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Gente de Opinião

Dom Moacyr

Jovens: ninguém é descartável!


A Jornada Mundial da Juventude revelou, sem dúvida, o país
anfitrião a todos os povos do planeta. Hoje o mundo conhece melhor o
Brasil, a realidade dos brasileiros, a sua juventude e diversidade
cultural.

Do papa, que veio para se encontrar com os jovens, podemos afirmar
com Paulo VI: “o ser humano contemporâneo escuta mais as testemunhas
do que os mestres, e se escuta os mestres é porque são testemunhas”.
Através de suas palavras, percebemos mais a sua visão de povo, do
mundo, a sua sensibilidade perante a desigualdade social e a direção
firme que quer imprimir à Igreja.

Diante de cada bandeira levantada e de cada delegação enviada, o papa
se exprimiu: Vejo em vocês a beleza do rosto jovem de Cristo e meu
coração se enche de alegria! O meu olhar se estende por esta grande
multidão: vocês são muitíssimos! Vocês vêm de todos os continentes!
Normalmente vocês estão distantes não somente do ponto de vista
geográfico, mas também do ponto de vista existencial, cultural,
social, humano. Mas hoje vocês estão aqui, ou melhor, hoje estamos
aqui, juntos, unidos para partilhar a fé e a alegria do encontro com
Cristo, de ser seus discípulos. Nesta semana, o Rio se torna o centro
da Igreja, o seu coração vivo e jovem, pois vocês responderam com
generosidade e coragem ao convite que Jesus lhes fez de permanecerem
com Ele, de serem seus amigos. O “trem” desta Jornada Mundial da
Juventude veio de longe e atravessou toda a Nação brasileira; hoje
chegou ao Rio de Janeiro; do Corcovado, o Cristo Redentor nos abraça e
abençoa.
        
O que fica dessa Jornada? O apelo contundente do papa
Francisco aos jovens: “Quero dizer o que espero como consequência da
jornada. Quero que saiam fora. Quero que a igreja saia às ruas”. O que
temos que fazer? Leia as bem-aventuranças que te farão bem. E se
queres saber que coisa prática tens que fazer, leia Mateus 25, que é o
protocolo com o qual nos julgarão. Com essas duas coisas vocês tem o
plano de ação. As bem-aventuranças e Mateus 25. Não é preciso ler mais
nada. É o que peço a vocês de todo o coração. Agradeço a todos por
essa proximidade”.

Apesar da mídia nacional e internacional ter dado tanta visibilidade
à presença do papa no Brasil e a área turística ter sido movimentada
no Rio de Janeiro, o objetivo da Jornada Mundial da Juventude ficou
claro no decorrer da semana: “Esta primeira viagem tem em vista
encontrar os jovens, mas não isolados da sua vida; eu quero
encontrá-los precisamente no tecido social, em sociedade. Porque,
quando isolamos os jovens, praticamos uma injustiça: despojamo-los da
sua pertença. Os jovens têm uma pertença: pertença a uma família, a
uma pátria, a uma cultura, a uma fé… Eles têm uma pertença, e não
devemos isolá-los! Sobretudo não devemos isolá-los inteiramente da
sociedade! Eles são verdadeiramente o futuro de um povo! Isto é
verdade; mas não o são somente eles: eles são o futuro, porque têm a
força, são jovens, continuarão para diante. Mas também, no outro
extremo da vida, os idosos são o futuro de um povo. Um povo tem futuro
se vai em frente com ambos os pontos: com os jovens, com a força,
porque o levam para diante; e com os idosos, porque são eles que
oferecem a sabedoria da vida. E muitas vezes penso que fazemos uma
injustiça aos idosos, pondo-os de lado como se eles não tivessem nada
para nos dar; eles têm a sabedoria, a sabedoria da vida, a sabedoria
da história, a sabedoria da pátria, a sabedoria da família. E nós
precisamos disto!
 
Por isso, digo que vou encontrar os jovens, mas no seu tecido
social, principalmente com os idosos. É verdade que a crise mundial
não gera coisas boas para os jovens. Li, na semana passada, a
percentagem dos jovens desempregados; pensem que corremos o risco de
ter uma geração que não encontrou trabalho, e é o trabalho que confere
à pessoa a dignidade de ganhar o seu pão. Os jovens, neste momento,
sofrem a crise. Aos poucos fomo-nos acostumando a esta cultura do
descarte: com os idosos, sucede demasiadas vezes; mas agora acontece
também com inúmeros jovens sem trabalho. Também a eles chega a cultura
do descarte. Temos de acabar com esse hábito de descartar. Ao
contrário, cultura da inclusão, cultura do encontro, fazer um esforço
para integrar a todos na sociedade. Isto é de certo modo o sentido que
eu quero dar a esta visita aos jovens, aos jovens na sociedade (Aos
jornalistas durante o voo).

O papa Francisco comoveu a todos e causou admiração, pois, como disse
o teólogo Queiruga, “é impossível não sentir, com ele, o sopro do
Concílio refrescando o rosto”. “A fé em Jesus Cristo não é enrolação,
é algo muito sério; é um escândalo que Deus se tenha feito um de nós,
e que tenha morrido numa cruz; a cruz segue sendo um escândalo, mas é
o único caminho seguro, aquele da cruz, aquele de Jesus, a encarnação
de Jesus; os jovens tem que sair, tem que se fazer valer, os jovens
que tem sair e lutar pelos valores; quero que nos defendamos de tudo
que seja mundano, instalação do que seja comodidade, do que seja
clericalismo, do que seja estarmos fechados em nós mesmos. As
paróquias, os colégios, são para sair e se não saem se convertem em
uma ONG e a Igreja não pode ser uma ONG”.
 
Acolher a juventude hoje é um desafio para as religiões e o papa
deixou-se entusiasmar pelos jovens nesta Jornada Mundial da Juventude.
Diante de milhares de jovens conectados o tempo todo, na mesma fé e
compromisso, as fronteiras são ultrapassadas; iniciativas e
possibilidades evangelizadoras vão se multiplicando. Doravante, possa
a solidariedade deixar de ser uma palavra esquecida; novas redes de
comunidades sejam criadas e o apelo do papa à Comunidade de Varginha
encontre eco em todas as pessoas, pois “tudo aquilo que se compartilha
se multiplica”, lembrando que “ninguém liberta ninguém, ninguém se
liberta sozinho: os homens se libertam em comunhão” (P.Freire).
“Quero lançar um apelo a todos os que possuem mais recursos, às
autoridades públicas e a todas as pessoas de boa vontade comprometidas
com a justiça social: Não se cansem de trabalhar por um mundo mais
justo e mais solidário”! Ninguém pode permanecer insensível às
desigualdades que ainda existem no mundo! Cada um, na medida das
próprias possibilidades e responsabilidades, saiba dar a sua
contribuição para acabar com tantas injustiças sociais! Não é a
cultura do egoísmo, do individualismo, que frequentemente regula a
nossa sociedade, aquela que constrói e conduz a um mundo mais
habitável; não é ela, mas sim a cultura da solidariedade; a cultura da
solidariedade é ver no outro não um concorrente ou um número, mas um
irmão. E todos nós somos irmãos!
 
Quero encorajar os esforços que a sociedade brasileira tem feito
para integrar todas as partes do seu corpo, incluindo as mais sofridas
e necessitadas, através do combate à fome e à miséria. Nenhum esforço
de “pacificação” será duradouro, não haverá harmonia e felicidade para
uma sociedade que ignora, que deixa à margem, que abandona na
periferia parte de si mesma. Uma sociedade assim simplesmente
empobrece a si mesma; antes, perde algo de essencial para si mesma.
Não deixemos, não deixemos entrar no nosso coração a cultura do
descartável! Não deixemos entrar no nosso coração a cultura do
descartável, porque nós somos irmãos. Ninguém é descartável!
Lembremo-nos sempre: somente quando se é capaz de compartilhar é que
se enriquece de verdade; tudo aquilo que se compartilha se multiplica!
 
Queridos amigos, certamente é necessário dar o pão a quem tem fome;
é um ato de justiça. Mas existe também uma fome mais profunda, a fome
de uma felicidade que só Deus pode saciar. Fome de dignidade. Não
existe verdadeira promoção do bem-comum, nem verdadeiro
desenvolvimento do homem, quando se ignoram os pilares fundamentais
que sustentam uma nação, os seus bens imateriais: a vida, que é dom de
Deus, um valor que deve ser sempre tutelado e promovido; a família,
fundamento da convivência e remédio contra a desagregação social; a
educação integral, que não se reduz a uma simples transmissão de
informações com o fim de gerar lucro; a saúde, que deve buscar o
bem-estar integral da pessoa, incluindo a dimensão espiritual, que é
essencial para o equilíbrio humano e uma convivência saudável; a
segurança, na convicção de que a violência só pode ser vencida a
partir da mudança do coração humano.
 
Os jovens possuem uma sensibilidade especial frente às injustiças,
mas muitas vezes se desiludem com notícias que falam de corrupção, com
pessoas que, em vez de buscar o bem comum, procuram o seu próprio
benefício. Também para vocês e para todas as pessoas repito: nunca
desanimem, não percam a confiança, não deixem que se apague a
esperança.

* O conteúdo opinativo acima é de inteira responsabilidade do colaborador e titular desta coluna. O Portal Gente de Opinião não tem responsabilidade legal pela "OPINIÃO", que é exclusiva do autor.

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