Quinta-feira, 5 de setembro de 2013 - 06h03
Felipe Azzi
VALDENOR GRAFIATO DOS SANTOS, a melhor tesoura de GRASSUÍ DO RIO SECO, alfaiate de profissão e orador avulso nas horas vagas, era conhecido como “VAVÁ-PEÇO-A-PALAVRA” porque não perdia ocasião para ministrar nos ouvidos de plantão a força de sua oratória.
Falava difícil, usando termos esquecidos em alfarrábios dos mais herméticos dicionaristas. Impressionava. O único senão é que tinha um proceder esquisito e repetitivo. Entre uma frase e outra, espichava o pescoço para lado e repuxava a aba da gola do paletó para baixo, pigarreando. Houve quem afirmasse que era cacoete trazido da infância.
Vivia vasculhando as datas comemorativas ou acontecimentos públicos, para colocar seus préstimos vernaculistas à disposição do povo. Costumava dizer:
– O que o povo mais gosta é de falação!... De esquisitices da nossa língua, com palavras alongadas e foneticamente bem colocadas.
Bastava ouvir falar da visita de um figurão importante ou da passagem do Governador pela Comarca, para perguntar:
– Já tem alguém nomeado para saudar o ilustre visitante?
Aconteceu que um inesperado pedido de casamento escapou do gramofone fonético de VALDENOR. Mas uma inauguração importante foi colhida de surpresa. Era o início das atividades da Fábrica de Fogos de Artifício “PROGRESSO LUMINOSO”, coisa pomposa, de encher de orgulho o povinho de Grassuí. Sem perder espaço e tempo, pediu a palavra, estufou o peito, dizendo:
– Esse acontecimento vai colocar Grassuí no cenário dos mais estratosféricos do céu... Municiado de muita pólvora, desencadeando expansão violenta com arrebentação de estrondo... Suscitando uma grande iluminadura incandescente multicolorida.
E, dando guarida ao cacoete de estimação, foi enfático:
– Vão ter que respeitar o nosso Município!... Vão falar conosco com mesura subalterna, envergando o corpo no estilo de cabo de guarda-chuva. É esperar pra ver!
Um criador de pássaros, no meio da multidão, liberou da gaiola da garganta uma admiração cheia de penas:
– Sujeito empertigado!... Parece um pombo, com o peito cheio, em tarefa de acasalamento. Mas fala com corretismo. Levo muito apreço no que diz.
A profecia de VALDENOR só não se confirmou porque, no primeiro “São João”, a cidade foi pelos ares devido à incompetência de um certo “Zé-cabeça-de-fogo”, com a ajuda da bagana de seu fumar.
Grassuí do Rio Seco não foi à estratosfera, ficou aqui mesmo, nas manchetes dos jornais.
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