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Gente de Opinião

Silvio Persivo

Nem tudo é tão relativo


Silvio Persivo(*)

Não deixa de ser folclórico que, muitas das pessoas que se dizem de esquerda, fiquem babando e rejubilando-se pelo fato de terem divulgado que Vaccari, o tesoureiro petista, possui um patrimônio pequeno como se isto fosse uma prova de honestidade. Convenhamos que, como em outros casos, é muito provável que os bens e valores adquiridos estejam em nome de outras pessoas ou até mesmo em contas no exterior. Afinal, devemos lembrar que, não é por acaso que a justiça o acusa: inúmeros os delatores que citam sua participação e/ou recebimento de parte das propinas da Petrobras.

Aliás, não é de meu feitio, nem me cabe ficar discutindo culpas. Continuo a dizer que, para mim, a culpa real é a de quem comanda seja a família, a casa, a empresa ou o país. E, neste sentido, é preciso lembrar que o principal acusado de tudo se diz um homem honesto, acima de todas as suspeitas, pelo menos, 90% melhor que todos os jornalistas das principais revistas do país “enfiados uns nos outros”. É claro que tal inocência somente pode ser entendida à luz da ideologia. Como se sabe, no passado, homens como Lenin, Stalin ou Trotsky, utilizaram a versão de que ao revolucionário, ou seja, para quem se diz de esquerda, a mentira, a distorção e até mesmo o assassinato possuem uma conotação diferente, qual seja a de que, como é feito em nome do futuro, do socialismo que, naturalmente, viria, tudo seria válido. Assim, por uma dicotomia bastante conveniente, para uma nova elite, há uma ética para os que atuam em nome do povo e a ética dos burgueses. Assim, quem rouba para o partido e para o suposto futuro, é inocente, por ajudar o curso da história e por construir a utopia socialista. De forma que se, qualquer um de direita, roubar por qualquer motivo será um ladrão mesmo, mas, quem rouba em favor da gloriosa revolução se preso, será, sem dúvida, um preso político. Ou seja, na cabeça de muitos os ideologizados valores como honestidade, respeito aos direitos do próximo, à vida, à liberdade etc., somente se justificariam em função dos propósitos revolucionários. De forma que tudo é relativo e a ética e a política se transformaram em valores instrumentais.

Seria de se esperar que tal relativismo ficasse no passado com a queda do Muro de Berlim e o fim melancólico do socialismo real que deixou suas viúvas inconsoláveis. Mas, não, apesar da evidência histórica, muitos persistem em viver a velha dicotomia entre esquerda e direita e, sob o pretexto de serem os defensores dos pobres, avançam sobre a riqueza de todos brandindo o velho pragmatismo revolucionário. E, mesmo quando se transformaram na elite, e usam (e abusam) do poder durante mais de uma década, se sentem e pregam serem os mais inocentes dos homens por tomar o que não é seu, desde que seja em favor do partido e da revolução, mas, sem abrir mão dos privilégios e das benesses (e muitas vezes alargando-os) que tanto criticavam na velha elite, a quem costumam atribuir tudo que é de ruim inclusive seus próprios erros. É fruto desta distorção mental e do desdobramento de uma lógica infeliz que qualquer um que não concorda com suas teses é perseguido e vira inimigo. Os monopolistas da verdade, e do bem comum, usam o poder que tomaram, graças às liberdades democráticas, para solapá-las e não medem os meios para facilitar a instauração de uma “ditadura do proletariado”, inclusive usando recursos públicos e tentando manietar a imprensa por meio de dinheiro ou até mesmo de supressão das vozes discordantes. O problema é que, num país complexo como o Brasil, é preciso, pelo menos, ter uma gestão eficiente da economia e, neste sentido, o velho hábito socialista de viver somente do trabalho alheio parece que se esgotou. Não é a política quem está enterrando as velhas ideias, mas, sim a economia. O governo vive da iniciativa privada e não pode, como tem sido feito sistematicamente, apenas sugar das classes produtivas sem afetar, drasticamente, os níveis de bem-estar e de crescimento econômico. O fim do ciclo do PT não será alcançado via política e sim pela economia. Pelo fato inconteste de que não há almoço grátis.

(*) É doutor em Desenvolvimento Sustentável pelo NAEA/UFPª.

* O conteúdo opinativo acima é de inteira responsabilidade do colaborador e titular desta coluna. O Portal Gente de Opinião não tem responsabilidade legal pela "OPINIÃO", que é exclusiva do autor.

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