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Rondônia

Entrevista com Dimis da Costa Braga, juiz federal, membro fundador da ARL


Dimis Braga - Gente de Opinião
Dimis Braga

A Academia Rondoniense de Letras, Ciências e Artes - ARL, nestes tempos de pandemia, para revolver os neurônios dos acadêmicos e dos simpatizantes por uma boa leitura, resolveu fazer entrevistas com seus membros efetivos, que serão publicadas, quinzenalmente, no site Gente de Opinião, aproximando os acadêmicos da sociedade rondoniense. A escolha do entrevistado, Dimis da Costa Braga, juiz federal, membro fundador da ARL, foi feita por sorteio, e as perguntas da entrevista foram elaboradas pelos membros da diretoria William Haverly Martins, José Dettoni, Heinz Roland Jakobi, Abel Sidney de Souza e Lucileyde Feitosa, com ajuda do acadêmico Viriato Moura, autor da ideia das entrevistas. Esta entrevista foi dividida em 3 partes – O IntelectualO MagistradoO Cidadão, que serão divulgadas, semanalmente, no site Gente de Opinião e no espaço da ARL no Facebook. Porto Velho, março de 2022.


O Intelectual

1. ARL – Para iniciar a conversa, já que somos uma academia majoritariamente de letras e conhecemos a sua extensa biblioteca particular, gostaríamos de saber qual é o seu livro preferido, aquele que mereceu mais de uma leitura e é guardado com carinho? Ou, como diz o confrade Abel Sidney, aquele que você levaria para uma ilha deserta?

Dimis Braga – Em primeiro lugar, cumprimento os leitores do Gente de Opinião e os admiradores e simpatizantes da Academia Rondoniense de Letras.  Não tenho preferência por um livro. Se tivesse que escolher um, seria a Bíblia Sagrada, em cujo conteúdo se pode encontrar diversos gêneros, do romântico ao épico, do poético ao filosófico. Se tivesse que escolher um que não fosse a Bíblia, seria JK – O Artista do Impossível, de Cláudio Bojunga. Amo este país e gosto de biografias, que considero fundamental para formar as novas gerações, conhecendo os feitos de nossos vultos. A biografia que retratou a vida desse grande médico, prefeito, deputado, governador e presidente desvela um Brasil que deveria ser mais conhecido.

2. ARL – Cite cinco livros de ficção, gênero narrativo, que você recomendaria a leitura? E no gênero lírico, quais seus autores preferidos?

Dimis Braga – Sagarana, de Guimarães Rosa, expressa o Brasil através das gentes, modos de vida e paisagem das Minas Gerais, que “são muitas”, emanando, do centro para as bordas do Brasil, uma certa essência desse Estado que é âmago da nação; Em Vidas Secas, Graciliano Ramos desnuda a dura realidade do semiárido que o Brasil litorâneo escondia, situação que em parte perdura; n’O Mulato, Aluísio de Azevedo confrontou cruamente um problema que repercute na realidade atual. Contos Amazônicos proporciona entender, pela exímia pena naturalista de Inglês de Sousa, as raízes da conflagração ante a amazônica desigualdade com que foram tratados, desde o início, os donos da terra; em Réu do Sexo, William Haverly Martins apresenta o tênue limite entre público e privado nos desvãos de uma disputa travada pela promoção ao cargo máximo do Poder Judiciário estadual, levando o Brasil e o mundo a conhecer, pela literatura, o Estado de Rondônia e sua capital, em personagens psicologicamente complexos e redondos. Pasme: estou relendo esse livro exatamente agora.

São tantos os autores no gênero lírico: Fernando Pessoa, Thiago de Mello, Vinicius de Moraes, Viriato Moura, Alcides Werk, Carlos Drummond de Andrade, José Saramago, Jorge Luís Borges, João Correia. Encanta-me o humanismo de Don Giovanni ou o Dissoluto Absolvido – o Don Juan arrependido de Saramago. De Viriato Moura, poderia citar dúzias de poemas, haicais, aldravias e nanocontos, mas me contento com a reflexão íntima e humildade do poeta em Choque:

Meus versos / não almejam êxtases / hedonistas, tampouco prantos / de dores d’alma.

Eles são dependentes, para sobreviver, do espanto provocado / em quem os consome.

Sem sua resposta, serão apenas letras mortas / numa lápide de papel.

Ou espanto / ou morte. (Viriato Moura, em Ritual de Catarse – Poesia como Terapia)

3. ARL - Qual pessoa, do presente ou do passado, você gostaria de ser, por um dia? Por quê?

Dimis Braga – Anatole France disse que se Napoleão tivesse sido tão sábio quanto Spinoza, teria passado a vida em uma água-furtada e escrito quatro ou cinco livros. Baruch de Spinosa, sendo judeu, teve coragem para desenvolver a ideia de um Deus que ao contrário de exigir oração, revela a si mesmo na ordenada harmonia do mundo e não se preocupa com o destino e os atos da raça humana (Einstein); execrado no Judaísmo, exilou-se em Haia, recusou a Cátedra de Filosofia em Heidelberg e morreu aos 44 anos, na água-furtada em que vivia, deixando para a posteridade uma das maiores obras de filosofia da humanidade.

4. ARL - Qual a importância da Literatura na sua formação de juiz? O que significa a ARL na sua vida?

Dimis da C. Braga – A literatura é imprescindível! A arte imita a vida (Aristóteles) e a vida imita a arte. A cultura só faz bem a um juiz, pois ajuda a relaxar de uma dura profissão e ainda ajuda – eu diria que é mesmo imprescindível. A arte é filha pródiga da humanidade, expressa a evolução de nossa ancestralidade, é a manifestação máxima de nossa sensibilidade, a publiciza e coletiviza, e justificando o Direito o diviniza – porque a divindade, na iluminada filosofia de Spinoza: “Tudo que existe, existe em Deus, e sem Deus nada pode ser concebido”. Dadas minhas limitações, tentei traduzir a humanidade da arte de julgar através o poema Sentenciar, que faz parte de obra poética e de crônicas a ser oportunamente publicada:

Silenciar... / E então sentir, pensar, asserir, cogitar, assentir, assentar, melhorar, semear.

Sem si, ser par; sem ter, se dar; sem ser, estar / E assim julgar.

Ser si, ser mar / Ser sim, ser sal; sem o “mim”, sem o mal / Sem o “se”, sem o “tal”.

Servir, e assim, amar. Enfim... sentenciar.

 

A poesia, a literatura, a arte cênica, as artes plásticas, a sétima arte, fazem parte do aperfeiçoamento que se espera de qualquer pessoa, tanto mais quem julga o semelhante. A ARL cumpre na minha vida esse papel, contribuindo na minha evolução como pessoa.

Continua na próxima semana…

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