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Vinício Carrilho

Síria: a retomada do Poder do Império


Poder de Império é derivado da capacidade de exercer monopólio na elaboração e na aplicação da lei. Já o poder do Império, ao contrário da legitimidade presumida, garante-se sob o fogo das armas. Ocorre, porém, que a lei dos EUA para o restante do mundo não é derivada do direito internacional; ao contrário, trata-se de lei absolutista embalada pelo jus puniendi mundial. Os EUA personificam o Estado Penal em larga escala, monitorando a liberdade de todos, sobrepondo-se sobre a autonomia de toda pessoa e a soberania de qualquer país. Quem se esqueceu da invasão territorial do Paquistão, no assassinato de Osama Bin Laden? São dois crimes, em dois atos que concorrem na somatória da pena moral que requer o mundo civilizado.

Na Guerra do Iraque foram sucessivos crimes contra a Humanidade, cometidos durante e depois da retirada das forças militares de intervenção. No Iraque, todos se lembram, o argumento foi o mesmo aplicado à Síria: uso de armas químicas. Saddam matou curdos com gás (provavelmente gás sarin)? Certamente. Contudo, após a invasão do Kuwait e a caminho de Bagdá, nem uma gota ou partícula de qualquer pó químico foi recuperado. Então, a motivação e a justificativa para a guerra das trevas não eram reais.

Em relação à Síria é ainda mais estranha a posição dos EUA. Até ontem aprovavam e financiavam (assim como no Egito) a ditadura de Bashar al-Assad. Depois, por visualizarem melhores condições lucrativas com a oposição (que mal sabia soletrar o lema “Primavera Árabe”), procuraram plantar forças militares de resistência ou simplesmente terroristas.

O que se comprova, verdadeiramente, é que empresas militares dos EUA, como a Blackwater, estavam e estão atuantes no Iraque (destroçado em guerra civil), no Egito (detonado por golpes militares) e na Síria, que ameaça com a 3ª Guerra Mundial. Essas empresas não recebem o controle do direito internacional e nem se submetem ao direito do país em que estão atuantes. Da mesma forma, como são mercenários, não se lhes aplica o direito militar, pois não são soldados engajados. Isto é um limbo jurídico. Limbo provocado e garantido pelo governo dos EUA. Obama não reviu os contratos firmados por Bush filho, desde a invasão do Afeganistão.

Por seu turno, tomar a Síria é parte de uma logística maior, para manter e expandir o controle das fontes petrolíferas (isso sempre), mas ainda mais vigorosa é a iniciativa para acabar com a resistência que vem do Irã. Ao acabar com o Iraque, as forças de dominação do mundo acabaram com a história e com a Antropologia Filosófica do povo politizado mais antigo que se tem conhecimento: no Vale do Ur nasceu a grande civilização da Suméria – derivando urstaat, Estado Preliminar. A maior parte dessa história de cerca de 10 mil anos se perdeu na guerra.

A Síria é herdeira do Império e da civilização Hitita. Em suas conquistas, os Hititas souberam respeitar e assimilar partes significativas e importantes dos povos vencidos (as culturas autóctones) e assim organizaram um poderoso Estado. Os documentos e pergaminhos Hititas, do período, mostram que a região da Anatólia teve uma organização social e política destacada – desde o período do Neolítico. Entre os Hititas, quanto à estrutura estatal mais precisamente, o monarca era legislador, chefe do exército e juiz supremo. A Assembleia de Nobres, a que estava subordinado o monarca, tinha a função específica de regular a sucessão ao trono.

O Estado era do tipo “feudal”, com extensa relação de vassalagem – num nível inferior estavam os sacerdotes e os funcionários civis e militares e, abaixo desses, os artesãos e os comerciantes das cidades. Os colonos eram estimulados pelo Estado a produzirem, recebendo subsídios na forma de novas sementes para cultivar. Essa organização permitiu que conhecessem alto nível artesanal na cerâmica e no trabalho de metais preciosos, assim como na carpintaria. Com os Fenícios, os Hititas ainda aprimoraram a talassocracia (governo dos mares).

Pois bem, o puritanismo religioso dos EUA, de origem Quaker, demonstra mais uma vez que não respeita o mundo em sua diversidade. Outra guerra virá, de consequências ainda mais inusitadas, nefastas e com fortes reflexos para todos. Não podemos aprovar esta futura guerra, resguardados em nossa ignorância e irresponsabilidade, pois somos todos vítimas.

                                                                                                                

Vinício Carrilho Martinez

Professor Adjunto III da Universidade Federal de Rondônia - UFRO

Departamento de Ciências Jurídicas/DCJ

Pós-Doutor Educação e em Ciências Sociais

Doutor pela Universidade de São Paulo

          

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