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Artigo

Sobre o futuro da verdade


Gen Marco Aurélio Vieira  - Gente de Opinião
Gen Marco Aurélio Vieira

“Sem a confiança engendrada pela veracidade da palavra governamental, a democracia perde sua transparência e se vê comprometida, encerrada dentro do segredo e da mentira”

Hannah Arendt, filósofa e teórica política alemã

 

Por volta de 155 a.C., três embaixadores gregos liderados pelo filósofo Carnéades de Cirene chegaram no Senado Romano, para negociar uma multa que havia sido aplicada injustamente por Roma aos cidadãos de Atenas. Carnéades era membro da Nova Academia, antiga trincheira do ceticismo, cujos integrantes três séculos antes foram convencidos por Sócrates da necessidade do seu suicídio, como forma de se livrar de seus argumentos.

Carnéades foi brilhante na defesa, argumentando com veemência a importância da justiça e defendendo que ela deveria ser uma de nossas principais motivações na busca da verdade para a evolução da sociedade. Os romanos ficaram fascinados pelo carisma do orador: a força das alegações, a eloquência do pensamento, a pureza da linguagem e a energia do grego tocaram a todos. Entretanto, não era aquilo que ele queria provar.

No dia seguinte, Carnéades voltou mais enfático. Postulando a doutrina da incerteza do conhecimento, e refutando tudo que defendera anteriormente, ele se contradisse com argumentos não menos convincentes daqueles usados na véspera. Com a mesma retórica, ele demonstrou que a neutralidade e a objetividade do direito aumentam a probabilidade de uma verdade, e conseguiu dissuadir a todos que havia convencido no dia anterior, evidenciando o quanto de reflexão e questionamento é necessário para a pretendida justiça.

Esse incidente continua sendo emblemático pelo impacto que exerceu - e exerce até hoje - sobre gerações de filósofos e teóricos. Carnéades foi um dos céticos dos tempos clássicos, pensadores que professavam algo entendido como “investigação” (significado original de ceticismo), ou seja, o exame rigoroso dos prós e contras de determinada crença ou entendimento postulados como verdade. Eles acreditavam que a busca da verdade traz conclusões com diferentes graus de credibilidade, porque não existem respostas definitivas, mas sim produtos – com maior ou menor probabilidade – frutos do processo de questionar e explorar todas as possibilidades.

O ceticismo, prevalente entre os principais pensadores da Antiguidade, a partir o Iluminismo começou de fato a ser usado como ferramenta jurídica de metodologia crítica, não como um sistema de constatação da verdade, mas para avaliar a plausibilidade das proposições e delimitar o alcance da razão. Embora o advento das religiões monoteístas tenha trazido a crença na singularidade da verdade divina, desde o Século XVIII é a “verdade do mais provável” que prevalece nos dissensos jurídicos. Ao exigir dos juízos averiguações, certezas factuais e provas materiais, o ceticismo inclusive passou a reforçar a tese do "in dubio pro reo" (na dúvida, decide-se a favor do réu), evitando-se sentença condenatórias onde o grau de probabilidade da “verdade” está aquém do razoável.

Contudo, nos últimos cem anos, não só a verdade absoluta do dogma religioso, mas também aquelas verdades factuais dos céticos, foram definitivamente sobrepujadas por episódios de falsos apriorismos, narrativas enviesadas, meias verdades e velhas mentiras convenientes, propaladas por uma seita disfarçada de ideologia que passou a ser conhecida como comunismo.

Surpreendentemente, esse regime concebido por Marx no Século XIX, praticado por Lenin, Stalin, Mao, Fidel, Ortega, Maduro e Xi Jinping, responsável por centenas de milhões de mortes por onde foi vivenciado, tem todos esses procedimentos doutrinários típicos disseminados no Brasil do PT, em pleno Século XXI: a calúnia, a mentira, a desinformação, a deformação, o casuísmo;  a injúria difamatória, o rótulo de fascista, colaboracionista ou até mesmo de genocida, aplicado a todos aqueles que os contradizem; enfim, a afronta imerecida e insidiosa, a negação dos fatos, e o abuso da falta da mínima razoabilidade nas narrativas continuam sendo propalados como verdades pelo nosso Governo, sendo validados por artistas, intelectuais e até a imprensa. 

Na atual “democracia relativa” vigente no nosso país – uma espécie de museu da história natural do comunismo primitivo mumificado – temos Ministros do STF que declaram abertamente “seguir o que Lenin recomendava”, ou que elogiam a capacidade de “fiscalizar as redes sociais” do regime chinês, enquanto o próprio Presidente se orgulha de “ser cada vez mais esquerdista”. Nosso comunismo tabajara capturou a maioria das instituições, e fechou a porta atrás delas. E seguidamente estão nos apresentando suas “verdades”, como a “justa causa de organizações terroristas”, ou a “regulação dos discursos de ódio da internet”, com narrativas e argumentos inverossímeis, quando não ilegais e desumanos.

Quanto de verdade tem uma tentativa de “abolição do Estado Democrático de Direito” desencadeada por uma turba de ambulantes, senhoras idosas e pequenos comerciantes, sem vínculos entre si, sem plano prévio, apoio militar, armamento, ou liderança em campo, em um dia de domingo, e com todos os prédios do Governo vazios?

Qual verdade é possível apurar num processo de escopo indefinido, com as funções de investigação e julgamento concentradas num único magistrado, que tem afrontado seguidamente o sistema penal acusatório, e bloqueado ilegalmente perfis nas redes sociais?

Será que as buscas das verdades sobre a fraude no INSS, ou da provável interferência dos EUA nas eleições brasileiras de 2022, vão receber a mesma sanha persecutória que os acusados da terrível “trama golpista”?

Estão desmerecendo o razoável e desprezando a nossa inteligência, cerceando direitos para “preservar as liberdades”, legitimando decisões ao arrepio do devido processo legal, valendo-se da mentira para fazer “justiça”. 

Cresci em um Brasil onde todos podiam participar da busca pela verdade, sem medo de que essa simples curiosidade pudesse nos levar a uma excomunhão, ou pior, à prisão. Preocupo-me com o futuro de nossos filhos. Receio que quando adultos aceitem naturalmente como verdade esse autoritarismo disfarçado de defesa da democracia. Temo que eles já saibam o que “não devem falar”, porque já viram jornalistas sendo expatriados, Oficiais do Exército com décadas de conduta ilibada presos sem culpa formada, cidadãos tendo suas contas bancárias e de suas famílias bloqueadas por crime de opinião, senhoras condenadas a quatorze anos de prisão por escrever com batom frases sarcásticas – sequer ofensivas – numa estátua em praça pública. No Brasil de hoje, as instituições estão aviltadas pela mentira, e as verdades não passam das vontades de um juiz. 

Só nos resta uma opção: reconstruí-las – instituições e verdades - nós mesmos. Ou não seremos perdoados pelos netos de nossos filhos.

Gen Marco Aurélio Vieira

Foi Comandante da Brigada de Operações Especiais e da Brigada de Infantaria Paraquedista

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