhas no continente asiático, e dependente da importação de recursos naturais para suas indústrias de ponta está tão à frente das nossas “dádivas”, “pérolas” e “preciosidades” latino-americanas?

Hugo Chávez ameaça mover tropas à fronteira da Venezuela com a Colômbia com o objetivo de defesa de uma suposta possibilidade de guerra em resposta ao acordo de uso de sete bases militares deste país pelos Estados Unidos. Enquanto isso, recebi um correio eletrônico de um pesquisador brasileiro cujo acesso foi negado numa reserva indígena em Roraima a menos que dissesse que era estadunidense ou europeu. Falar de política já é ligeiramente amargo, mas a geopolítica nos faz ter que engolir situações intragáveis.

Bruno Peron Loureiro é mestre em Estudos Latino-americanos.

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