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Francisco Matias

MADEIRA-MAMORÉ, 76 ANOS DE NACIONALIZAÇÃO


1.Nesta terça-feira, 10 de julho 2007, o estado de Rondônia, especificamente o oeste rondoniense, tem uma importante data a comemorar, o 10 de julho. Nesta data, em 1931, início da Era Vargas, a empresa anglo-canadense The Madeira and Mamoré Railway Company Limited tornou-se brasileira. Foi nacionalizada e passou a ser denominada Estrada de Ferro Madeira-Mamoré S.A. por força do Decreto Lei 10.200, baixado pelo presidente Getúlio Vargas. Não foi uma decisão política das mais fáceis de ser tomada, apesar do grande apelo nacionalista da República Nova implantada pela Revolução de outubro de 1930 que levou Getúlio Vargas ao poder. As razões do governo em intervir em uma empresa estrangeira foram provocadas pela própria empresa e pelos desdobramentos da grande depressão mundial a partir da quebra da Bolsa de Valores de Wall Street, em 1929, em cujos pregões eram negociados os títulos da multinacional Madeira-Mamoré.

2.Pois bem. Esta data já foi contestada em um seminário ocorrido aqui em Porto Velho, em 1981, pelo escritor Manoel Rodrigues Ferreira, autor do famoso livro A Ferrovia do Diabo, talvez o melhor trabalho já escrito sobre a ferrovia Madeira-Mamoré. Manoel Rodrigues Ferreira alegou naquele seminário que não se devia considerar a data da nacionalização porque simplesmente não houve tal procedimento. Disse o renomado escritor que o governo Vargas não poderia nacionalizar a ferrovia pelo fato de a estrada de ferro haver sido construída em solo nacional brasileiro. Logo, era nacionalizada. Era brasileira. E não é que os argumentos de Manoel Rodrigues Ferreira ganharam adeptos entre os historiadores regionais e jogaram por terra o 10 de julho e a nacionalização da Madeira-Mamoré. Mas havia ali, naquele seminário, algo mais do que o entendimento de um ato, de um processo histórico. Havia uma oposição ao militar Aluízio Pinheiro Ferreira, o primeiro administrador brasileiro da Madeira-Mamoré. Portanto, antes de qualquer análise sobre a nacionalização, Manoel Rodrigues Ferreira seus seguidores pretendiam sepultar a memória do militar e político Aluízio Ferreira, o Nacionalizador, ainda que o episódio da nacionalização da Madeira-Mamoré fosse sacrificado. Bolas para a História...

3.Portanto, Manoel Rodrigues Ferreira e seus neo-seguidores não se preocuparam em entender que não foi a ferrovia o objeto da nacionalização, mas a empresa, os ativos, o patrimônio, o gerenciamento, o empreendimento. Não quiseram entender que a Madeira-Mamoré não era apenas a estrada de ferro, mas todo o conglomerado empresarial cuja sede ficava nos EUA, apesar de seus controladores serem ingleses e canadenses. Não se permitiram o mínimo de entendimento que a Madeira-Mamoré não fazia somente o transporte ferroviário, mas atuava no sistema multimodal de transporte, utilizando a rodovia, a ferrovia, a hidrovia e, por fim, as vias marítimas, e na produção de borracha e sua comercialização e exportação, além de outros interesses empresariais. Nem quiseram pensar que o empreendimento se estendia da Bolívia (Riberalta) ao Mato Grosso, do Mato Grosso ao Amazonas, ao Pará e aos EUA. Não. A vontade política de fazer oposição era maior do que a compreensão do fato histórico, da ordem política da época e da administração estrangeira do empreendimento. E, por muito tempo, esse pensamento prevaleceu. Até que, no final da década de 1980, a verdade histórica voltou e o 10 de julho foi recuperado, revitalizado, e está aí, independente de conotação política de cutubas e peles-curtas, mas como um fato importante que mudou completamente a linha de ação da empresa Madeira-Mamoré.

4.Em Rondônia, a reverência e as comemorações das datas históricas, de uma maneira geral, muitas vezes são relegadas a um plano secundário, (para ser econômico com o descaso do poder público com fatos históricos e políticos). Foi assim com o 4 de julho, data do início da construção efetiva da ferrovia Madeira-Mamoré, em 1907, que marcou também o surgimento da vila ferroviária Porto Velho de Santo Antonio. Atendendo a um escritor, o governo do Estado decidiu não comemorar a data. E, mais uma vez, o estado perde suas referências históricas, que já não são lá essas coisas, e estão caindo no esquecimento ou adquirem os contornos da figura sorumbática e enganosa do Velho Pimental, que insiste em apagar fatos históricos aparecendo em revistas e livros apenas porque um ou outro acredita na lenda. Nesse contexto, a mentira vai sendo repetida até virar verdade. Lamentavelmente. Salve a nacionalização da empresa Madeira-Mamoré. Viva o 10 de julho.

Fonte: Francisco Matias
Historiador e Analista Político  Porto Velho 

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