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Opinião: Grande demais para quebrar (?)


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Vera Saavedra Durão


A semana que começa pode ser particularmente perigosa para o mundo. Na hipótese de até sexta-feira não haver solução para a negociação entre Partido Republicano e governo Obama sobre cortes no Orçamento e elevação do teto da dívida, de US$ 14,3 trilhões, o ambiente global pode esquentar. Não dá para esperar até o dia 2 de agosto, prazo final para um acerto entre as partes.

A incerteza e o medo de um default podem precipitar atitudes. Basta um grande investidor em títulos do Tesouro dos Estados Unidos ver a probabilidade de default como possível para disparar esses papéis no mercado e se livrar deles para se sentir seguro, caso o pior aconteça. Quando um fizer isso, um segundo vai atrás. É o princípio da corrida bancária.

O alerta vermelho já foi dado pela China, a maior detentora desses papéis, e pelas agências de rating S&P e Moody's. As duas ameaçaram rebaixar a nota "triple A" dos títulos americanos, até agora o ativo líquido mais confiável do mercado financeiro.

No pior cenário, se houver queda no valor dos títulos o mercado imediatamente ajusta os juros para cima, o que aborta qualquer possibilidade de recuperação da economia americana. Famílias e investidores ficarão mais pobres. O mundo será levado à depressão, pois nenhum país vai escapar da catástrofe.
 

Alerta vermelho foi dado pela
                           China e agências de rating


Uma moratória leva o sistema financeiro global a entrar em colapso, pois os papéis desvalorizados habitam as carteiras de todos os países, a exceção talvez de Cuba e da Coreia do Norte. A perda será brutal para governos (como reservas), instituições financeiras e fundos soberanos. O FED (Federal Reserve, o Banco Central americano) não vai conseguir operar com todos os proprietários dos títulos do Tesouro. O que vai acontecer é imprevisível, pois nunca houve na história do capitalismo uma situação de insolvência em que não haja um ativo seguro para onde correr.

Cada nação vai tentar se salvar erguendo barreiras tarifárias para tentar proteger seu mercado doméstico. O fluxo internacional do comércio vai cair brutalmente. As instituições financeiras vão se fragilizar, particularmente nos EUA e na Europa. O teste de estresse conduzido pelo Banco Central Europeu na semana passada detectou que 30% das 90 maiores instituições europeias estão com problemas. Nesse caldo que precede a depressão muitas instituições devem quebrar. O quadro é apocalíptico. Por isso, é considerado por economistas como improvável, impossível.

"O que assusta mais é pensar que o mundo está dependendo do bom senso do Partido Republicano americano para não mergulhar no caos", ironiza o economista Fernando Cardim, para quem a probabilidade de um desastre é pequena, mas "deveria ser zero".

A torcida agora é para que, no Senado, onde os democratas ainda são maioria e os republicanos parecem mais sensatos que os da Câmara, se costure um Plano B para livrar o planeta do pesadelo. Um eventual calote criaria um cenário de terror nos mercados e é isso que o governo americano tenta evitar. "Não acredito que o Partido Republicano na hora H vá alimentar esse quadro ruim só para levar Obama às cordas do ringue. Se não fecharem um acordo, a depressão será pior que a da década de 30", pressagia Carlos Thadeu, economista e ex-presidente do Banco Central. Para Cláudio Fristach, da consultoria Inter.B, "a solução está em marcha". A dívida americana é grande demais para quebrar.

O Brasil, quarto maior detentor de títulos americanos, pode tirar uma lição positiva do imenso imbróglio que envolve Estados Unidos e já está formado na Europa. O risco de um colapso mostra que com dívida não se brinca. Qualquer endividamento pode crescer muito rapidamente. Mesmo casos aparentemente saudáveis do ponto de vista fiscal podem sofrer uma deterioração muito rápida, avisa o consultor.

O problema americano está levando os presidentes de Bancos Centrais a darem tratos à bola sobre como compor suas reservas. Com reservas no patamar de US$ 300 bilhões o BC brasileiro deveria pensar também em diversificar a composição delas. A crise no hemisfério norte tem revelado a fragilidade das duas principais moeda.

Qual será a melhor alternativa ao dólar que deixe os governos emergentes mais a salvo de riscos de default dos países ricos? Para Fristach um bom investimento é o ouro. "Quem investiu em ouro está se dando bem." Moedas mais fortes, como o yuan, da China, não têm conversibilidade e nem mercado. A melhor alternativa, talvez, fosse uma cesta de moedas.

A questão mais grave nesse contexto trágico é que o mundo capitalista está totalmente atrelado à economia americana, que vai continuar em recessão, podendo até mesmo mergulhar numa depressão caso faça um corte muito severo nos gastos e tenha que lidar com alta dos juros. Todos os analistas estão de olhos postos no desfecho no curto prazo dessa crise política nos EUA, que evidencia a vulnerabilidade da economia mundial. Poucos, no entanto, enfatizam o fato de que a "retomada da normalidade" nada mais significa do que a volta à esdrúxula situação vigente desde os anos 80, na qual a economia dominante e locomotiva da economia mundial é ao mesmo tempo a maior devedora do mundo, embora paradoxalmente seus credores contem com o crescimento indefinido de sua gigantesca dívida.

Vera Saavedra Durão é repórter especial no Rio. Sergio Leo, o titular da coluna, está em férias.  E-mail [email protected]

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