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Dom Moacyr

Natal: início da nova criação!



Estamos em ritmo de preparação ao Natal, através da Novena do Natal em Família. Na contemplação das figuras do presépio, na leitura do Evangelho e dos povos da Amazônia, na união da comunidade e dos grupos de reflexão, no encontro das famílias, buscamos com profunda fé e esperança, a vinda de Jesus no Natal, um novo nascimento espiritual, a renovação da nossa vida cristã. O Menino do presépio encarna e fundamenta a solidariedade e a paz, a fraternidade e a alegria da vida comunitária e responde aos nossos anseios mais profundos.

Jesus nasceu para fazer de nós membros da mesma família e nos conduzir na santidade e na justiça de modo a chegarmos à paz e alegria. Assim aconteceu com os pastores, com os Magos e com todos os que acorreram ao presépio. “Àqueles que O receberam, aos que nele crêem deu-lhes o poder de se tornarem filhos de Deus” (Jo 1,12).

Maria concebeu seu filho Jesus, Palavra de Deus, pela força do Espírito Santo. Esse mesmo Espírito está no início da missão de Jesus de Nazaré. A criação dos seres humanos à semelhança de Deus e a encarnação do amor redentor de Jesus até a cruz fundamentam nosso compromisso com a realidade do mundo e com o sofrimento do outro. E esse compromisso não é solitário; é comunitário (P. Suess).

Na Revista do Instituto Humanitas Unisinos (18/12/2006), o professor Martin Dreher, ao falar de suas razões para ainda ser cristão, testemunha: “sou cristão porque fui conquistado por uma criança com membros frágeis que foi deitada em um cocho, pois não havia espaço para ela em sua sociedade. Não nasceu nem no palácio de Augusto, nem no palácio de Herodes, mas entre os animais. Teve pai e mãe, mas teve que nascer na margem da margem, em terra ocupada por estrangeiros, em aldeia insignificante, reverenciada por gente da margem: pastores e pastoras fedorentos e astrólogos nada ortodoxos.

Sou cristão porque fui conquistado pelos membros frágeis do crucificado que me ensinou a ter esperança e a depositá-la no Reino de Deus, utopia que buscou concretizar em sua existência, lembrando as aves do céu, as raposas em seus covis, os lírios do campo, a semente que cresce enquanto dormimos, partilhando cinco pães e dois peixes e conseguindo saciar quem tinha fome, que soube devolver à Mãe o único Filho, amparo na velhice, que soube devolver dignidade a excluídos. Com base nesses sinais, manifesto minha esperança no Reino de Deus e procuro comunicá-los, mesmo que de maneira imperfeita e provisória. Estou convicto de que eles são mais importantes do que ciência e técnica e que um mundo secularizado carece, desesperadamente, deles”.

Percebemos que, de fato, “o homem é criado na Palavra e vive nela; e não se pode compreender a si mesmo, se não se abre a este diálogo. A Palavra de Deus revela a natureza filial e relacional da nossa vida” (VD 22-23). Jesus se apresenta a nós precisamente como Aquele que veio para que pudéssemos ter a vida em abundância (Jo 10,10).

Nossas Comunidades Eclesiais, propulsoras do Reino, precisam estar conscientes dos desafios que afetam diretamente a vida de nossos biomas e da problemática do aquecimento global, bem como suas consequências em nosso planeta e as atividades do ser humano que estão ocasionando ou no mínimo contribuindo para esta situação. Assim será possível colaborar em vista das mudanças necessárias e urgentes para evitarmos legar às futuras gerações, um planeta que não ofereça mais condições para abrigar a vida (TBCF 2011,97,198).

O missionario comboniano, Pe Dário, através da Adital, questiona o que será do Natal quando Deus nasce menino, às periferias do Império romano, e renasce pequeno às margens desse ‘des-envolvimento’ desenfreado.

Para ele, Deus pequeno, isto é, preocupado para com os ritmos lentos e resistentes de nossa gente: sinais que aqui encontramos nas comunidades ribeirinhas, entre homens e mulheres agricultores, nas famílias dos migrantes, junto aos povos indígenas e da floresta. Esses são os pastores de hoje, aos quais é dada a boa-nova: “uma criança nasceu para vocês”!

A igreja no Brasil, apesar de muitos limites, compreendeu o segredo do Natal que a cada ano se repete. Por isso, não põe o acento somente num nascimento especial, mas pela Campanha da Fraternidade que está por vir aponta a todo o processo de criação que Deus colocou em nossas mãos e que Jesus nos desafia a renovar.

Segundo Pe. Dário, enquanto o ‘des-envolvimento’ corre sem freios pelas linhas verticais da extração e exportação de recursos, a vida continua em círculos concêntricos e redes horizontais de relações, garantidas pelas comunidades em seus territórios e individualidades.

Celebrar o Natal, assim, significa acreditar teimosamente que Deus nasce onde ninguém sabe, longe dos holofotes e grandes projetos, nas comunidades ameaçadas pela concentração de terra, nas cooperativas que tentam reinventar a pequena produção, nas agricultura familiar, nas festas populares de bairro ou nas demais celebrações comunitárias.
A nova criação já começou, precisamos defendê-la e espalhar suas sementes em todos os campos. O cuidado com o ambiente deve, hoje, incluir também as gerações futuras. Mas o próprio direcionamento escatológico da fé cristã aponta para a consumação final da história e da criação como obra redentora de Deus. Que as nossas ações contribuam para o advento deste mundo novo, que há de ser construído com o empenho renovado a cada dia, e que pode ser vislumbrado na bela imagem bíblica oferecida pela expressão “novos céus e nova terra” (Ap 21,1).(TBCF 2011,219)

Lembremos, neste Natal, que o livro da natureza é uno e indivisível, tanto sobre a vertente do ambiente como sobre a vertente da vida, da sexualidade, do matrimônio, da família, das relações sociais, numa palavra, do desenvolvimento humano integral. Os deveres que temos para com o ambiente estão ligados com os deveres que temos para com a pessoa considerada em si mesma e em relação com os outros; não se podem exigir uns e espezinhar os outros. Esta é uma grave antinomia da mentalidade e do costume atual, que avilta a pessoa, transtorna o ambiente e prejudica a sociedade (CV 51-52).

A verdade e o amor que a mesma desvenda não se podem produzir, mas apenas acolher. A sua fonte última não é, nem pode ser, o homem, mas Deus, ou seja, Aquele que é Verdade e Amor. Este princípio é muito importante para a sociedade e para o desenvolvimento, enquanto nem uma nem outro podem ser somente produtos humanos; a própria vocação ao desenvolvimento das pessoas e dos povos não se funda sobre a simples deliberação humana, mas está inscrita num plano que nos precede e constitui para todos nós um dever que há de ser livremente assumido. Aquilo que nos precede e constitui — o Amor e a Verdade subsistentes — indica-nos o que é o bem e em que consiste a nossa felicidade. E, por conseguinte, aponta-nos o caminho para o verdadeiro desenvolvimento (CV 51-52).

Que o Amor e a Verdade (Caritas in veritate) nos envolvam neste Natal, proporcionando a todos maior comunhão com a família e sentimentos de alegria, perdão e compreensão. Um abençoado Natal, meu irmão, minha irmã!

Fonte: Arquidiocese de Porto Velho

* O conteúdo opinativo acima é de inteira responsabilidade do colaborador e titular desta coluna. O Portal Gente de Opinião não tem responsabilidade legal pela "OPINIÃO", que é exclusiva do autor.

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