Quarta-feira, 17 de dezembro de 2014 - 05h10

Ganhei hoje o Vô do Pezão, como é conhecido por outros sertanejos, caboclos, roceiros e viventes do sertão de Graciliano Ramos. Está no meu recanto nordestino. Um dia mostro o restante. O tamanho do pé, desproporcional, é parte do imaginário popular. Ou será mudança anatômica, forçada pelo andar sem sapatos? Anda-se sem calçado - sem eira, nem beira - porque não se tem como comprar. Pois é, isso ocorre ainda hoje.
Esta cerâmica chegou hoje, do Ceará. É um imaginário, desde o Abaporu, que se faz e refaz pela realidade. Anda decalço porque é descamisado, despossuído, um sans cullotes das caatingas. Vagueia por aí, sem se guardar do tempo ruim. Sem eira, nem beira, não tem casa. Vive em mocambos; a herança das senzalas. É o vô do Aracati. Onde o vento brota feito briza. É o vô do homem e da mulher que querem para os filhos o que não lhes foi dado – ou porque foram impedidos de conseguir.
O Vô do Pezão é o símbolo de quem anda pela esperança, pela fé no amanhã. Este vô tem os pés grandes para alcançar a todos. Não quer perder ninguém. É um vô com jeito de vó. Como galinha que tem os pintos sob as azas. É um vô que vai longe pra te ver. E veio mesmo, chegou em Marília – SP. Ia tirar os sapatos para escrever, sentindo o frio do piso. Mas, no fim, escrevi com o tênis que já estava. Senti-me mais abrigado. Exatamente como gostaria que estivessem todos os avós no Brasil. O vô é a vida comum que foi parar na literatura. No entanto, se preferirmos apenas a literatura, um clássico é este guia:
· SCHWARTZ, Roberto (org.). Os pobres na literaturabrasileira. São Paulo : Brasiliense, 1983.
Na linha direta com o Vô do Pezão, são muitas as imagens que chegam do romance Vidas Secas, e uma delas é esta capa:
1. 
Não há semelhança. É uma coincidência real entre a literatura e a vida comum do homem, mulher e cachorro (Baleia) que ainda morrem de sede. É! A indústria da sede continua de pé. Aliás, tem pés e tentáculos maiores do que os passos curtos e cansados do Vô do Pezão.
A maioria de nós nunca viu “gente cansada da lida”, só ouviu falar ou porque leu Vidas Secas. Por isso, sempre defendi que todos deveriam conhecer a praia e a caatinga. Se passar por Minas, veja as montanhas.
Também pode-se/deve-se dar uma esticada, daí de RO, para dentro da floresta amazônica. Quem já viu, ao alcance dos olhos e das mãos, uma vitória régia? Tive o privilégio de ver, tocar e de ficar embasbacado com sua grandeza e força, aos 10 anos de idade. Em Manaus, pelo Rio Negro.
O importante é conhecer os nossos povos. Sem essa caminhada, não há Brasil. Agradeço todo dia pelas oportunidades que tive de conhecer (um pouquinho) essa gente. Falo da gente que divide o café com você, na canequinha. Acho que vai um pouco por aí o filósofo, quando defende o “saber com sabor”.
Vinício Carrilho Martinez
Professor da Universidade Federal de São Carlos
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