Sábado, 25 de maio de 2013 - 06h30
Há alguns meses, recebi e-mails de uma moça de Minas Gerais, estudante de direito. Não foi o primeiro, certamente, mas sempre respondo como se fosse uma novidade, enviando comentários, textos ou tirando dúvidas simples. Nunca conheci pessoalmente nenhum dos meus interlocutores virtuais. Dessa vez, chama-se Raiane. Tirei as dúvidas daquela ocasião (nem me lembro bem do que se tratava) e hoje respondi algumas novas perguntas. Provavelmente, no caso de hoje, trata-se de sociologia ou filosofia do direito e o(a) professor(a) orientou-a a entrevistar um advogado. Como ela não conhecia ninguém melhor, me acionou e lhe enviei o texto/resposta que segue abaixo. Espero que possa servir a outros, ao menos como curiosidade em saber o que quer conhecer uma jovem de uns 20 e poucos anos sobre o direito e suas difíceis relações sociais. A grafia, numeração, pontuação e justificação segue como recebi.
5) Principais problemas da prestação jurisdicional, e qual o papel dos advogados, magistrados, promotores e serventuários nesse contexto. Procurar respostas para estas questões:
Penso que em sua maioria os advogados veem os promotores, juízes e serventuários como servidores da justiça – porque a maioria procura a justiça – e não apenas como forma de locupletamento do poder. É claro que há um status funcional e o chamado “pequeno poder”, mas o objetivo de ter o dever cumprido ainda motiva a maioria. Há muitos advogados que só procuram poder, dinheiro e acesso a privilégios. Contudo, em sua totalidade, a Ordem procura a liberdade – não há advocacia sem o contraditório e, por isso, não há advogado pronto a sacrificar a liberdade. Esta noção os advogados também levam de encontro aos servidores da justiça.
6) Principais virtudes e deficiências da Organização Judiciária para uma eficaz prestação jurisdicional (estrutura, plano de carreira).
Toda justiça lenta é injustiça, mas a morosidade obtida com a interposição de recursos é uma garantia contra a exceção. Por outro lado, sem agilidade mínima, a tutela do direito fica a mercê do poder econômico, pois os mais fracos são levados a acordos estapafúrdios (com a clara cessão de direitos), por temerem a extrema demora na prestação jurisdicional. Demora, sem acordo prévio, que arruinaria ainda mais sua já precária situação existencial.
7) Razões da morosidade processual.
Uma das razões é a falta de pessoal qualificado – especialmente com o inchaço de estagiários, ainda mais se semialfabetizados, e que subvertem a necessidade de contratação de servidores de carreira, titulados, muito bem formados e avaliados em concursos públicos que sejam decentes, honestos e mais rigorosos.
8) Acesso à justiça.
Questões de direito nem sempre são questões de justiça. Uma questão de direito pode se limitar a debater se o Judiciário brasileiro sofre mais ou menos influência do pragmatismo estadunidense ou do servilismo elitista de nossa origem cultural. Contudo, a maioria nem sabe se expressar a esse respeito e a justiça fica devedora da capacidade operacional de profissionais competentes, mas em desconexão com a própria realidade de sua instituição, ou seja, o trabalho dos servidores da justiça é precarizado e obstruído pelo Poder Judiciário – sobretudo em suas cortes.
9) Imagine a percepção dos jurisdicionados sobre a prestação jurisdicional:
a) Como percebe a postura dos advogados, magistrados, serventuários, em relação a ele, jurisdicionado.
Não se trata de uma percepção comum: ao advogado, o jurisdicionado tem um misto de sentimentos: sente-se mais protegido se acompanhado do advogado, mas o imaginário popular sobre a “classe” pode não lhe acomodar a tranquilidade e se sentir ameaçado de alguma forma. Ao juiz, o povo ainda vê como autoridade e alguns juízes se veem como semi-deuses, ainda que alguns sejam apenas anti-heróis e ainda que muitos nem consigam uma distinção conceitual sobre os termos. Para o primeiro, pensemos em ler Prometeu ou A Odisseia e A Ilíada de Homero - com Aquiles; para o segundo, vejamos um bom filme de Batman. Os serventuários estão na linha de frente e muitos se alimentam do pior lado do poder no Brasil. Leia-se O Capote, para relacionar o fetiche da função pública com o falso poder. No meio desses, no fogo-cruzado das pressões e vaidades enfadonhas, há a uma maioria não-silente e honesta.
b) Se sente a presença do Poder Judiciário na vida social, na discussão de temas de relevância nacional – política, religião, ciência (ex.: corrupção, políticas públicas, aborto, pesquisas com células-tronco, etc.)
É claro que sim, vide os debates no Supremo, primeiro sobre o aborto e, depois, acerca do Mensalão.
c) Se sente a presença do Poder Judiciário nos problemas cotidianos da população, nos problemas pessoais, na efetividade das decisões para o indivíduo.
Especialmente a Justiça do Trabalho – que ainda é a justiça dos pobres e não contra os pobres. Pois, o imaginário popular também acusa o Judiciário – não exatamente os juízes – de só punir e prender os pobres.
Vinício Carrilho Martinez
Professor Adjunto III da Universidade Federal de Rondônia
Departamento de Ciências Jurídicas
Doutor pela Universidade de São Paulo
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