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Francisco Matias

A MADEIRA-MAMORÉ, TESTEMUNHOS – PARTE 1


Por Francisco Matias(*)

1.A estrada de ferro Madeira-Mamoré, devido aos inúmeros percalços em sua construção virou uma ferrovia lendária, cheia de mistérios, quase perdida no meio de sua própria história. A grande imprensa colabora para que os exageros que a envolvem e os epítetos que recebeu sejam mais importantes e a tornem mais conhecida do que todo o componente histórico que está contido em sua trajetória. A rede Globo exibiu, semanas atrás, uma edição do programa Globo Repórter tratando sobre algumas ferrovias. Pois bem. Quando foi a vez da Madeira-Mamoré, o programa enveredou pela lenda, pelos exageros e o mito falou mais alto. A História. Ora, ora. Nada obsta quanto ao fato de ser lendária ou as crendices recobrem a construção desta que foi a maior obra ferroviária do mundo, em tempos de paz. Uma Odisseia. Uma epopeia. Mas, a Madeira-Mamoré tem uma história que não pode se perder no imaginário popular. No vulgar.

2.Milhares de vidas se perderam em sua construção e ocorreram inúmeros acidentes de trabalho, e de percurso. Teve a questão indígena e o desmatamento da floresta amazônica, do qual é melhor nem tocar no assunto. Observe-se o que escreveu o jornalista Manoel Rodrigues Ferreira: “Em maio de 1907 a companhia construtora chegou a Santo Antonio. Enquanto ali organizava sua base, sete km abaixo, também na margem direita do rio Madeira, derrubava diversos hectares de mata e dava início à construção da atual cidade de Porto Velho, que seria o ponto inicial da estrada de ferro.” Escritor e jornalista, autor de várias obras sobre a Madeira-Mamoré, talvez o mais importante e detalhista historiador da Madeira-Mamoré, mata duas pacas de uma canetada só. Revela que a ferrovia agrediu o ambiente amazônico e desmatou, e reafirma o ano do surgimento da povoação de Porto Velho: 1907. Alguém ainda duvida?

3. Esta coluna aproveita alguns testemunhos de pessoas que trabalharam na construção da ferrovia e se tornaram seus funcionários para trazer à luz da história a importância do ano de 1907 como marco da atual cidade de Porto Velho. Todos os testemunhos foram dados ao escritor Manoel Rodrigues Ferreira no ano de 1959, cinquenta e dois anos depois do início das obras da ferrovia e cinquenta e três anos antes do seu primeiro centenário. O primeiro é o maranhense Francisco Ferreira Brandão. Ele declara que “chegou a Santo Antonio no início de 1907, com 20 anos de idade. Disse que estava em Manaus quando foi recrutado por um homem, chamado Sr. Leão, para vir à região, pois era dado início à construção da ferrovia” Francisco Ferreira Brandão, conhecido como “Condutor Maranhão”, foi o primeiro brasileiro a chegar ao local das obras, integrando a primeira leva de trabalhadores nacionais da Madeira-Mamoré.

4.Outro pioneiro, o pernambucano Manoel Laurentino de Souza, declarou que tinha 17 anos quando chegou a Santo Antonio. Ele não veio para trabalhar na ferrovia. Era janeiro de 1907 quando desembarcou no local, contratado para trabalhar na Casa Aviadora dos bolivianos Suarez & Hermanos. Disse que, no dia 31 de maio de 1907 viu chegar os primeiros engenheiros norte-americanos e a primeira leva de 60 brasileiros, da qual fazia parte Francisco Ferreira Brandão. O mesmo conta o cearense Antonio Silva, que tinha 25 anos quando aportou em Santo Antonio, em abril de 1907. Um mês depois, ele assistiu à chegada dos norte-americanos e acompanhou a transferência da estação inicial, do povoado mato-grossense de Santo Antonio, para o local chamado porto velho, no Amazonas. Quis o destino que Antonio Silva estivesse vivo e saudável naquele 1º de agosto de 1912, para ser o escolhido para pregar o cravo de ouro no último dormente da ferrovia. Esses depoimentos, e outros que ainda serão publicados, reafirmam o ano de fundação da povoação de Porto Velho: 1907. Para dar mais ênfase, o historiador Manoel Rodrigues Ferreira, autor dos livros Ferrovia do Diabo e Nas Selvas Amazônicas, faz a seguinte observação, no ano de 1959: “Esta cidade (Porto Velho) nasceu há meio século, com o assentamento dos primeiros trilhos da estrada de ferro Madeira-Mamoré, em 1907”. Portanto, aqueles que defendem o surgimento de Porto Velho em 1908, deveriam dar uma olhadela, ainda que desinteressadamente, na obra de Manoel Rodrigues Ferreira.

Esta coluna defende que a povoação de Porto Velho tenha uma data de fundação. E ela está na História da Madeira-Mamoré, quando engenheiros norte-americanos, dos consórcios May e Jekyll (ainda não havia a empresa de John Randolph no grupo) pregaram, simbolicamente, o cravo de prata no primeiro dormente, no dia 04 de julho de 1907.

Historiador e analista político*

* O conteúdo opinativo acima é de inteira responsabilidade do colaborador e titular desta coluna. O Portal Gente de Opinião não tem responsabilidade legal pela "OPINIÃO", que é exclusiva do autor.

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