Segunda-feira, 24 de agosto de 2015 - 05h01
Na expressão de Marcuse: “O a priori técnico é um a priori político”. Proposição instigadora e que sempre motivou outras percepções ainda mais inusitadas. Porém, já no final do século passado Pierre Lévy discordava: “As técnicas não determinam, elas condicionam [...] poder-se-ia dizer que a técnica propõe e que os homens dispõem (O que é o virtual?).
Na mesma linha de raciocínio se dizia que o virtual não é bom, nem mau, nem neutro, ou simplesmente que é político — porque a política não é nem boa, nem má, nem neutra e possui implicações, interferências e alterações que se desdobram em novas resultantes. Com as particularidades do seu realismo político, Einstein dizia que a modernidade científica deixou o legado do Poder Nu.
Pois bem, passadas duas décadas, pode-se dizer que ciência e tecnologia (bem como o virtual) são boas e más, simultaneamente, que servem à vida e à morte (como phármakon), que toda criação/fabricação humana serve ao Homem na mesma proporção em que desgasta o ambiente natural – e agora na linha do já-quase-irreversível, diante do temido “ponto sem volta”.
Quantas espécies são extintas por dia? Realmente, se há ecologia, ela é maquínica; nunca foram as três ecologias de Félix Guattari. Ou tratamos do que a ciência política de Norberto Bobbio definiu como “ecologia de direita” – voraz consumidora de tudo em prol do Homem. No Brasil seco, sem água, ainda se faz queimadas para “economizar” a mão de obra barata do campo!
Afinal, não há neutralidade diante dos apelos econômicos e funcionais erigidos pelo capital em toda a complexa cadeia produtiva. Frente a frente com a objetividade do consumo desembaraçado de transgênicos e da guerra digital entre nações e potências, o Filósofo da Tecnologia não poderia prever o que Marcuse afirmou tão taxativamente.
No economicismo consumista do século XXI – salvo honrosas exceções – não se pesquisa, muito menos obtêm-se financiamento se não está claro o “aproveitamento” que o sistema fará do empreendimento. O sistema nunca investiu no “melhor empenho”, como se supôs que faria a Educação Permanente de Adam Schaff, na década de 1970. Na linha de produção só há espaço para o melhor desempenho. E isso é meritocracia.
Este uso – digamos instrumental e parafraseando Bourdieu – mapeia uma espécie de guerra científica: A luta científica é uma luta armada (em “Os usos sociais da ciência: por uma sociologia clínica do campo científico”). Não há espaço para diletantismo, serendipidade, bricolagem e consiliência, ou seja, simplesmente não há achado na ciência, não há desimpedimento para o pensamento baseado no método indutivo. Tudo ou quase tudo converge para um pensamento único (na crítica de Ramonet) – sem que haja quem aposte na visão a contrapelo. A rua de mão única é determinada pelo engenheiro moderno: o Maquiavel de nossos dias (como dizia Paul Virilio e também ao final do século passado).
Além dos custos, não há tempo a perder (Just in time) com o método indutivo e, por isso, Bachelard será sempre “coisa” do passado. Tudo é deduzido das premissas que interessam e tem apreço no mercado. As premissas são o consumo (induzido) e a produção imediata (deduzida). Não há carpe diem à espera do inusitado porque, como Benjamin, o flâneur é ultrapassado pelo frenesi do tempo. Nos tempos sombrios, em que “tudo que é sólido desmancha no ar”, tudo é esperado, programado, previsto ainda que em linhas gerais. Não há revelação, porque não há vocação, e Marx e Weber serão clássicos que não se leem. Nesta sociologia pós-moderna, venceu Durkheim.
Vinício Carrilho Martinez
Professor da Universidade Federal de São Carlos
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