Sábado, 27 de dezembro de 2025 - 07h55

Este texto não
é um ataque ao direito à fé.
Não nasce da despeita, nem da intenção pretenciosa de convencer quem quer que seja.
Nasce da constatação
dos fatos, da
recusa em ignorá-los e da razoável incredulidade.
O que segue não é acusação, mas a expressão de inquietudes pessoais diante de acontecimentos
reais que castigam, aprisionam e sufocam uma parcela majoritária da humanidade.
As perguntas aqui formuladas não pedem concordância, nem pretendem impor conclusões. Pedem apenas atenção.
Talvez provoquem desconforto. Se isso ocorrer, que não
seja interpretado como afronta, mas como sinal de que certos fatos não podem
ser suavizados sem custo à consciência.
Este texto não
busca destruir a fé de ninguém. Busca apenas abrir um espaço de reflexão
serena, onde razão, empatia e honestidade possam coexistir sem medo.
ME
RESPONDE, DEUS
Não te falo por provocação, nem por
desejo de negar-te. O que digo não é acusação — é constatação. E a indignação que dela nasce é legítima e
justificável, porque emerge
dos fatos, não do ódio.
Dizem que és bondade. Dizem
que és amor. Dizem que és pai.
Então responde-me no limite da compreensão que, segundo afirmam, foste tu
quem me deste.
Preciso entender para poder crer. Não
em dogmas, mas na coerência entre aquilo
que anunciam em teu nome e aquilo que se impõe, cruamente, na realidade.
Se és
onisciente, por que uma criação tão frágil,
tão vulnerável à dor,
à violência e ao abandono?
Se és
pai, por que o desamparo não é exceção, mas experiência recorrente?
O próprio registro que
te defende narra que teu filho, agonizando, clamou: “Pai, por que
me desamparaste?”
Essa pergunta não foi blasfêmia. Foi constatação. E permanece sem resposta.
Minha mãe acreditou. Não como quem
exige milagres, mas como quem confia. Era adoradora fiel. Viveu na entrega
silenciosa da devoção e da caridade.
Após um acidente de carro, foi levada a uma emergência. Esperou três horas por atendimento. Três horas.
Múltiplas fraturas torácicas. Hemorragia interna. Dor consciente. Agonia
prolongada.
Três horas esperando socorro humano. Três horas esperando,
talvez, algo além, teu socorro.
Imagino — porque nada mais me
resta — que, em algum momento, tenha repetido as palavras do teu
filho.
A resposta foi a mesma — para
ela e para milhares de crédulos adoradores que tiveram a vida ceifada antes da
exaustão natural a que tinham direito. No silêncio, a constatação
de uma punição injustificável imposta àqueles cujo único “pecado” foi
crer e amá-lo acima de todas
as coisas.
Não como castigo. Não como lição.
Apenas silêncio.
No ano passado, as imagens da grande
enchente no sul do Brasil mostraram corpos de crianças boiando. Em outras regiões do planeta, o cenário se repetiu.
Crianças. Não metáforas. Não símbolos. Corpos reais.
E nenhum dos
milhares de
teus anjos que os
livros considerados sagrados dizem existir apareceu.
Nenhuma ponta de asa. Nenhum braço poderoso
e acolhedor. Nenhuma intervenção invisível
rompeu a lógica da tragédia.
Dizer isso não é acusar.
É reconhecer o que os olhos veem e o que a consciência não consegue negar.
Como conciliar tais fatos com qualquer
postulado honesto de amor? Como sustentar a ideia de cuidado quando a realidade
insiste em desmenti-la?
Milhões morreram em teu nome. Milhões morreram esperando
por ti. E milhões continuam morrendo ouvindo o eco das próprias vísceras rangendo de fome,
enquanto discursos religiosos tentam
suavizar o insuportável com palavras
que não salvam nem acalmam as almas indignadas pela falta de respostas
convincentes.
Talvez não sejas cruel
e omisso. Talvez apenas
sejas indiferente, ou demasiadamente ocupado com tantos outros seres
em distantes planetas do universo eterno.
Talvez simplesmente não intervenhas por alguma razão
incompreensível.
E se não intervenhas, então tu não és refúgio, não és
amparo, não és resposta.
És, no máximo,
uma construção humana — um substantivo
criado para aliviar o medo, a solidão e a dificuldade de aceitar que estamos entregues
uns aos outros.
O problema não é duvidar
de ti. O problema é usar
teu nome para anestesiar a consciência diante do sofrimento
real.
Chamar de mistério o que é abandono.
Chamar de plano o que é falha. Chamar de milagre o que é acaso.
Se existes e
permaneces em silêncio, o silêncio precisa ser dito.
Se não
existes, a responsabilidade é ainda
maior, porque não há a quem terceirizar o dever de cuidar.
Talvez Deus, tu nunca tenha sido o problema. Talvez
o problema seja a insistência em sustentar uma
ideia de amor que não se manifesta quando mais necessária.
Me responde, Deus.
Não com promessas. Não com metáforas. Não com livros.
Responde com presença
— ou aceita, ao menos, que o silêncio também é uma
resposta.
Sábado, 27 de dezembro de 2025 | Porto Velho (RO)
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