Sábado, 8 de julho de 2017 - 16h33
Saci Pererê é uma lenda ou conto popular imortalizado pela obra de Monteiro Lobato, especialmente nas crônicas do Sítio do Pica-Pau Amarelo. Toda criança que se tornou adulta pode ler ou ver na TV suas peripécias, seus pulos e idas e vindas. Hoje o Saci anda bem esquecido, assim como todos os clássicos desse passado.
O Saci hoje irá simbolizar algo capenga. Como se diz no ditado popular: “quem muito pula...”. Na realidade, ficamos como sacis: de galho em galho, até quebrar no lado mais fraco. De todo modo, no contexto deste artigo, será o reverso do proposto na música de Geraldo Vandré: “caminhando e cantando...”.
Para melhor entendermos a metáfora do direito capenga, do passado clássico do conto do Saci, pularemos até o mito. Por exemplo, o Mito do Estado: este que fora contado por Ernest Cassirer. E que, de algum modo, revela um mito já contado no Renascimento, no tempo da filosofia de Francis Bacon e em Giambattista Vico.
Hoje, porém, o direito de Saci nos leva a pensar em um direito manco. Mas, ao contrário de apenas dizer que o Estado é protetor e protegido por interesses de classe alta, dominante, avançaremos no sentido da apropriação que o povo faz do direito.
Os séculos de regateio por migalhas republicanas geraram no povo apatia, indiferença e antipatia pelo direito. A situação se agravou a tal modo que, no século XXI, ainda prevalece a sintonia reducionista de que o direito é sinônimo de coerção. Ou seja, quando se fala em direito logo vem à mente a ocasião da condenação e da prisão: o imaginário popular está adstrito ao campo do direito penal.
Daí a metáfora do direito de Saci, feito para ser manco, capenga e quase sempre mancomunado com a perna direita de quem salta os obstáculos legais e éticos. Se, no Saci, a perna boa que restou é a direita; e, se o Saci representa o direito que o povo enxerga apenas no Giroflex do carro da polícia, logo, a perna esquerda deve representar os direitos amputados do povo.
Mais exatamente, o direito de Saci secciona os direitos fundamentais sociais e com vistas à socialização republicana no quadro do Poder Público democrático. Então, há motivos de sobra para a antipatia popular ao direito.
Pois, se o povo é amputado de ações plenas, restando-lhe só as ações penais, é de se concluir que o direito do Saci não trata Chico e Francisco do mesmo modo. Ao assim perfilar o Estado de Direito, como algo distante da realidade popular, o direito de Saci só pode emborcar para o lado direito.
As canetadas e as caneladas da perna direita, por óbvio, só atingem o povo em golpe baixo, e, assim sendo, não é um direito republicano – e jamais será socialista: o direito de Saci dá bicudas na ideia de não se socializar a miséria, mas sim a riqueza.
Na conclusão plausível, portanto, entende-se que o direito de Saci (entortado a estibordo) é seletivo, classista, racista, elitista, isto é, na prática, há um direito para o Chico (giroflex) e outro para o Francisco: todos que, em outro país, o Saci trataria por Sir. São os senhores de engenho de ontem, os capitalistas abancados (no dito popular) de hoje e todos os que ficam no muro. Só esquecem que, perneta, um dia o direito cai.
Por fim, não é de estranhar que o povo (o Chico) entenda que o direito se limita à força, à porrada subsequente ao giroflex. E assim o Mito do Direito se desfaz, a cada pulo que o Saci promove na realidade nacional.
Vinício Carrilho Martinez (Dr.)
Professor Associado da Universidade Federal de São Carlos – UFSCar/CECH.
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