Terça-feira, 19 de julho de 2022 - 10h18

Com o título deve-se subentender que podemos ter um golpe – ou “quebra
institucional” – sem o emprego tão ostensivo das forças armadas ou, ainda,
aquela série de banimentos e execuções como visto no pós-golpe de 1964,
bastante comum na América Latina. Pode-se ver um golpe paisano, ainda que isto
não elimine o contrário, uma vez que a apropriação ideológica das polícias
militares saliente o emprego de um efetivo de forças de exceção e de negação total
dos padrões civilizatórios. Desse cenário também podemos entender que as forças
milicianas do Fascismo Nacional estão à paisana ou fardadas, juntas em um
processo de degradação da democracia.
A questão da “continuidade do processo político-eleitoral” voltou à tona
com a convocação dos embaixadores pelo Palácio do Planalto (18.07), a fim de,
exatamente, esculhambar o sistema eleitoral brasileiro – especialmente as
pesquisas eleitorais que sinalizam de modo comprobatório a derrota do empossado
que seria sacramentada nas “urnas eletrônicas”. Então, ataca-se as urnas
eletrônicas.
Não falaremos sobre as urnas, hoje, especialmente porque foram essas
mesmas peças que elegeram o Fascismo Palaciano em 2018. Ou seja, se há tanta
convicção assim na fraude eletrônica do “voto livre” – um dos cânones do
liberalismo –, logo, deve-se concluir que o empossado é absolutamente ilegítimo
e que só ascendeu ao trono por meio da ilegitimidade. Enfim, tivemos golpe em
2018? Sem contar a tal facada que trouxe comoção exponencial e fixou o
marketing político fascista. Cabe ressaltar ainda que Bolsonaro, família e
demais aliados se elegem há tempos dentro do processo eleitoral vigente, com
urnas eletrônicas e tudo mais.
A questão que nos move é: haverá eleições em 2022 ou padeceremos de
outra quebra institucional? Alguns bradaram que, se houvesse Estado de Direito
o empossado seria defenestrado imediatamente. Certamente, nisso concordamos,
sobretudo porque o Império da Lei vem sendo ferido letalmente a cada violação
dos direitos fundamentais. Nunca se jogou dentro das quatro linhas da
Constituição Federal de 1988.
Por exemplo, a Constituição foi cabotinada com a PEC Kamicase – o que,
na prática, significa o “voto em bico de pena”, a compra de votos em troca do
auxílio emergencial. Em qualquer condição de Legitimidade Constitucional essa
inconstitucionalidade eleitoreira seria recusada, atacada, revogada. E, se não
foi, é porque a Constituição não vige; e, sem a Constituição, é óbvio, não há
como se falar em Estado de Direito. Pior, a aprovação da proposta contou com o
apoio da oposição.
Outra questão, ainda mais básica, nos remete ao passado próximo e à
frontal negação da Teleologia Constitucional: poderia haver Democracia
Constitucional – mesmo que apenas representativa – após um golpe ou quebra
institucional? A democracia teria sobrevivo após o Golpe de 2016? Como é que
pode haver democracia condicionada, comissionada, a um golpe constitucional
dessa magnitude?
Neste caso, juntando-se os dois fatores – ou séries golpistas – chegaremos
a outra conclusão parcial: vivemos de golpes em golpes, golpes dentro de
golpes, golpes que antecedem e preparam outros golpes. Temos uma rotina
golpista, um ciclo vicioso que desnutriu qualquer círculo virtuoso, e que se
retroalimenta com a negação da democracia, da Constituição, da República, do
Estado de Direito. Em outras palavras, recusar-se à soberania do resultado das
urnas eletrônicas é apenas um degrau na longa escala de quebras institucionais
e que, acintosamente, de escala em escala, vem a fortificar o poder fascista e
o projeto político da terra arrasada.
No entanto, a questão central permanece: teremos eleições em 2022? Essa
pergunta vale um milhão de dólares. É estrondosamente óbvio, claro e já
amplamente demonstrado pela realidade desde 2016, que, se não se opuser firme
resistência político-jurídica, social e institucional, dentro e fora do Estado,
mais um degrau do golpe será adicionado, levando-nos a mais uma torção no
garrote fascista.
A questão que não cabe aqui, notadamente por carecer de Lógica
Constitucional, refere-se a especular se a negação do processo
político-eleitoral não é equivalente da submissão e da cabotinagem do Estado de
Direito ao projeto político fascista. Ora, não há Estado de Direito há algum
tempo. O que, de fato, temos à frente é uma sucessiva eclosão dos ovos da
serpente. Portanto, outra conclusão, a essa altura bastante visível, ressalta
que os mesmos atores, os players do butim de 2016, não sabem o que fazer para
conter a serpente que não para de pulular com o Fascismo.
Então, nossa questão central seria ajuizada em outros detalhes dos
meandros do poder: as elites golpistas, do pré e do pós 2016, estão pactuadas
com o golpe do capitão em 2022? Todo mundo sabe que os militares – das forças
armadas ou das polícias – não agem sem que soe o apito definitivo da chamada
Paulista ou da Faria Lima. O medo das elites, caso não concordem com o golpe,
seria de que a serpente teria ganhado asas?
Esse é um receio que, enfim, todos devemos ter.
Concluindo: com ou sem processo eleitoral, estamos bem abastecidos na
série de golpes e de profundas quebras institucionais. Cada ruptura da
Constituição de 1988 é um golpe fidagal na democracia sempre muito doente. E
sempre será uma enorme covardia.
Segunda-feira, 10 de novembro de 2025 | Porto Velho (RO)
Necropolítica e luta de classes no Rio de Janeiro - O fim do Estado
A chacina ou o massacre – como se queira chamar – levados a cabo pelas forças policiais do Rio de Janeiro, a mando do Governador do Estado, no dia 28

Educação e Sociedade: Sociologia Política da Educação
O leitor terá a seguir apresentação do mais recente livro de Vinício Carrilho Martinez, professor titular da Universidade Federal de São Carlos. Ace

Ela pensa? - a inteligência desumana
Tanto fizemos e desfizemos que, afinal de contas, e ainda estamos no início do século XXI, conseguimos produzir uma inteligência desumana, absolutam

Pensamento Escravista no Brasil atual
Esse texto foi pensado como contribuição pessoal ao Fórum Rondoniense de Direitos Humanos – FORO DH, na fala dirigida por mim na mesa Enfr
Segunda-feira, 10 de novembro de 2025 | Porto Velho (RO)