Segunda-feira, 14 de julho de 2025 - 16h18
Vivemos em uma era em que “ser
produtivo” virou quase uma identidade. A cultura do desempenho invadiu nossas
rotinas e, muitas vezes, nossa autoestima. Trabalhar até tarde, estar sempre
disponível e entregar cada vez mais virou sinônimo de comprometimento. Mas a
que custo?
Essa busca constante por
performance tem gerado um fenômeno silencioso e cada vez mais presente: a
produtividade tóxica — um estado em que a necessidade de produzir deixa de
estar a serviço da realização e passa a alimentar o medo, a comparação e a
desconexão de si. A produtividade tóxica nos prende a um estado de reatividade
constante. Isso impede que a gente pare para refletir, escolher com intenção e
agir a partir dos nossos valores. Vivemos no piloto automático.
Direto do SXSW: um alerta necessário
Recentemente, estive no SXSW 2025,
em Austin (Texas), e assisti à palestra “Breaking the Cycle of Toxic
Productivity”, ministrada por Israa Nasir, psicoterapeuta e autora
especializada em saúde mental moderna. Sua abordagem foi poderosa, tanto pela
linguagem acessível quanto pela profundidade.
Israa explicou que muitas pessoas
não sofrem por falta de produtividade, e sim por sentirem que nunca são
suficientes, mesmo produzindo demais. Esse sentimento crônico de inadequação
tem raízes em pressões sociais, narrativas de sucesso importadas (e
idealizadas), emoções não resolvidas como culpa e vergonha — e, principalmente,
na desconexão com nossos próprios valores.
O retrato do esgotamento
Os dados confirmam o que muitos já
sentem no corpo e na mente:
● Segundo o Work Trend Index da
Microsoft (2023), 44% dos trabalhadores brasileiros relataram sentir exaustão
decorrente do excesso de reuniões, notificações constantes e sobrecarga mental
— um número acima da média global.
● A OMS e a OIT alertaram, em
relatório de 2021, que longas jornadas de trabalho causam 745 mil mortes anuais
por AVC ou doenças cardíacas.
●A plataforma Pulses apontou que
apenas 3,6% dos profissionais nunca vivenciaram comportamentos tóxicos vindos
de lideranças. Ou seja, a maioria já foi exposta a pressões que afetam
diretamente a saúde emocional e a produtividade real.
Esses números mostram que estamos
fazendo mais, mas vivendo menos — uma conta que não fecha no longo prazo.
Maya: o exemplo que espelha
milhões
Durante a palestra, Israa citou a
história de Maya — uma personagem fictícia baseada em relatos reais. Com 34
anos, bem-sucedida e produtiva, Maya sentia-se constantemente frustrada por não
ter atingido certos marcos sociais: casamento, filhos e uma grande promoção.
Apesar das conquistas, sua sensação era de fracasso.
Foi só ao revisitar seus valores
autênticos — liberdade, criatividade, conexão — que ela percebeu que estava
vivendo sob expectativas externas. Sua rotina era produtiva, mas desalinhada
com quem ela realmente era.
Da produtividade à intenção: o Método Aliança
● Israa propõe, em seu livro, o
Método Aliança, uma estratégia prática e profunda para reconectar produtividade
e propósito de vida. O método é formado por quatro pilares fundamentais:
● Avaliar compromissos: O que
realmente merece meu tempo e energia?
● Estabelecer limites: Até onde
estou agindo por mim — ou para atender expectativas alheias? Parte da
produtividade tóxica vem da urgência alheia, que absorvemos sem filtrar. Isso
acontece muito no ambiente corporativo, onde confundimos agilidade com
disponibilidade total. Isso corrói limites pessoais. Muitas vezes os limites
são atravessados não por maldade, mas por padrões culturais de
hiperdisponibilidade.
● Atuar com intenção: Esta tarefa
está conectada com meus valores ou é apenas uma resposta automática?
● Criar espaço livre: Momentos sem
estímulos são essenciais para o cérebro descansar, integrar e criar. O ócio não
é só descanso, mas uma chance de interromper a reatividade.
Faço aqui uma reflexão extra: o impacto silencioso
das relações desalinhadas
Ainda que não faça parte dos
pilares descritos no livro, acredito que vale ampliar a reflexão. A
produtividade tóxica nem sempre vem só da carga de trabalho ou da pressão
externa — muitas vezes, ela nasce das relações que mantemos. O cansaço também
vem das interações que nos afastam dos nossos valores. Conviver com ambientes
ou pessoas que reforçam checklists externos, que alimentam padrões de
comparação ou invalidam nossas escolhas, desgasta. É um sintoma invisível, mas
real.
Revisar com quem dividimos nosso
tempo e onde investimos nossa energia emocional é parte fundamental do processo
de desacelerar com consciência. Relações desalinhadas também nos colocam no
piloto automático — às vezes, até mais do que a agenda cheia.
Comece pequeno — mas comece
Romper com a produtividade tóxica
não exige uma revolução. Muitas vezes, basta um pequeno gesto para iniciar o
realinhamento:
● Fazer uma caminhada sem o celular;
● Recusar um convite sem culpa;
● Perguntar a si mesmo: “O que eu
preciso agora?” — e, mais importante, honrar essa resposta.
Use seus valores como bússola.
Eles não são apenas palavras bonitas como “família”, “sucesso” ou “carreira”,
mas formas concretas de viver. Um valor como cuidado, por exemplo, se manifesta
em como você trata sua família, amigos, colegas — e até desconhecidos.
Evite cair na armadilha de
acreditar que precisa mudar tudo de uma vez. A transformação verdadeira costuma
vir dos pequenos ajustes diários. É nesses realinhamentos discretos que mora o
poder de retomar o controle e viver com mais intenção.
Trocar a pressão pelo propósito é
um caminho possível. Em um mundo que valoriza tanto o fazer, lembrar-se de
simplesmente ser pode ser o ato mais radical de produtividade genuína.
Romper com a produtividade tóxica
é mais do que desacelerar — é sair do modo reativo, onde tudo parece urgente, e
escolher viver com intenção. Isso exige coragem para revisar nossos
compromissos, repensar com quem dividimos nosso tempo e reconhecer que não
precisamos romper com tudo para fazer diferente. Às vezes, dizer “não” a uma
urgência que nem é nossa já é um grande começo. Em um mundo que nos empurra
para o próximo passo, parar para se perguntar “isso tem a ver comigo?” pode ser
o ato mais profundo de autocuidado.
*Lisia Prado é sócia da House of
Feelings, primeira escola de sentimentos do mundo. Mais
informações no site.
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