Quinta-feira, 6 de novembro de 2025 | Porto Velho (RO)

×
Gente de Opinião

Hiram Reis e Silva

Sítio de Bagé - Parte IV - História, Fatos e Documentos


Sítio de Bagé - Parte IV - História, Fatos e Documentos - Gente de Opinião

Bagé, 30.03.2020

 

Hino da Proclamação da República

(Medeiros e Albuquerque)

 

Do Ipiranga é preciso que o brado

Seja um grito soberbo de fé!

O Brasil já surgiu libertado,

Sobre as púrpuras régias de pé.

Eia, pois, brasileiros avante!

Verdes louros colhamos louçãos!

Seja o nosso País triunfante,

Livre terra de livres irmãos!

 

 

A Federação n° 40

Porto Alegre, RS ‒ Sexta, 16.02.1894

 

 

História do Sítio de Bagé

Fatos e Documentos

 

 

 

Vejamos o que nesta cidade se passava.

 

No dia 30 de novembro, continuaram a chegar aqui fugitivos e dispersados, aliás em pequeno número, que confirmaram as notícias que precedentemente acabamos de dar e dissiparam até a última dúvida que pudesse porventura existir ainda sobre a veracidade da catástrofe.

 

O dia 1° de dezembro, foi assinalado por um fato que seria cômico se não fosse tristíssimo e que veio mais uma vez descobrir um rosto oculto há muito tempo pela máscara da hipocrisia.

 

O vigário desta paróquia, Cônego João Ignácio de Bittencourt, sacerdote a quem a população desta cidade cumulou sempre dos maiores favores dispensando-lhe uma consideração e um respeito talvez imerecidos, pagou a sua dívida de gratidão, escrevendo ao Coronel Carlos Telles a insidiosa e hipócrita carta seguinte, na qual transparecem os seus refalsados sentimentos de rancor político encarniçado, sob uma capa mentirosa de mansuetude, comiseração e amor à humanidade.

 

Eis a carta do Sr. Vigário: 

 

 

Vista Alegre, 1° de dezembro de 1893.

 

Prezadíssimo amigo Coronel Telles.

 

Acho-me aqui junto à cidade e, a par de todos os acontecimentos, tomei a deliberação de lhe escrever e dar-lhe todas as informações sinceras e verdadeiras, porque sou seu verdadeiro amigo.

 

General Izidoro, como deve saber, rendeu-se com todas as forças. General Tavares está forte e tem elementos para tomar Bagé à viva força; posso lhe garantir que ele tem mais de quatro mil homens e estes bem armados e bem dispostos.

 

À vista da resolução em que está toda esta gente vai ser um horror e o amigo como soldado honrado e brioso e que tem sido sempre o amparo deste povo, que o ama como a um bom pai, porque o seu procedimento aí é conhecido por todos, não se deixando levar por gente ruim, portando-se sempre com justiça e cavalheirismo, não pode deixar de ser o mesmo Coronel Telles na ocasião do eminente perigo.

 

Coronel, lembre-se que essa praça tomada a viva força, não se poderá evitar grandes e lamentáveis desgraças e essas incalculáveis. E sendo cala tomada por outro modo, se Poderá conter a tropa e nenhuma desgraça haverá. Afinal de contas o amigo, a meu ver, não terá responsabilidade alguma, e pelo contrário, será louvado o seu procedimento porque vai salvar essa população que o amigo sempre considerou.

 

E depois desiluda-se o amigo que Castilhos não tem feito mais de que arruinar o Estado com mentiras porque ele nunca teve popularidade, encaixado no governo com o auxílio do exército, pois ao contrário não teria um homem por si. Esta é que é verdade. Teve a habilidade de iludir a Floriano a ponto de causar a ruína de todo o Brasil.

 

Não se iluda, Coronel, eles não lhe dizem a verdade, creia que as forças federais estão fortes por toda a parte, convença-se que Castilhos é um verdadeiro déspota.

 

Esta carta não é parlamentar porque ninguém me pediu que a fizesse, é apenas filha do meu coração, e porque confio em sua amizade. Em nome de meus paroquianos, peço-lhe, com os olhos arrasados de lagrimas, que não deixe essa população sofrer. Coronel, o seu nome está gravado no coração dessa população, portanto não o retire.

 

Lembranças do major Borba que aqui está comigo, pois viemos para ver se podemos evitar desgraças.

 

Seu amigo “ex-corde”, Cônego Bittencourt. 

 

O Sr. Coronel Telles respondeu a essa missiva pela seguinte enérgica e digna forma: 

 

Caro amigo Cônego Bittencourt.

 

Saúde e mil felicidades. Recebi sua espontânea carta e agradeço-lhe as intenções que manifesta a meu respeito e a este povo que sempre muito lhe mereceu. Nunca promovi infelicidade a ninguém absolutamente, quanto mais a uma população que eu estimo de coração. A desgraça que eu vejo iminente e que não posso evitar é trazida por outros; portanto a minha consciência está e estará tranquila.

 

Já tive conhecimento do desastre do General Izidoro, que não foi bastante precavido na frente do inimigo. Eu, porém, tenho elementos para resistir e vencer.

 

O amigo bem me conhece e sabe que o meu único dever, como homem, como brasileiro e como soldado do Exército é resistir, resistir e sempre resistir. O Brazil inteiro, o Exército que me tem em seu seio sem mancha até hoje e a minha família, têm os olhos fitos em mim e eu tenho de salvar a honra do Exército.

 

Se morrer na luta, será isso uma felicidade para mim porque, como sabe, eu sou um sentenciado a poucos dias de vida: o meu aneurisma assim mo diz.

 

Aqui fico ao seu dispor, por ser seu amigo velho obrigadíssimo.

 

Carlos Telles.

 

Bagé, 1° de dezembro de 1893. 

 

Nesse mesmo dia o Sr. Coronel Carlos Telles, comovido pela sorte dos soldados feridos do 28° Batalhão e forças civis, enviou à Charqueada uma Comissão composta dos Drs. Pedro Luiz Osório e Veríssimo Dias de Castro e farmacêutico Amado Loureiro de Souza, afim de conseguirem dos chefes do Exército, Federal a vinda para esta cidade dos feridos para receberem aqui o conveniente tratamento.

 

Os dois últimos membros da Comissão regressaram no dia subsequente, 2 de dezembro, trazendo a seguinte carta do Dr. Pedro Osório ao Coronel Telles: 

 

Sr. Coronel Carlos Telles.

 

Vi a coluna federal que se aproxima dessa praça, sob minha honra garanto-lhe que ela compõe-se de 5 mil e tantos homens muito bem armados; além de cem mil a cento e cinquenta mil cartuchos que o Marechal Izidoro entregou aos federais, só a coluna de Cabeda tem outros tantos cartuchos.

 

O meu dever como homem humanitário, como brasileiro e como amigo particular da família Telles é dizer-lhe que toda a resistência é inútil, que o sacrifício de mais vidas me parece um ato inglório e que, diante do impossível o brio do homem fica intacto, mesmo quando depõe as armas.

 

Não é um conselho que dou ao amigo; exponho meu parecer, julgando cumprir um dever sagrado.

 

Dr. Pedro Osório. 

 

O coronel Telles escreveu a seguinte lacônica resposta e ia enviá-la quando se apresentou o mesmo Dr. Osório na Guarnição pedindo-lhe mil desculpas por haver escrito tão inconveniente carta e alegando o estado de agitação em que ficara o seu espírito ao presenciar os horrores que se haviam passado no Rio Negro: 

 

Sr. Dr. Pedro Osório.

Recebi sua carta. Como sabe eu tenho gente para quinze mil homens, e portanto os seus cinco mil são poucos. Arranje mais e volte.

 

Carlos Telles, Coronel. 

 

O Coronel Telles, depois de o contemplar longamente em silêncio, respondeu-lhe que não somente lhe desculpava aquela leviandade, como qualquer outra que porventura viesse a cometer, simplesmente pelo fato de pertencer à família Osório.

 

Na mesma ocasião propôs o Dr. Pedro Osório ao Coronel Telles, e em nome do General Tavares, uma conferência, marcando-se hora e lugar para a mesma. Como, porém, o General Tavares não comparecesse, por não ter sido avisado com tempo, o Coronel Telles dela desistiu, não só por entender que os inimigos não eram dignos de uma tal prova de confiança, como também porque coisa alguma tinha a propor-lhes, [Continua] [A FEDERAÇÃO N° 40]

 

 

 

 

 

Bibliografia:

 

A FEDERAÇÃO N° 40. História do Sítio de Bagé ‒ Brasil ‒ Porto Alegre, RS ‒ A Federação n° 40, 16.02.1894.

 

Solicito Publicação

 

(*) Hiram Reis e Silva é Canoeiro, Coronel de Engenharia, Analista de Sistemas, Professor, Palestrante, Historiador, Escritor e Colunista;

 

·    Campeão do II Circuito de Canoagem do Mato Grosso do Sul (1989)

·    Ex-Professor do Colégio Militar de Porto Alegre (CMPA);

·    Ex-Pesquisador do Departamento de Educação e Cultura do Exército (DECEx);

·    Ex-Presidente do Instituto dos Docentes do Magistério Militar – RS (IDMM – RS);

·    Ex-Membro do 4° Grupamento de Engenharia do Comando Militar do Sul (CMS)

·    Presidente da Sociedade de Amigos da Amazônia Brasileira (SAMBRAS);

·    Membro da Academia de História Militar Terrestre do Brasil – RS (AHIMTB – RS);

·    Membro do Instituto de História e Tradições do Rio Grande do Sul (IHTRGS – RS);

·    Membro da Academia de Letras do Estado de Rondônia (ACLER – RO)

·    Membro da Academia Vilhenense de Letras (AVL – RO);

·    Comendador da Academia Maçônica de Letras do Rio Grande do Sul (AMLERS)

·    Colaborador Emérito da Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra (ADESG).

·    Colaborador Emérito da Liga de Defesa Nacional (LDN).

E-mail: hiramrsilva@gmail.com

* O conteúdo opinativo acima é de inteira responsabilidade do colaborador e titular desta coluna. O Portal Gente de Opinião não tem responsabilidade legal pela "OPINIÃO", que é exclusiva do autor.

Gente de OpiniãoQuinta-feira, 6 de novembro de 2025 | Porto Velho (RO)

VOCÊ PODE GOSTAR

Terrorismo Ontem – Terrorismo Hoje

Terrorismo Ontem – Terrorismo Hoje

Bagé, RS, 04.11.2025 Mais uma vez tenho a honra de repercutir um artigo de meu Mestre Higino Veiga Macedo. “Consentio in genere, numero et gradu” Te

Porque Sou Brasileiro Republicano

Porque Sou Brasileiro Republicano

Bagé, RS, 27.10.2025 Mais uma vez tenho a honra de repercutir um artigo de meu Mestre Higino Veiga Macedo. “Consentio in genere, numero et gradu” Po

Da Natureza do Militar

Da Natureza do Militar

Bagé, RS, 06.10.2025 Mais uma vez tenho a honra de repercutir um artigo de meu Mestre Higino Veiga Macedo. “Consentio in genere, numero et gradu” Da

Ideologias e Seus Restos

Ideologias e Seus Restos

Bagé, RS, 03.09.2025 Mais uma vez tenho a honra de repercutir um artigo de meu Mestre Higino Veiga Macedo. “Consentio in genere, numero et gradu” Id

Gente de Opinião Quinta-feira, 6 de novembro de 2025 | Porto Velho (RO)