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Francisco Matias

LUIZ GALVEZ, O INJUSTIÇADO – Parte Final


1. O ano de 1899 foi marcante para o Acre. No dia 4 de junho, os governadores José Cardoso Ramalho Junior, do Amazonas, e José Paes Ramalho, do Pará, despacham uma expedição comandada pelo espanhol Luiz Galvez Rodrigues y Arias com destino ao Acre boliviano. Sua missão: substituir a José de Carvalho e assumir o comando do movimento rebelde acreano. D. Galvez, passava de repórter, ex-funcionário de embaixadas a representante do governo do Amazonas no Acre. E ele sabia bem o que devia fazer. Sabia também do ódio mortal que o governo boliviano tinha por ele. Pior. Que o governo norte-americano tinha por ele por haver revelado a missão da canhoneira Wilmington que levou a minuta do contrato da Bolívia para ser formado o consórcio Bolivian Syndicate, uma poderosa empresa de carta que teria plenos poderes no Acre, principalmente o de expulsar pela força das armas, os brasileiros que ali viviam. Ao revelar o Plano Acre, D. Galvez antecipou os fatos e se precipitou em sua maior aventura.
 
2. D. Luiz Galvez não era apenas ambicioso. Era um visionário. Queria entrar para a história mundial pela porta da frente. Por isso, liderando uma nova rebelião no Acre, ele fundou um país e escolheu uma data muito propícia: o dia 14 de julho de 1899. Era a data do centenário da Queda da Bastilha que originou a Revolução Francesa. Galvez era a revolução francesa no Acre e a Bastilha, o poder da Bolívia e do Bolivian Syndicate. D. Galvez foi mais longe. Fundou a República Independente do Acre, justificando que "não podendo ser brasileiros, os seringueiros acreanos não aceitavam tornar-se bolivianos". Implantou o governo do país, que os EUA classificaram como 'um país da borracha". D. Luiz Galvez, chamado "O Imperador do Acre", não sabia que era apenas um joguete nas mãos do governador do Amazonas e que seria jogado às piranhas do Purus tão logo a situação lhe ficasse adversa. Ele não percebia o jogo que o governador Ramalho Junior fazia e foi longe demais. Como presidente da República do Acre, D. Galvez instituiu as Armas da República, despachou credenciais e enfrentou a ira dos EUA e da Inglaterra. E sofreu o primeiro revés. Um golpe de Estado em seu governo com apenas seis meses de existência o retirou do cargo. A República virava o Estado Livre do Acre, governado pelo seringalista cearense  Antonio de Souza Braga.
 
3. Menos de um mês depois, D. Galvez reassume e refaz a República do Acre. Mas, ele não tinha força política e as pressões dos EUA e da Inglaterra estavam levando o governo brasileiro a mudar de atitude. Na verdade, o Brasil se recusava a agir porque alegava considerar o Acre boliviano e, portanto, o problema era para ser resolvido pela Bolívia. E a Bolívia bem que tentou. Mandou soldados para o Acre mas, foram derrotados pelo exército de seringueiros formado pelo presidente Luiz Galvez. O governo boliviano apelou para o Brasil com o Tratado de Ayacucho, assinado em 1867 entre o Brasil e a Bolívia que reconhecia o Acre como possessão boliviana. Foi a derrota de Galvez. O Brasil despachou uma expedição militar composta por quatro navios de guerra e um outro conduzindo tropas de infantaria para prender Luiz Galvez, destituir a República do Acre e devolver a região aos domínios da Bolívia. No dia 11 de março de 1900, Luiz Galvez Rodriguez y Arias rendeu-se à força-tarefa da marinha de guerra do Brasil, na sede do seringal Caquetá, às margens do rio Acre. Estava encerrada a saga do espanhol Galvez, o homem que enfrentou o poderio norte-americano, foi enganado pelos governos do Amazonas e do Pará, e foi preso e deportado pelo governo brasileiro. Seu sonho de poder desapareceu nas águas do Purus
 
4. D. Galvez ainda retornou ao Brasil, anos depois, mas o governo do Amazonas o prendeu e o recambiou para o Forte de São Joaquim do Rio Branco, hoje estado de Roraima, de onde fugiria tempos depois. Ele morreu na Espanha. Ao definir D. Galvez como "O Injustiçado" é para lembrar que este homem deu a primeira organização do Acre, como uma República Independente, enfrentou a fúria dos EUA, foi vítima da política amazonense, semeou a semente do atual estado do Acre e, por conseguinte, da primeira formação de Rondônia pela Madeira-Mamoré, e não tem nenhum município acreano com o seu nome. Tem um rio, o rio Galvez, mas não corresponde à sua importância histórica. Ele era um aventureiro, mulherengo, conquistador, corajoso, inteligente e sagaz, mas não conseguiu concretizar o seu sonho de poder. Está esquecido pela História, como esquecida está a parte da História que trata das várias rebeliões acreanas e da Guerra do Acre, que não foi travada entre o Brasil e a Bolívia, mas sim, entre o Brasil e o Peru. Não fosse pela minissérie....
 
Fonte: Do livro  O Tratado de Petrópolis, Diplomacia e Guerra na Fronteira Oeste do Brasil,
inédito, do Historiador e Analista Político Francisco Matias
 

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