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Vinício Carrilho

Educação e Sociedade: Sociologia Política da Educação


Tainá Reis - Gente de Opinião
Tainá Reis

O leitor terá a seguir apresentação do mais recente livro de Vinício Carrilho Martinez, professor titular da Universidade Federal de São Carlos. Acessível no link abaixo, na versão impressa e digital – ao preço de um dólar:

MARTINEZ, Vinício Carrilho. *Educação e Sociedade*: Sociologia Política da Educação. São Carlos: Amazon, 2025. Disponível em: https://www.amazon.com.br/dp/B0FXSXHN7R.

 

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APRESENTAÇÃO – Sociologia Política da Educação

Educação, política e emancipação social; a articulação entre esses três é o cerne deste livro. Trabalho intelectual de grande fôlego, esta obra constata que vivemos sob a constante ameaça de um Estado de Exceção normalizado, no qual a aparência de democracia oculta práticas excludentes e autoritárias. A despeito das potencialidades da Constituição Federal de 1988, o autor afirma que a democracia brasileira permanecerá incompleta e vulnerável enquanto não houver uma autoeducação das massas exploradas, que desdobre em uma revolução cultural.

Resultado de pesquisa de pós-doutorado do autor Vinício Carrilho Martinez, a reflexão apresentada nas páginas a seguir recupera a essencialidade da consciência crítica e coletiva prevista por Paulo Freire – uma autoeducação voltada à descompressão, concepção basilar desta obra. Como sinalizado no prólogo pelo supervisor da pesquisa, Prof. Marcos Del Roio (UNESP/Marília-SP), o livro transita entre a Filosofia da Educação e a Filosofia do Direito.

Martinez apresenta desde o início o problema que será o fio condutor do livro: a tensão entre autonomia e institucionalidade. Dentro de uma estrutura em que a institucionalidade é mantida pelo Estado com a limitação da liberdade, a autonomia é condição para a humanização. O que se propõe é um olhar dialético sobre esse paradoxo, argumento apresentado na Introdução da obra. É central, desde já, o papel da autoeducação política como instrumento de libertação: contra as estruturas externas e objetivas de opressão e contra o opressor interno que cada um carrega dentro de si. A descompressão é um movimento paralelamente social e subjetivo.

A Parte I – Da dinâmica e dos processos investigativos, traz o questionamento: “Se toda regra tem uma exceção, qual a regra da exceção?”. À luz dessa questão, Martinez afirma que no Brasil contemporâneo o Estado de Exceção tem se configurado como um modo recorrente de governar, a exemplo do golpe sofrido pela presidenta Dilma Roussef em 2016 e a tentativa de golpe de Estado de 08 de janeiro de 2023 – expressões da exceção mascarada, dissimulada de legalidade. O contraponto é uma educação para descompressão – antirracista, antifascista e constitucional. Inspirada na educação libertadora de Paulo Freire, uma educação orientada à justiça social, à igualdade e à equidade, um caminho para a negação da negação, que recuse a “normalização da exceção”.

Os capítulos seguintes da Parte I dialogam fortemente com Freire, tanto em Pedagogia do Oprimido quanto em Pedagogia da Autonomia. Assim, a educação como prática de liberdade, que promove a transição da ingenuidade à criticidade, se contrapõe à prática de dominação característica da educação bancária. A autoeducação política proposta por Martinez é um processo histórico e coletivo, asserção que se sustenta na máxima freireana de que “ninguém educa ninguém, ninguém se educa sozinho, os homens se educam entre si, mediatizados pelo mundo”. Na mesma via, retoma-se o “medo à liberdade” para aprofundar a ideia de uma educação para além da exceção.

Na seção Da Institucionalidade o autor discute a questão da legitimidade: institucionalidade e normalização são distintos, a primeira pode ser tanto instrumento de dominação quanto de justiça, dependendo de quem a exerce e em nome de quais juízos. Não são nas elites nem nas burocracias de Estado que se encontrará essa legitimidade, nem nas novas formas de dominação capitalista (uberização, precarização das relações sociais) que reproduzem o Estado de Exceção (sob aparência de normalidade democrática). Aqui a potência do livro de Vinício Carrilho Martinez: a reflexão teórica até então apresentada conduz à constatação de que é nas classes subalternas, nos sujeitos oprimidos que lutam pela própria descompressão, que se encontrará a legitimidade.

A Parte II – A insubmissão: o desejo incontrolável pela liberdade traz outro tronco de autores para debater as possibilidades de resistência e emancipação. Inspirado na hegemonia proposta por Gramsci, Martinez defende que a luta pela descompressão passa, acima de tudo, por uma organização política e revolução cultural que corporifique o povo – negro, pobre, oprimido – em torno de um projeto político. O eixo nesta parte do livro é a constituição de uma nova subjetividade política; é a síntese do sentido político da obra como um todo: só com auto-organização, consciência crítica e práxis que se alcançará a emancipação. Nesse processo, a educação é o próprio campo de batalha da transformação social (simbólico e material).

O que o leitor tem diante de si é uma escrita densa, as vezes ensaística, mas sempre firmemente compromissada ética e politicamente com os grupos subalternos. O conceito de autoeducação política para a descompressão proposto por Vinício Carrilho Martinez carrega sua originalidade na integração entre as dimensões estruturais, institucionais e subjetivas da opressão. Ainda, a crítica à “normalização da exceção” possibilita uma análise incisiva da democracia contemporânea.

Em Sociologia Política da Educação desvela-se a permanência do Estado de Exceção como regra. O diagnóstico central do autor ilumina, dentre tantos outros casos, a chacina no Complexo da Penha, no Rio de Janeiro, que ocorreu em outubro de 2025. O massacre foi justificado como “combate ao crime”, o extermínio entendido como rotina administrativa e a violência do Estado contra corpos negros e pobres naturalizada. É a legitimação da morte sob a forma da lei, a normalização da exceção, que Martinez denuncia e propõe enfrentar a partir da educação política e da consciência crítica. Portanto, esta obra não é apenas um tratado teórico, mas um apelo ético à resistência e à reconstrução da democracia a partir das margens.

Boa leitura.

Tainá Reis.

Doutora em Sociologia.

Docente da Universidade do Estado da Bahia

* O conteúdo opinativo acima é de inteira responsabilidade do colaborador e titular desta coluna. O Portal Gente de Opinião não tem responsabilidade legal pela "OPINIÃO", que é exclusiva do autor.

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