Sábado, 5 de julho de 2025 | Porto Velho (RO)

×
Gente de Opinião

Montezuma Cruz

Propostas renovadas e peões em fuga



 


RONDÔNIA DE ONTEM

  Propostas renovadas e peões em fuga  - Gente de Opinião


 

MONTEZUMA CRUZ
Editor de Amazônias


Antes de ir para Cerejeiras, o esperto João Correia, de Cáceres (MT), reuniu-se com promotores de Justiça, delegado da PF e outras autoridades, para lavrar um termo de responsabilidade sobre peões libertados que pretendiam ir para Mato Grosso. No entanto, Correia era sócio da empresa Soteco, contratante de mão-de-obra rural.

Prometia a todos que concordassem em voltar ao trabalho de desmatamento abonar dívidas contraídas no barracão (armazém da fazenda), daria “livre trânsito”, aumentaria os créditos e pagaria 1 mil 700 cruzados por alqueire derrubado. Cruzado era a moeda em vigor em 1986.

Alguns dos peões olhavam-no, desconfiados pela benevolência de contratá-los aparentemente “sem a interveniência de gatos”. Ao conceder-lhes “livre trânsito”, Correia falava mais alto que a própria Constituição Brasileira. No meio do pessoal havia alguns jagunços que tinham contas a acertar com a polícia. Todos eles eram fugitivos da lei.Propostas renovadas e peões em fuga  - Gente de Opinião

Com a mesma esperteza de Correia, fazendeiros da região ofereceram três aviões aos fiscais do Ministério do Trabalho, para que percorressem a região e efetivassem uma “rigorosa inspeção”.

Mesmo voando no helicóptero do governo estadual, o “Trovão azul” tão usado pelo governador Teixeirão, os fiscais Rodolfo Simonek e Nacira Simonek queixaram-se de que tiveram pouco tempo para apurar as irregularidades.

Dez dias depois de serem soltos graças à intervenção da Promotoria de Justiça em Cerejeiras e da Polícia Federal, duzentos peões acamparam na pracinha, onde receberam dos comerciantes e dos padres: arroz, feijão, farinha, pão e carne.

No segundo dia, o cardápio foi reduzido a pão, feijão e alguns ossos, porque a população já auxiliava, havia cinco meses, diversas famílias despejadas da Fazenda Guarajus. Elas também estavam acampadas em Cerejeiras.

Os promotores Osvaldo Luís Araújo e Charles José Grabner não viam prosperar os processos, por causa das dificuldades em ouvir os trabalhadores.

Eles saíam angustiados da cidade, prontos para buscar outras empreitadas bem longe “do inferno”. Até mesmo o peão Silvano Cardoso, 33 anos na época, espancado em estado febril. Até mesmo o menor Cícero, obrigado a desmatar, mesmo com parte do joelho arrancada por uma motosserra.

Se na escravatura os negros construíam quilombos, onde viviam escravos perseguidos por capatazes dos casarões, em Cerejeiras os peões adentravam a mata na localidade de Nova Esperança, sob risco permanente de serem capturados pelos jagunços.

Nas Fazendas Bordon e Antonio José, a caçada aos desertores usava métodos sofisticados: avião, rádio e armas de grosso calibre. Infeliz de quem alcançava outra fazenda: terminava preso pelos fiscais de lá.

Os fazendeiros cuidavam de ocultar os crimes de sevícia, tortura e cárcere privado. Contratavam advogados e despistavam investigações policiais, que raramente ocorriam. Métodos antigos, métodos repetidos. Lamentavelmente, hoje ainda ocorrem situações semelhantes.

 

 

Siga Montezuma Cruz noGente de Opinião

 
www.twitter.com/MontezumaCruz
 
 


ANTERIORES


Antes do Estado, a escravidão

'Índio bom é índio morto'

Chacinas indígenas marcaram para sempre a Amazônia Ocidental
 

'O coração do migrante é verde'

►O futuro no Guaporé, depois Cone Sul


Coronel é flagrado de madrugada, levando peões para o Aripuanã

 

O gaúcho Minski, rumo a Cerejeiras

► Valdemar cachorro, o 'compadre' dos índios

► Policiais paulistas 'invadem' Rondônia 
    na caça aos ladrões de cassiterita


► TJ manda libertar religiosos e posseiros
     após o conflito  da  Fazenda Cabixi


► A sofrida busca do ouro no Tamborete,
    Vai quem quer  e  Sovaco da Velha


► Aquela que um dia foi Prosperidade


► Energia elétrica a carvão passou raspando

 

► Cacau chega à Alemanha, sob conspiração baiana

► Ministro elogia os 'heróis da saúde'

 

► Naqueles tempos, um vale de lágrimas

 
Publicado semanalmente neste site,
no
RondôniaSim e no Correio Popular.

 

 

 

* O conteúdo opinativo acima é de inteira responsabilidade do colaborador e titular desta coluna. O Portal Gente de Opinião não tem responsabilidade legal pela "OPINIÃO", que é exclusiva do autor.

Gente de OpiniãoSábado, 5 de julho de 2025 | Porto Velho (RO)

VOCÊ PODE GOSTAR

Lodi, mestre das letras, lança “Varadouro”, contando a história de Maria da Onça

Lodi, mestre das letras, lança “Varadouro”, contando a história de Maria da Onça

Ao longo de duas décadas o escritor, jornalista e poeta Edson Lodi Campos Soares vem resgatando notáveis personagens da Amazônia Brasileira, cuja vi

Rio Juruá é uma extensa "estrada aquática" onde só o motor de rabeta salva canoas

Rio Juruá é uma extensa "estrada aquática" onde só o motor de rabeta salva canoas

Fiz três viagens pelo Rio Juruá de duas décadas para cá. Vi o esforço dos pilotos de canoas e barcos para desencalhá-los entre Marechal Thaumaturgo e

Rondoniense Samuel Saraiva recebe credencial meritória de “assessor do Trump” por contribuições à cidadania

Rondoniense Samuel Saraiva recebe credencial meritória de “assessor do Trump” por contribuições à cidadania

WASHINGTON, DC – O reconhecimento da ação cidadã voluntária é uma prática tradicional usada em países do chamado 1º Mundo. O rondoniense Samuel Sales

Jagunços de colonizadora jogaram colono baleado às formigas

Jagunços de colonizadora jogaram colono baleado às formigas

"Que horror" - exclamávamos na Redação de A Tribuna, quando soubemos do ocorrido com o gaúcho João Cecílio Perez em 1979. Jagunços a serviço da Coloni

Gente de Opinião Sábado, 5 de julho de 2025 | Porto Velho (RO)