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Gente de Opinião

Hiram Reis e Silva

Contrarrevolução de 64 – Parte XIII


Contrarrevolução de 64 – Parte XIII - Gente de Opinião

Bagé, 10.06.2024

 

Você vê, portanto, que o que há, em toda essa questão agrária, é muita mistificação e muita deformação. Não há dúvida de que precisamos de incentivar e modernizar a agricultura. Não há somente duas formas de industrializar a agricultura: através da livre iniciativa ou através da socialização, isto é, da posse da terra pelo estado. Entre uma e outra solução há numerosas formas intermediárias a fomentar e a estimular. Nenhuma, porém, única, rígida, uniforme. O cooperativismo, por exemplo. Se fosse imposto a todo o país, para começo de conversa deixava de ser cooperativismo, porque as cooperativas exigem respeito a seu caráter livre.

 

Há necessidade de modificar a lei de cooperativas no Brasil, que é muito ruim. Mas pergunto: que é que, realmente, esse governo está sendo impedido de fazer por falta de lei?

 

Todos os dias digo que desejo promover a reforma democrática do Brasil. Mas todos os dias os meus adversários batem na tecla de que “o Lacerda é contra as reformas”. Não há uma palavra minha contra as reformas O que há, de fato, repito, é que a propaganda totalitária pretende apossar-se da palavra reforma. O governo federal sentou praça no setor das reformas, quer monopolizar o tema. Há tempos cheguei a formular uma solução concreta, que nenhuma lei proíbe, nem carece de reforma da Constituição. Depende exclusiva­mente de interpretação do texto constitucional. É o seguinte: pagar as terras desapropriadas mediante ações de empresas do estado, cotadas na Bolsa.

 

Ações da Petrobrás, por exemplo, o que seria feito dentro do estrito respeito da própria lei que criou a Petrobrás, brasileiros natos, etc. Ações da Siderúrgica Nacional, da Vale do Rio Doce, etc. Títulos conversíveis em dinheiro. O Estado, com isto, não estaria deixando de pagar previamente. Assim como a Constituição não proíbe a doação, se o proprietário entendesse de fazê-la, assim também não proíbe que o Estado pague em títulos, desde que o proprietário aceite. No Estado da Guanabara, estamos pagando frequentemente com títulos. Assim, associaríamos o particular ao desenvolvimento industrial do Brasil. Transformaríamos o latifundiário, ou o ex-latifundiário, uma vez procedida a desapropriação, em um homem interessado na expansão de Volta Redonda, no êxito da Vale do Rio Doce, etc.

 

O decreto da SUPRA, na realidade, não tem conse­quências práticas. Uma coisa é a terra de beira de estrada, outra é a terra em que se encrava um açude. O decreto da SUPRA é inócuo, não se destina a coisa nenhuma, a não ser a intranquilizar. Se ele desencadeasse no Brasil um delírio de cultivar a terra, para evitar de ser desapropriada, seria até muito bom. Teoricamente, chegaríamos à superprodução. Mas, então, para que o decreto? Só para assustar? Porque o estímulo da produção será alcançado mais facilmente se destinarmos o dinheiro das desapropriações ao fomento da agricultura.

 

Nós Ficamos com o Plano Trienal ou com a Supra?

 

Falta-nos, no Brasil, um estudo completo e minucioso da terra, a ponto de saber, com exatidão, o que é produtivo e o que não é produtivo.

 

Em princípio, porém, as áreas que interessam mais à produção agrícola são as áreas de escoamento mais ou menos garantido. Não se cogita da selva amazônica, por exemplo. A realidade, porém, é que, entre uma cidade e outra, nas zonas que têm mercado, acesso a mercado consumidor, as terras produtivas já contam com uma forma de exploração. Pode ser a mais precária, a mais primitiva, a mais especulativa, mas o fato é que a terra aí não está abandonada. Mesmo porque, se estivesse abandonada, não haveria o problema da Reforma Agrária quanto à propriedade. O meu raciocínio é baseado no Plano Trienal, que é do atual governo. Pergunto então: ficamos com o Plano Trienal ou com a SUPRA?

 

Parece claro que o que se quer fazer não é a difusão da propriedade agrícola, mas quem sabe o seu monopólio. Que planejamento tem o governo, com referência, por exemplo, ao que diz na sua mensagem ao Congresso sobre a obrigatoriedade de certas culturas? Que condições tem o governo para planejar? Com esse governo, deixamos de produzir trigo, quando poderí­amos produzi-lo. Não resolvemos o problema do café. Estamos perdendo a batalha do café no mundo inteiro, porque não fomos capazes de selecionar a produção cafeeira! Deixamos andar para trás a produção do algodão, depois do surto algodoeiro de São Paulo. Até hoje, não temos uma única estação experimental de cana-de-açúcar em Pernambuco! Não temos, senão para amostras, escolas de grau médio na agricultura. Não temos socorrido o trabalhador agrícola, ensinando-lhe o que ele precisa saber. O pouco que sabe só o sabe por assim dizer consuetudinariamente. Não lhe damos os instrumentos para trabalhar a terra, não lhe damos noções de rotatividade de cultura, etc.

 

Até hoje, não se chegou sequer a realizar o Projeto Artur Bernardes, para o estabelecimento de uma universidade rural em cada área geoeconômica do País. Você já viu as estatísticas de produção de tratores? A indústria nacional de tratores estaria em condições de dobrar a sua produção em três meses. Mas não lhe dão o necessário mecanismo de crédito. Sem falar na ausência de tudo o mais, dos obstáculos que seria preciso remover, da ausência de tratoristas, de toda uma infraestrutura que é indispensável à duplicação daquela produção. Ora, não é possível fabricar trator para deixá-lo no pátio da fábrica. Daí, estamos amarrados a uma produção irrisória. E qual é a frota de tratores que existe no Brasil, entre estrangeiros e nacionais, todos? É também irrisória! Sou a favor da Reforma Agrária, quero fazê-la pelos caminhos por que realmente se deve e se pode fazê-la. Com eficiência e sem demagogia. Que é que me adianta um plebiscito para fazer a Reforma Agrária? O próprio Congresso pode pouco, ou nada pode, se o Executivo não conduz o problema como é necessário. Quero deputados para a Reforma Agrária. Mas quero, também, e sobretudo, tratores, agrônomos, crédito, etc. Reforma Agrária não se faz no cartório, se faz no laboratório. Você já experimentou comprar salitre do chile? Eu compro, quando vou a São Paulo. Um saquinho de nada custa qualquer coisa como 600 cruzeiros. Fosfato da África é na mesma base. Vende-se fertilizantes no Brasil como se fosse joia. E o governo, através dos fretes marítimos, estrangula a produção pernambucana de fosforita. Como é que se pode falar em Reforma Agrária sem falar em fertilizantes? Ora, o governo parece que está desejando apenas aumentar a população rural, quando hoje é universalmente sabido que o problema é o oposto: trata-se de aumentar a produção e diminuir a população agrícola.

 

A Reforma Agrária deve ter como consequência natural diminuir a população agrícola. É a tendência incoercível no mundo inteiro, com o fenômeno da urbanização. Antigamente, eu também já incorri nessa asneira de falar em regime feudal da agricultura e ficar por aí, pelas generalizações que nada têm a ver com a realidade. Hoje, temos o processo da industrialização. A tendência, no mundo todo, é o trabalhador rural fixar-se na pequena cidade e trabalhar no campo.

 

No Brasil, já estamos aglutinando nos centros urbanos as atividades agrícola circundantes. A verdade é que trabalhar a terra é duro. O agricultor, desassistido, às vezes arrisca tudo numa geada, num granizo, numa seca. É um negócio precário. O Governo tem que assistir o agricultor e oferecer-lhe vantagens para que ele continue trabalhando a terra. Enquanto houver um exército de párias, não haverá no campo condições de trabalho compatíveis com a dignidade do homem. Para mudar essa situação, não creio que seja necessário alterar obrigatoriamente o regime de propriedade. Ou melhor: não é preciso começar por aí.

 

O regime de propriedade se altera forçosamente na medida que se alteram as condições gerais da produção. Tal objetivo se alcança por mil e uma formas, inclusive com a sindicalização rural, que é um caminho de luta e não um caminho de convergência de interesses. Nin­guém pode ser contra a sindicalização rural. Digo apenas que a sindicalização rural não é o melhor caminho para obter o aumento da rentabilidade da terra, que é, no fundo, o que interessa a todos, a patrões e a emprega­dos, ao estado, aos proprietários, aos consumidores, etc. O que sucede, portanto, atualmente, é uma deformação sistemática. (Continua...)


 

(*) Hiram Reis e Silva é Canoeiro, Coronel de Engenharia, Analista de Sistemas, Professor, Palestrante, Historiador, Escritor e Colunista;

 

Campeão do II Circuito de Canoagem do Mato Grosso do Sul (1989);

Ex-Vice-Presidente da Federação de Canoagem de Mato Grosso do Sul;

Ex-Professor do Colégio Militar de Porto Alegre (CMPA);

Ex-Pesquisador do Departamento de Educação e Cultura do Exército (DECEx);

Ex-Presidente do Instituto dos Docentes do Magistério Militar – RS (IDMM – RS);

Ex-Vice-Presidente da Federação de Canoagem de Mato Grosso do Sul;

Ex-Membro do 4° Grupamento de Engenharia do Comando Militar do Sul (CMS);

Ex-Presidente da Sociedade de Amigos da Amazônia Brasileira (SAMBRAS);

Membro da Academia de História Militar Terrestre do Brasil – RS (AHIMTB – RS);

Membro do Instituto de História e Tradições do Rio Grande do Sul (IHTRGS – RS);

Membro da Academia de Letras do Estado de Rondônia (ACLER – RO);

Membro da Academia Vilhenense de Letras (AVL – RO);

Comendador da Academia Maçônica de Letras do Rio Grande do Sul (AMLERS);

Colaborador Emérito da Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra (ADESG);

Colaborador Emérito da Liga de Defesa Nacional (LDN);

Membro do Instituto Histórico e Geográfico do Tapajós (IHGTAP)

E-mail: hiramrsilva@gmail.com.

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