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Choque etnocultural é ameaça à identidade Indígena


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Crianças das 25 aldeias da Terra Indígena Rio Branco, na região de Alta Floresta d’Oeste, Sul de Rondônia, estão sendo incentivadas a falar a língua materna ameaçada de extinção há anos após o choque etnocultural com o não índio. O processo de desaculturação nas etnias da região foi um dos mais debatidos no I Encontro de Valorização da Mulher Indígena, de 4 a 6 de novembro de 2014, na aldeia Colorado, com a presença de representantes de cinco etnias.

Na área indígena com 236.137,00 hectares e habitada por descendentes das etnias tupari, makurap, aruá, kanoé, kampé, arikapú, sakirabiack, djeoromiti (Jaboti), waiuru e dyaroy, o idioma que vinha predominando entre os mais jovens era o português.

Para resgatar a língua oral, principal traço da cultura indígena, as mães índias decidiram intensificar dentro de casa o movimento pela fala da língua materna entre as crianças e os jovens.

A meta é falar o português apenas com os não índios e incentivar a conversação intergrupal no idioma tradicional. Na aldeia Colorado, onde luz elétrica e água tratada e gelada são “artigos de luxo”, e o único meio de acesso é pelo rio, mães revelaram que a cartilha “Tupari ‘ema” é usada nas escolas indígenas da região para alfabetização com a tradução em português se tornou uma aliada.

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Um dos responsáveis pela edição da cartilha é o professor Isaias Tupari, que se prepara para defender como trabalho de conclusão do curso de Pedagogia, no campus da Unir em Ji-Paraná, a monografia comparando os métodos da educação tradicional com as técnicas didáticas atuais dos não índios. Ele integra um grupo de especialistas da UNIR que para salvar a língua tupari da ameaça de extinção editou a cartilha bilíngue.

O dicionário com tradução dos verbetes no idioma tupari, segundo o professor Isaias  está na gaveta, pois faltou uma contrapartida de R$ 400 mil que o governo estadual à época não repassou.

A maior preocupação das mulheres era ver as crianças índias se criarem falando apenas o idioma português. Pela cultura indígena, a prática os torna inferiores diante de outras etnias. Agrava as diferenças em ambientes como nas escolas, onde a maioria dos alunos é de não índios, e envergonha quem sai da aldeia para estudar na cidade.

Poucos jovens, de acordo com as representantes das aldeias Tupari, Makurap, Kampé, Jaboti e Aruá conhecem e cantam as músicas tradicionais. O cacique Isauro Tupari, da aldeia Tucumã, alertou também para o risco da extinção da música indígena na região, haja vista somente alguns cânticos evangélicos serem traduzidos na língua materna.

O cacique Durval Kampé defende maior rigor das próprias mães no ensino da língua tradicional. “As mães têm o dever de ajudar os filhos a falar mais a nossa língua”. Segundo Maria Kampé, a ameaça é tão grave que há inclusive jovens, como seus dois filhos adolescentes que saíram da aldeia para estudar em escolas de ensino médio em Alta Floresta do Oeste, e que agora têm “vergonha” de assinar o sobrenome indígena do pai, descendente da etnia tupari.

Solução

Depois de ouvirem as primeiras explicações com o tema a Política Nacional de Gestão Ambiental e Territorial em Terras Indígenas (Pnegati), as participantes pediram aos organizadores que marcassem uma oficina específica para tirar todas as dúvidas sobre o assunto. A oficina será realizada antes do III Encontro das Mulheres Indígenas marcado para o mês de agosto de 2015, com abertura sexta-feira e encerramento domingo.

Heliton Gavião e Tenesson Gonçalves de Oliveira explicaram ao falar sobre “Participação das mulheres indígenas na política de gestão ambiental, territorial e etnodesenvolvimento”, ser prioridade o etnozoneamento das Terras Indígenas para a gestão correta da execução de uma política de aproveitamento dos recursos naturais, potencialidades econômicas e reforço dos valores culturais, como a língua, a religião e o conhecimento tradicional de cada povo.

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Heliton Gavião afirmou ainda que, mais importante ainda é fato da mulher também ser chamada a participar desse programa, e as comunidades indígenas serão mais ouvidas, antes do início de qualquer obra que traga impacto ao meio ambiente. Referia-se principalmente aos impactos ambientais pelas Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs) construídas no Rio Branco e à derrubada de matas ciliares para transformação em pasto e áreas de cultivo de café e outros produtos.

Os índios garantem que o agrotóxico utilizado nas áreas de cultivo também escorre para dentro do rio no período das chuvas e “envenena” a água das primeiras enchentes.

A construção de PCHs na região também é responsável pela extinção de espécies de quelônios como a tartaruga e o tracajá, além de várias espécies de peixes como a jatuarana, tambaqui, pacu, branquinha e outros que se reproduziu em abundância no Rio Branco. Galdino Makurap, membro do Conselho Regional da Funai, observou que as barragens impedem a subida do peixe para reprodução e isso termina provocando a extinção das espécies. Atualmente, a espécie mais encontrada na área da Terra Indígena é o bagre “pintado”.

Diretrizes

Cinco diretrizes dão sustentação à Pngati, como a do reconhecimento e respeito às crenças, usos, costumes, línguas, tradições e especificidades de cada povo indígena; reconhecimento e valorização das organizações sociais e políticas dos povos indígenas e garantia das suas expressões, dentro e fora das terras indígenas; protagonismo e autonomia sociocultural dos povos indígenas, inclusive pelo fortalecimento de suas organizações, assegurando a participação indígena na governança da política nacional, respeitadas as instâncias de representação indígenas e as perspectivas de gênero e geracional.

São prioridades ainda o reconhecimento e valorização da contribuição das mulheres indígenas e do uso de seus conhecimentos e práticas para a proteção, conservação, recuperação e uso sustentável dos recursos naturais imprescindíveis para o bem-estar e para a reprodução física e cultural dos povos indígenas; além de trazer contribuição para a manutenção dos ecossistemas nos biomas das terras indígenas por meio da proteção, conservação e recuperação dos recursos naturais imprescindíveis à reprodução física e cultural das presentes e futuras gerações dos povos indígenas.

Coordenadoria Indígena

Gente de OpiniãoRepresentante dos Estados de Rondônia e Mato Grosso na Comissão Nacional de Políticas Indigenistas (CNPI), e um dos principais idealizadores da Pnegati, Heliton Gavião aponta a criação da Coordenadoria dos Povos Indígenas de Rondônia – COPIR -, ligada à Secretaria de Estado do Desenvolvimento Ambiental (Sedam) como um dos avanços do governo Confúcio Moura para fortalecer a parceria da União com o Estado e os municípios na execução dessa política indígena.

A Copir atende à demanda dos povos indígenas na participação, discussão, elaboração e execução de políticas públicas voltadas para os Indígenas promovendo a defesa de seu espaço físico territorial, valores culturais, tradições, usos e costumes.

Um dos primeiros avanços foi atrair a iniciativa privada para programas como o de sequestro de carbono e outros. A conclusão dos planos, uma espécie de inventário de todas as potencialidades da fauna e da flora, minerais e traços culturais de cada povo, resultam em projetos como os de sequestro de carbono que já funciona em cooperação com os Suruí, em Cacoal.

Os Gaviões e os Uru-Eu-Wau-Wau também já concluíram seus levantamentos, e os Zoró e Cintas Largas estão fechando os seus projetos.

Energia rural

Cacique Durval Kampé cobrou a expansão do programa “Luz para Todos” e “Moradias Populares” para as aldeias da TI Rio Branco. “A gente não viu acontecer. Tem pessoa aqui na terra indígena que é carente e tem necessidade de morar em casa melhor”.

A construção de uma estrada interligando a aldeia Tucumã, na margem do Rio Branco, à localidade do Formigueiro é reivindicada pelas mulheres, para que possam ter acesso a outras cidades e vender  artesanato para aumento da geração de renda.

As índias solicitaram ainda a construção de um barracão para oficinas e abertura de Centro de Memória em cidades polos onde os produtos artesanais possam ser vendidos. Esse trabalho foi iniciado com os Makurap, segundo Luzenny Amaral, e em conjunto com a Unir a entidade atuará em outras aldeias como as da etnia Tupari.

Participaram ainda dos debates coordenadores técnicos da Funai, Sedam e Secretaria de Assuntos Estratégicos (Seae), representantes da Fundação Universidade de Rondônia (UNIR), Federação Rondoniense da Mulher (Feron), Conselho Estadual de Política Cultural – Setor Culturas Indígenas.artesanais possam ser vendidos. Esse trabalho foi iniciado com os Makurap, segundo Luzenny Amaral, e em conjunto com a Unir a entidade atuará em outras aldeias como as da etnia Tupari.

Outro objetivo do encontro foi também fortalecer o Movimento de Mulheres Indígenas de Alta Floresta d’Oeste, discutir Direitos da Mulher, Violência contra a Mulher, Organização Social, Meio Ambiente, Cultura e maior estímulo à interação entre as etnias para aumentar a participação da mulher indígena principalmente nas conferências municipais e estaduais em preparação para a nacional de 2015 que define as políticas públicas de apoio aos povos indígenas.


Fonte
Texto: Abdoral Cardoso
Fotos: Ésio Mendes
Decom - Governo de Rondônia

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