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Dom Moacyr

UMA LEITURA DAS 'ÁGUAS DE MARÇO'



A Semana da Água deixou-nos imagens estarrecedoras e profundas lições. Populações que jazem nas águas dos oceanos evidenciam um cenário de mortes imprevisíveis e nos levam a orar: Senhor, que nesta quaresma nos convertamos e vejamos que a criação geme em dores de parto, para que possa renascer segundo o vosso plano de amor, por meio da nossa mudança de mentalidade e de atitudes. Movidos pelos princípios do Evangelho, possamos celebrar na Páscoa do vosso Filho, nosso Senhor, o ressurgimento do vosso projeto para todo o mundo. Amém (Oração Campanha da Fraternidade 2011).

Lendo uma análise de Marco Aurélio Weissheimer no jornal virtual Carta Maior, sobre como as tragédias naturais expõem a perda da noção de limite, é possível perceber “o que está acontecendo agora com as usinas nucleares japonesas atingidas pelo grande terremoto do dia 11 de março é mais um alarmante indicativo do tipo de tragédia que pode atingir o mundo globalmente”. Citando o geólogo Rualdo Menegat, diz que “não podemos ocupar o fundo dos mares, não podemos ocupar arcos vulcânicos, não podemos ocupar de forma intensiva bordas de placas tectônicas ativas, como o Japão, o Chile, a borda andina, a borda do oeste americano, como Anatólia, na Turquia”.

O que esses eventos nos mostram é a progressiva cegueira da civilização humana contemporânea em relação à natureza. A humanidade está bordejando todos os limites perigosos do planeta Terra e se aproxima cada vez mais de áreas de riscos, como bordas de vulcões e regiões altamente sísmicas. “Estamos ocupando locais que, há 50 anos atrás, não ocupávamos; como as nossas cidades estão ficando gigantes e cegas, elas não enxergam o tamanho do precipício, a proporção do perigo desses locais que elas ocupam”, diz ainda o geólogo, que resume assim a natureza do problema: “estamos falando de 6 bilhões e 700 milhões de habitantes, dos quais mais da metade, cerca de 3,7 bilhões, vive em cidades. Isso aumenta a percepção da tragédia como algo assustador. Como as nossas cidades estão ficando muito gigantes e as pessoas estão cegas, elas não se dão conta do tamanho do precipício e do tamanho do perigo desses locais onde estão instaladas. Isso faz também com que tenhamos uma visão dessas catástrofes como algo surpreendente".

E das grandes tragédias, certa vez disse Eduardo Galeano: "Espero que elas sirvam pelo menos para ressaltar que devemos deixar de chamá-las catástrofes naturais. Sim, são catástrofes, porém, são o resultado do sistema de poder que enviou o clima ao manicômio".

Estamos em plena Campanha da Fraternidade, com a proposta de contribuir para a conscientização da sociedade sobre a gravidade do aquecimento global e das mudanças climáticas, motivando a participação de debates e ações que visem o enfrentamento do problema e a preservação das condições de vida no planeta.

O aquecimento global e as mudanças climáticas já não se situam somente em nível teórico, mas se constituem em realidades palpáveis. O processo de mudança climática em curso representa um grande perigo para a vida e, se não houver uma reação adequada de modo a contê-lo, as condições para a continuidade da vida no planeta vão se deteriorar profundamente. A Igreja, em suas comunidades, precisa estar consciente da problemática para colaborar em vista das mudanças comportamentais e urgentes para evitarmos legar às futuras gerações, um planeta que não ofereça mais condições para abrigar a vida. É necessário que o resgate da responsabilidade ética motive e faça convergir ações de cunho social até de alcance planetário, visando o cuidado deste imenso ser vivo chamado planeta Terra. Felizmente, temos na história exemplos de momentos particularmente difíceis enfrentados com empenho criativo e solidário pela humanidade, avançando em direção a um futuro melhor. A opção pela vida é o grande referencial. Assim tem sido e esta opção precisa ser reafirmada, recolocando no centro da pauta da humanidade o cuidado com o mundo vital (TB/CF).

O 2º Domingo da Quaresma convida-nos a refletir o texto da Transfiguração: Jesus sobe à montanha com Pedro, Tiago e João. Quantos irmãos japoneses, após ouvirem a sirene do tsunami, subiram apressadamente à montanha, buscando segurança nos lugares mais altos de suas cidades. Depois da desolação, talvez o melhor fosse permanecer no alto da montanha.

Contudo é preciso ler os sinais e escutar a declaração de Deus: “Este é meu Filho amado, nele está meu pleno agrado: escutai-o” (MT 17,1-9). Jesus é a única autoridade credenciada pelo Pai. Ele está conosco para nos ajudar a descer do monte e a vencer o medo e a perplexidade.

É preciso que compreendamos que o caminho para o seguimento de Jesus, Servo de Deus, implica “descer da montanha” e assumir as consequências, conforme o testemunho do Mestre. Porém, esse não é um caminho derrotista. “A vida triunfa sobre a morte. A glória de Deus se manifestará plenamente na ressurreição. A transfiguração é um sinal antecipado da realidade da Páscoa” (V.Pastoral).

 

As Comunidades Eclesiais de Jaci Paraná

O Dia Mundial da Água, realizado em 22 de Março, quer chamar a nossa atenção neste ano para o impacto do rápido crescimento urbano, industrialização e as incertezas provocadas pelas mudanças climáticas, os conflitos e as catástrofes naturais em sistemas urbanos de água.

Esta Semana da Água nos remete também aos trágicos acontecimentos ocorridos no interior da construção da Usina Hidrelétrica de Jirau. As “águas de março” falam do “fim do caminho, da morte, do desgosto no rosto e ainda de promessa de vida”. No corredor da 364 milhares de trabalhadores estão retornando desiludidos; na reunião do clero,ouvimos seus relatos: pais de família perplexos que ficaram sem trabalho de um dia para o outro e muitas cenas de violência.

A Igreja Particular de Porto Velho, sempre presente junto às Comunidades Eclesiais de Base de Mutum, Abunã e Jacy-Paraná, tem acompanhado o trabalho pastoral de Padre João Batista T. Silveira e sua equipe missionária. São quase 40 Comunidades espalhadas no centro dos distritos, em áreas ribeirinhas, nas linhas e travessões das áreas rurais. Devido à hidrelétrica, muitas famílias já foram deslocadas para outras localidades; sendo desalojadas do que era antes uma comunidade integrada, após novas instalações viram seus núcleos multifamiliares perderem sua identidade.

Agora, trabalhadores.. migrantes.. são deslocados. É a Amazônia que se move. É um movimento intenso da atividade humana, em busca de algo, de trabalho, sonhos. Pessoas chegam hoje, amanhã vão embora. Este constante processo de migração e de “peregrinação” tem um reflexo significativo na maneira de ver e de viver de nossa população. Muitas pessoas acabam saindo de uma realidade comunitária, solidária em que a pessoa era conhecida e valorizada, para viver numa situação de individualização e de isolamento, mesmo no meio de multidões, com importantes reflexos, muitas vezes negativos, em suas vidas. Através de vários organismos, estamos acompanhando as noticias de ilegalidades e violação de direitos humanos. O povo de nossa região convive com os males das desigualdades sociais reinantes no País.

Hoje nosso município sofre um descompasso, pois apesar de uma sociedade politicamente organizada, com uma prefeitura que busca acima de tudo a promoção do bem comum, Porto Velho, considerando a extensão com seus distritos e os grandes projetos governamentais, é uma cidade desigual que gera muitos distúrbios e problemas sociais.

Aos trabalhadores que estão em busca de seus direitos, que este seu caminhar e luta sejam sustentados pela coragem de quem sabe aonde chegar. Nessa desafiadora viagem, possamos unir forças com tantos outros e outras em busca de “um novo céu e nova terra”.

Fonte: Pascom

 

* O conteúdo opinativo acima é de inteira responsabilidade do colaborador e titular desta coluna. O Portal Gente de Opinião não tem responsabilidade legal pela "OPINIÃO", que é exclusiva do autor.

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