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Gente de Opinião

Hiram Reis e Silva

Contestação do TRF


Contestação do TRF - Gente de Opinião

Bagé, RS, 22.03.2019

 


 

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 1ª REGIÃO

Coordenadoria da Quinta Turma

DECISÃO [...]

 

Decido.

 

[...] Aduz que a presente ação visa a buscar o reconhecimento das violações ocorridas e a adoção de medidas para assegurar que o povo Kinja tenha suas memórias valorizadas e os seus direitos reconhecidos.

 

As obras de implantação da rodovia BR-174 AM/RR iniciaram-se em 1968, mediante convênio entre o extinto DNER [Departamento Nacional de Estradas de Rodagem] e o Ministério do Exército. A rodovia foi inaugurada em 1977. Já as obras de pavimentação iniciaram-se em 1994 e foram concluídas em 1998.

 

A Terra Indígena [TI] Waimiri-Atroari foi homologada por meio do Decreto n° 97.837, de 16 de junho de 1989. No parágrafo único do art. 2° do referido Decreto é informado que fica excluída da área da TI a faixa de domínio da BR-174, observado que a rodovia foi implantada antes da homologação da Terra Indígena, da promulgação da Convenção OIT n° 169, como também anterior a nossa Carta Magna de 1988.

 

Em 27 de junho de 1989, foi assinada, em Genebra, a Convenção n° 169 da Organização Internacional do Trabalho - OIT sobre Povos Indígenas e Tribais. Em 19 de abril de 2004, por meio do decreto n° 5.051, a Convenção foi promulgada pelo Presidente da Repú­blica do Brasil, porém a regulamentação dos procedi­mentos de consulta não foi efetivada. [...]

 

À época da implantação da rodovia não havia ins­trumento legal que determinasse o licenciamento ambiental do empreendimento, nem tão pouco pre­visão de consulta a povos possivelmente afetados, uma vez que a Convenção OIT n° 169 só foi assinada em 1989. Logo, a rodovia foi construída com base na legislação vigente à época.

 

Conforme destacado na própria ACP, no caso do julgamento pelo Supremo Tribunal Federal [STF] da demarcação da Terra Indígena Raposa Serra do Sol, uma das salvaguardas é que o usufruto dos índios não impede a instalação, pela União Federal, de equipa­mentos públicos, redes de comunicação, estradas e vias de transporte, além das construções necessárias à prestação de serviços públicos pela União, espe­cialmente os de saúde e educação. Embora o Plenário do STF tenha decidido que a decisão só tenha apli­cação naquele caso, a 2ª Turma já aplicou as salvaguardas em pelo menos dois mandados de segurança.

 

A construção de uma estrada ligando dois Estados do norte do país, região que àquela época não era praticamente servida de estradas de acesso, não pode ser confundida com uma ação de violação de direitos humanos, nem muito menos com um ato de perseguição política. Ao contrário, a obra pública tão debatida caracterizou nítido atendimento do interesse público que permeia a atuação da Administração Pública.

 

Não compete aos povos indígenas, igualmente, definir as políticas públicas a eles aplicáveis, de acordo com seus interesses e desconsiderando o interesse público, da forma como pretendida no item e.7 dos pedidos formulados na inicial.

 

Da leitura do art. 6° da Convenção n° 169/OIT, não se verifica que a vontade das populações indígenas possui caráter vinculante na atuação administrativa e legislativa. Pelo contrário, o dispositivo visa a estimular a participação dos índios, por meio de consulta, repita-se, não vinculante, nos assuntos de seu interesse, ampliando o debate democrático.

 

O Texto Constitucional é claro ao prever que a propriedade das terras indígenas pertence à União, cabendo aos índios unicamente o usufruto das riquezas oriundas do solo, dos rios e lagos. Isso significa dizer que os índios não gozam, em relação às terras, de todos os direitos inerentes ao proprietário, sendo o seu direito sobre elas limitado.

 

A existência da rodovia na terra indígena revela obra e serviço de mobilidade de interesse público, inclusive alinhado ao objetivo fundamental da República Fede­rativa do Brasil consistente em garantir o desenvol­vimento nacional (art. 3°, II).

 

Não há nos autos comprovação clara e convincente quanto aos alegados prejuízos experimentados pelos Kinja, tampouco restou demonstrado que as incursões estatais para construção da rodovia BR-174 se deram por razões de perseguição política ligadas ao regime de exceção.

 

A condenação ao pagamento de indenização por alegados danos materiais e lucros cessantes depende de comprovação, ônus do qual não se desincumbiu o autor, visto que deixou de carrear aos autos documentos apontando o montante dos prejuízos suportados, não servindo, para tanto, pedido genérico de ressarcimento relativo a danos que sequer foram demonstrados. [...]

 

Cabe ressaltar que não há prova nos autos de que locais sagrados, cemitérios e espaços territoriais imprescindíveis de pertencimento ao povo tenham sido impactados pela rodovia; que a há no Brasil 66 Rodovias Federais que interceptam Terras Indígenas; que poderá a decisão agravada acarretar prejuízos ao sistema elétrico nacional, em especial, ao forneci­mento de energia elétrica no Estado de Boa Vista/RR, dentre outros.

 

De igual maneira, descabe a concessão de anteci­pação de tutela de urgência, ou seja, de antecipação do próprio direito, pois inexiste probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo, conforme previsto no art. 300 do CPC.

 

À vista do exposto:

 

A) para defiro o pedido de antecipação da tutela da pretensão recursal suspender a decisão agravada até o julgamento do mérito do presente agravo;

 

B) comunique-se ao Juízo de origem, com cópia desta decisão;

 

C) Intimem-se os agravados para os fins do artigo 1019, inciso II, do Código de Processo Civil/2015.

 

Publique-se.

 

Brasília, 21 de janeiro de 2019.

 

Juiz Federal Leão Aparecido Alves

 

 

Solicito publicação

 

(*) Hiram Reis e Silva é Canoeiro, Coronel de Engenharia, Analista de Sistemas, Professor, Palestrante, Historiador, Escritor e Colunista;

Campeão do II Circuito de Canoagem do Mato Grosso do Sul (1989)

Ex-Professor do Colégio Militar de Porto Alegre (CMPA);

Ex-Pesquisador do Departamento de Educação e Cultura do Exército (DECEx);

Ex-Presidente do Instituto dos Docentes do Magistério Militar – RS (IDMM – RS);

Membro do 4° Grupamento de Engenharia do Comando Militar do Sul (CMS)

Presidente da Sociedade de Amigos da Amazônia Brasileira (SAMBRAS);

Membro da Academia de História Militar Terrestre do Brasil – RS (AHIMTB – RS);

Membro do Instituto de História e Tradições do Rio Grande do Sul (IHTRGS – RS);

Membro da Academia de Letras do Estado de Rondônia (ACLER – RO)

Membro da Academia Vilhenense de Letras (AVL – RO);

Comendador da Academia Maçônica de Letras do Rio Grande do Sul (AMLERS)

Colaborador Emérito da Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra (ADESG).

Colaborador Emérito da Liga de Defesa Nacional (LDN).

E-mail: [email protected];

Blog: desafiandooriomar.blogspot.com.br

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