Sexta-feira, 27 de abril de 2018 - 19h48

Não se recomenda iniciar um texto expressando um “não”, porque o leitor quer saber do sim em primeiro lugar. O leitor não quer saber o que não-é, mas sim o que é. Porém, como estamos em crise existencial tão profunda da democracia, iniciamos e terminamos o texto com as negatividades atuais de nosso país. Assim...
Não bastasse a seletividade imposta pelo Estado Penal, acionando o racismo & elitismo na busca e captura dos pobres e negros , seguindo-se a lógica da Casa Grande & Senzala, agora temos afronta direta ao Direito Ocidental.
Não bastassem as ações do Supremo Tribunal Federal em arregimentar uma interpretação constitucional contra o texto (líquido e certo) da Constituição Federal de 1988 (trânsito em julgado), agora temos uma ameaça clara vinda do Congresso Nacional – combalido em corrupção e desmoralizado mundialmente ao preço de “emendas parlamentares” – contra as chamadas cláusulas pétreas.
Não bastassem os Capitães do Mato sempre perseguindo os Capitães da Areia, no mais recente capítulo de nossa Transmutação Constitucional – conduzindo-nos de volta à Polaca –, um deputado quer, por emenda à Constituição, mudar o que está disposto como cláusula pétrea. No caso, o referido trânsito em julgado.
Com esses açoites ao Estado de Direito Democrático – que de democrático só tem o nome –, à mais singela lógica jurídica de primeiro ano de curso de direito, esconde-se a ignorância da própria Constituição.
Com a mera proposta, ainda que não prospere, é revelado o fato assustador de que um parlamentar – sem ter lido o Texto Maior, sem que demonstre o mínimo conhecimento e respeito à Constituição – queira injustamente modificar o que desconhece.
Como, perguntaria uma criança com bom senso, alguém pode tecer considerações sobre o que não domina em conhecimento? Pois é, o bom senso diria que não pode.
Mas, como estamos em ano eleitoral e o tal deputado quer embalar seu eleitor em cantilenas de dormir tranquilo, inventa qualquer monstruosidade para angariar meia dúzia de votos.
Pode-se dizer que se trata de estelionato eleitoral, porque, ao falar o que o senso comum na voz rouca das ruas quer ouvir, não diz a verdade dos fatos. A verdade é que o artigo 60, IV da CF88 proíbe qualquer modificação das cláusulas pétreas: a exemplo dos tolos que apresentam projetos de lei instituindo a pena de antecipação da morte e da redução da maioridade penal.
Não passam.
Tanto quanto, espera-se, não passe este absurdo de se anular o princípio da presunção da inocência, ou de, em ultima ratio, recorrer em liberdade. Uma vez que só não é inocente aquele em que a condenação já transitou em julgado, ou seja, com condenação definitiva a Constituição quis que a liberdade fosse a regra e não a exceção.
Qualquer mudança em cláusula pétrea seria admissível – para a maioria dos juristas – se fosse orquestrada em Assembleia Nacional Constituinte. Porém, mais à minoria destes, pode-se dizer que nem mesmo assim os pressupostos do Direito Ocidental poderiam ser destruídos; claramente, porque o Poder Constituinte não é mais aquele que tudo pode, esse “tudo” esbarra na vedação ao retrocesso e no respeito às conquistas sociais da Humanidade. No mínimo.
A presunção da inocência, por exemplo, remonta à Idade Média e ao final da caça às bruxas – quando passaram a poder se defender judicialmente. Porém, em nosso “novo” estelionato jurídico apresentamos nossas saudades tupiniquins.
Além do mais, haveria afronta, mesmo em Processo Constituinte, ao Princípio da Vedação ao Retrocesso Social: sendo inconstitucional, imoral, ilegítimo retroceder no fluxo teleológico do processo civilizatório. Se na Revolução Francesa a burguesia denunciou o autoritarismo, é dever atual que o Poder Constituinte se estabeleça racional e “programado” pelo povo, já que é dele que se origina.
Quer dizer, em outras palavras, que mesmo que o tal deputado sonhe com a barbárie é dever da Humanidade não permitir. Portanto, todos que se consideram humanos deveriam denunciar tais invenções proto-fascistas.
Pois, no fundo, o tal deputado – na ânsia por agradar o eleitor desinformado – poderia trazer uma emenda pró-fascista. Se nosso povo aceitaria isso hoje?
É provável.
Porque já assistimos o desfile do fascismo no cortejo fúnebre da democracia e do Estado de Direito, sem denunciar o abuso de poder e a utilização das estruturas públicas para traçar, ocultar, um plano eleitoreiro.
Vinício Carrilho Martinez (Pós-Doutor em Ciência Política)
Professor Associado da Universidade Federal de São Carlos – UFSCar
Departamento de Educação- Ded/CECH
Vinícius Alves Scherch
Mestrando em Ciência Jurídica na Universidade Estadual do Norte do Paraná – UENP
Advogado
Domingo, 9 de novembro de 2025 | Porto Velho (RO)
Necropolítica e luta de classes no Rio de Janeiro - O fim do Estado
A chacina ou o massacre – como se queira chamar – levados a cabo pelas forças policiais do Rio de Janeiro, a mando do Governador do Estado, no dia 28

Educação e Sociedade: Sociologia Política da Educação
O leitor terá a seguir apresentação do mais recente livro de Vinício Carrilho Martinez, professor titular da Universidade Federal de São Carlos. Ace

Ela pensa? - a inteligência desumana
Tanto fizemos e desfizemos que, afinal de contas, e ainda estamos no início do século XXI, conseguimos produzir uma inteligência desumana, absolutam

Pensamento Escravista no Brasil atual
Esse texto foi pensado como contribuição pessoal ao Fórum Rondoniense de Direitos Humanos – FORO DH, na fala dirigida por mim na mesa Enfr
Domingo, 9 de novembro de 2025 | Porto Velho (RO)