Sábado, 1 de dezembro de 2012 - 09h45
Ontem, 30 de novembro de 2012, enquanto arrumava recortes de jornais antigos, um deles mobilizou minha atenção: tratava-se de uma crônica no Segundo Caderno de O Globo, que eu recortara e guardara, encantada pela deliciosa narrativa de uma escritora de origem portuguesa sobre uma experiência fantástica: a noite que passara sozinha, dormindo no quarto que pertencera a Fernando Pessoa. O jornal, que começa a amarelar, é de 30 de novembro de 2011.
Não obstante as mudanças por que passara o prédio em que vivera o poeta, ao longo do tempo, o quarto de Pessoa foi mantido intacto: a cama, o guarda-roupa, a cômoda, o criado-mudo. Nas paredes, seus versos manuscritos. Próximo à porta, um cabide com um traje completo do escritor: camisa social de cor branca, terno escuro, gravata, chapéu; no chão, os sapatos; tudo isto, no célebre endereço do poeta: Rua Coelho da Rocha, 16, Lisboa, claro.
A ideia era que a escritora de origem portuguesa passasse ali uma noite inteira e depois escrevesse sobre a experiência.
Tudo lhe parecera muito fácil, dada a artificialidade que a passagem do tempo e a tentativa de recriar o ambiente, transformado em museu, conferiram ao espaço. Assim, a escritora prepara-se para uma noite de sono: deposita os objetos pessoais no criado-mudo, deita-se na cama de Fernando Pessoa e tenta adormecer. Em vão.
Lá pelas tantas da madrugada, nossa cética personagem resolve explorar mais o espaço, afinal não é todo dia que se tem a oportunidade de xeretar os guardados de personalidade tão enigmática e fascinante como aquela. Assim, levanta-se da cama, ultrapassa a corrente de isolamento que mantém os objetos do poeta ao largo dos visitantes, e abre uma gavetinha da cômoda; ali, depara-se com o mapa astral de Álvaro de Campos e com cartões de visita do médico Ricardo Reis (ambos heterônimos de Fernando Pessoa). Naquele exato momento percebe que alguma coisa mudara; tudo se tornara diferente: a atmosfera, o ambiente, o mobiliário, ela própria; sente medo.
Ouve passos no andar de baixo como se alguém houvesse adentrado a casa; os passos firmes sobre o assoalho de madeira encerada tornam-se mais próximos, sobem a escada que conduz ao quarto e param diante da porta da moça; ela, com os olhos fixos na porta fechada, quase desmaia quando esta se abre e, diante de si, aparece a figura de um homem: é Fernando Pessoa. A mulher, àquela altura, numa espécie de transe, caminha em sua direção.
Na penumbra do quarto, os olhos de ambos brilham, olham-se longamente; um olhar tão profundo que os leva a navegar um n'alma doutro. Amam-se. E àquela hora pouco importou à mulher qual dentre tantos estaria amando: Álvaro de Campos, Ricardo Reis, Alberto Caeiro ou Bernardo Soares; apenas ouve-lhe a voz em doces versos:
“Vem sentar-te comigo, Lídia, à beira do rio.
Sossegadamente fitemos o seu curso e aprendamos
Que a vida passa e não estamos de mãos dadas.
(Enlacemos as mãos)
... Desenlacemos as mãos, porque não vale a pena cansarmo-nos.
Quer gozemos, quer não gozemos, passamos como o rio.”
Assim, embalada pela voz suave que lhe sussurrava doces versos, a escritora finalmente adormeceu .
É deste modo que vagueia nossa romântica imaginação... E esta segue a escritora portuguesa que, na manhã seguinte, fagueira, flutua de vestido florido saltitante pelas ruas e becos de Lisboa, visitando os locais preferidos de Fernando Pessoa, impregnada e inebriada por sua poesia.
Mas este, caro leitor, é apenas o meu fantasioso desfecho para esta história, pois o da escritora que passou a noite no quarto do poeta é outro. Aliás, minha imaginação, encantada com a experiência vivida pela talentosa escritora, tratou de modificar-lhe a narrativa e de proporcionar-lhe uma inesquecível noite de amor com o poeta: os passos? Existiram de fato, assim como o homem que surge à porta do quarto; Fernando Pessoa voltara do mundo dos mortos? Não. Tratava-se apenas do vigia, conferindo se estava tudo bem.
Um dado do relato, porém, alimenta nossa sonhadora alma: pela manhã, o mapa astral de Álvaro de Campos e os cartões de visita do médico Ricardo Reis haviam sumido da gaveta.
“Enquanto dura esta hora,
Este luar, estes ramos,
Esta paz em que estamos,
Deixem-me crer
O que nunca poderei ser.”
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