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Vinício Carrilho

REVOLUÇÃO SILENCIOSA NA EDUCAÇÃO


Para crescer em todos os sentidos, o Brasil precisa dos esforços de projetistas, economistas, advogados, pensadores, cientistas de todas as áreas e, acima de tudo, de educadores. Esses profissionais são formados no ensino superior e todos sabem que a educação superior particular é frágil, ainda mais explorada. Então, resta-nos pensar que as instituições públicas de ensino formarão os profissionais mais qualificados de que o Brasil necessita. Todos nós pensamos com esta lógica, menos o governo federal – e este é o objetivo principal desse texto: explicREVOLUÇÃO SILENCIOSA NA EDUCAÇÃO - Gente de Opiniãoar o papel do ensino público superior no Brasil, em 2012 e nas próximas décadas.

O leitor sabe que não há vida inteligente sem educação.

O povo sabe que podemos superar metas econômicas e alcançar índices de marketing, fantasiando nosso crescimento. Contudo, é preciso ter clareza total de que nada disso será efetivo sem um forte investimento em educação.

Como explicar que em 2012 um milhão de crianças esteja fora da escola, no Brasil?

Como entender que se sucateie a educação superior para depois transferir recursos públicos às faculdades particulares?

Como justificar que não se invista na educação pública e depois se contrate profissionais fora do país, para suprir a própria incompetência governamental?

Este país é serio, seu povo é trabalhador, mas seus governantes preferem manter-se fora, longe da escola. Na verdade, nesta lógica do velho coronelismo, o conhecimento é revolucionário. É muito mais fácil manter-se a dominação baseada na ignorância. O que alguns esquecem é que o também envelhecido analfabetismo político não se ajusta mais à maioria dos(as) brasileiros(as).

 Neste contexto, poderíamos escrever por dias, recitando tabelas econômicas para explicar o porquê das mentiras contadas sobre a greve nas universidades e institutos de ensino superior. Todavia, melhor do que os números frios é o raciocínio que a educação nos ajudou a construir como professores. Então, façamos esta viagem para ver porque devemos nos manter em greve nacional, como uma posição profissional que pensa a educação como um direito humanitário. O direito humanitário ao desenvolvimento social e de que se socorre (ou deveria) toda a sociedade brasileira, e não somente os filhos das velhas elites.

O Brasil do passado enviava seus filhos para estudar na Europa. Esta fase conhecida como bacharelismo formou o pensamento ainda dominante em parte das elites governantes. Formou-se uma visão duplamente distorcida da realidade nacional: de um lado, pensa-se que as coisas boas são importadas; de outro, como consequência lógica, pensa-se que os brasileiros são incapazes de fazer algo que preste.

Mas, por que dizer que esta visão deformada ainda vigora nas elites governantes do país? Porque o governo simplesmente se nega a investir no ensino público e gratuito de qualidade. O que vimos nos últimos anos também foi um duplo movimento de farsa: a privatização do ensino superior, com repasse de milhões/bilhões de reais na forma de bolsas de estudos às empresas do conhecimento; o sucateamento do ensino público, duplicando vagas e inchando as estruturas sem uma política consciente, adequada e que contratasse docentes e servidores.

As universidades federais estão inchadas, recebem o dobro de alunos e, com poucas exceções, não têm salas, laboratórios, bibliotecas, equipamentos, limpeza, comodidade. Sem contar que seus docentes estão há anos sem receber um reajuste que, sequer, suprisse a inflação do período. Lembre-se, ainda, que noventa por cento das pesquisas, do conhecimento, da massa crítica são produzidos no setor público.

Mesmo remando contra a maré, as universidades e institutos públicos federais e estaduais produzem quase toda a ciência e tecnologia empregadas no Brasil. Porém, por que o dinheiro público tem de ir para a iniciativa privada? A resposta a esta questão está no modelo econômico adotado pelo governo federal. Temos um crescimento baseado em bolhas econômicas (no consumo) e não nos investimentos de base, estruturais. Aliás, para tanto seria necessário ter profissionais capacitados e, para capacitá-los, investimento de pelo menos dez por cento do PIB (Produto Interno Bruto) na educação.

O mundo desenvolvido ou que acordou de sua ignorância sabe que não se tem crescimento econômico e desenvolvimento social sem educação de qualidade. Nos anos 50, por exemplo, a Coréia do Sul estava destruída por uma guerra civil, contava um milhão de mortos e uma miséria galopante: um em cada três coreanos era analfabeto e a esperança era palavra proibida. Hoje, oito em cada dez coreanos têm curso superior. Por lá, chegaram à conclusão de que sem educação não há desenvolvimento! E, mais do que isso, aplicando-se à lógica, compreenderam que todos os profissionais qualificados são formados pela universidade pública de qualidade. Logo, não haveria crescimento econômico e desenvolvimento social sem investimento maciço no ensino superior.

Em muitos países se fez uma revolução silenciosa, iniciando-se na educação e se irradiando para todos os seguimentos da vida social. No Brasil, vivemos aos berros repetindo a mesma lição e não saímos do lugar. Nesses países, imaginar uma greve na educação é pior do que blasfemar, é atentar contra a sociedade, o bom senso, contra o raciocínio lógico. No Brasil, a greve na educação pública superior federal avança pelo terceiro mês. Quase noventa dias em greve e o governo federal insiste em dizer que fechou as negociações.

O governo federal alega que não pode elevar mais os gastos(sic). E este é o primeiro ponto de uma imensa ignorância política que nos domina há séculos. Educação não é custo, é investimento!

Tudo o que se aplicasse na educação pública superior federal, além de formar os profissionais que o país tanto precisa para continuar crescendo, é óbvio, geraria mais emprego, melhoraria a qualidade do trabalhador na produção, teríamos mais cidadania, mais equilíbrio social. Portanto, investir em educação significa mais contribuição e arrecadação. Em todo caso, são quase três mandatos e não vemos a luz chegar à escola. A diferença é que, ao contrário do passado, em que formávamos os médicos em Lisboa e Coimbra, hoje, o país importa seus engenheiros e muitos aqui na própria América Latina.

É esta uma parte da miopia política nacional que não nos deixa romper a barreira da ignorância e que tanto nos prende ao passado improdutivo, aos valores arcaicos em que a educação é de uma minoria, da elite que reina no governo. O povo, aliás, explicará a diferença entre reino e governo – este será o aprendizado das próximas eleições.

Hoje, infelizmente, as universidades federais estão falidas e só há um modo para que esta sombra não alcance ao país e a toda a sociedade: não há mistério, sem investimento no ensino público e gratuito não teremos os profissionais de hoje e de amanhã. O país já sofre, mas amanhã terá um apagão intelectual, pois a negligência de hoje impedirá a inteligência de amanhã.

É por esta razão humanitária que os docentes da UNIR estão em greve. Sem investimento em educação, quem padece é o país.

Sem que os professores sejam pagos com dignidade, não há respeito social!

* O conteúdo opinativo acima é de inteira responsabilidade do colaborador e titular desta coluna. O Portal Gente de Opinião não tem responsabilidade legal pela "OPINIÃO", que é exclusiva do autor.

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