Quarta-feira, 22 de outubro de 2025 | Porto Velho (RO)

×
Gente de Opinião

Opinião

OPINIÃO DO CIDADÃO: Rojões, indicadores e o futuro do SUS


 OPINIÃO DO CIDADÃO:  Rojões, indicadores e o futuro do SUS  - Gente de Opinião



Roberto Luiz d’Avila* 


Os resultados da Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar (PeNSE) e do estudo Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas (Vigitel 2008) – ambos financiados pelo Ministério da Saúde e divulgados recentemente – indicam um caminho promissor para o país no que se refere a promoção dos hábitos saudáveis e a prevenção de doenças. Por exemplo, a PeNSE mostrou que 76% dos estudantes brasileiros nunca experimentaram um cigarro na vida. Revelou ainda que 80% dos alunos da rede pública aprenderam a evitar a gravidez precoce em sala de aula.

Já o Vigitel 2008 apontou queda de 20,5% nas mortes por doenças cardiovasculares num período de 16 anos (de 1990 a 2006). Na população de 20 a 74 anos, observou-se que o risco de morte caiu de 187,9 por 100 mil habitantes, em 1990, para 149,4 por 100 mil habitantes, em 2006, ou seja, menos 1,4% ao ano. Isso sem contar com a queda de 30,9% das mortes especificamente por doenças cerebrovasculares (AVC) no mesmo período. 

Diante de quadro estatístico tão alvissareiro, as autoridades brasileiras se apressaram a assumir a paternidade (a esquerda e a direita) dos indicadores e atribuí-los a adoção de políticas e programas governamentais. Lembraram-se, inclusive, de reconhecer o papel da assistência à saúde pela expansão da atenção básica, hoje ancorada no Programa Saúde da Família (PSF), peça chave no repasse de informações e no diagnóstico precoce de doenças crônicas que, nos tempos modernos, insistem em engrossar os dados de mortalidade. 

Falou-se que o Ministério da Saúde está no caminho certo e em condições de combater os principais problemas enfrentados pela população. Se por um lado, como cidadãos, nos regozijamos com o êxito nacional, por outro, sentimos a necessidade de fazer um alerta: o tom ufanista, o clima do já ganhou – tão comum às torcidas antes dos grandes embates – não faz bem a saúde e deveria ser substituído urgentemente. 

Não podemos negar que o Brasil da atualidade está anos-luz à frente daquele que se debatia com a ausência de uma política publica eficaz no campo da assistência. Em 1988, o Sistema Único de Saúde (SUS) trouxe esperança de acesso universal, integral e equânime a milhões de pessoas que dependiam da filantropia. O modelo tornou o Brasil referencia internacional e deu norte ao conjunto de atividades de promoção, prevenção, diagnóstico, tratamento, capacitação de profissionais, vigilância e assistência farmacêutica. Mas como manter tais políticas e programas enaltecidos pelo Ministério da Saúde na sua rota de sucesso? 

Essa resposta se configura tão complexa quanto o enigma que encerra. E, como provocadores desta reflexão, nos sentimos obrigados a apontar ao menos duas saídas. A primeira é a definição de uma fonte de financiamento estável para o SUS. A regulamentação da Emenda Constitucional 29, que há anos se arrasta pelo Congresso Nacional, urge pelo engajamento do Governo e pela união de forças políticas e de diferentes segmentos da sociedade que a levem a aprovação definitiva. A existência do SUS depende diretamente de recursos em seus três níveis de gestão (federal, estadual e municipal), sem os quais se torna inviável manter seus princípios (universalidade, integralidade, gratuidade, equidade, controle social) e ampliar sua linha de cuidados. 

A segunda saída se relaciona ao reconhecimento do papel dos profissionais da saúde, especialmente dos médicos, sobre os quais repousa a responsabilidade de colocar em prática as propostas desenhadas pelos sanitaristas de Brasília. Para tanto, a criação de uma carreira de estado para estes profissionais permitiria levar assistência aos brasileiros de todos os cantos do país. Tal compromisso implica assegurar aos que fazem a saúde nossa de cada dia boa infra-estrutura de trabalho, uma rede integrada capaz de absorver os casos mais graves e salários compatíveis com a responsabilidade e as exigências pertinentes. 

Ora, sem recursos assegurados e no vácuo de uma política de reconhecimento da mão-de-obra em saúde, entre outras providencias também urgentes, o tempo dos festejos pode estar perto do fim. As autoridades e a sociedade devem impedir que estes projéteis atinjam em cheio a maior política social do mundo, e mude o rumo do SUS, fazendo-o marchar, sem escalas, para o abismo.

*presidente do Conselho Federal de Medicina

Gente de OpiniãoQuarta-feira, 22 de outubro de 2025 | Porto Velho (RO)

VOCÊ PODE GOSTAR

O perigoso caminho que o Brasil resolveu trilhar

O perigoso caminho que o Brasil resolveu trilhar

O clima político que vem tomando conta do Brasil não reflete, ao contrário do que seria licito esperar, a discussão sadia e construtiva dos graves e

O fim da desigualdade de gênero no Judiciário brasileiro: por mais mulheres no STF

O fim da desigualdade de gênero no Judiciário brasileiro: por mais mulheres no STF

A composição do Supremo Tribunal Federal (STF) não é apenas uma questão de escolhas técnicas ou de mérito jurídico. É, também, um reflexo dos valores

Para além da matriz masculina

Para além da matriz masculina

Uma análise crítica da dominância masculina nas estruturas sociopolíticas e a necessidade de reequilibrar os princípios feminino e masculino Intro

Apurar é o melhor caminho

Apurar é o melhor caminho

Na semana passada, o vereador Thiago Tezzari (PSDB) foi afastado do cargo após se tornar alvo de uma investigação do Ministério Público de Rondônia

Gente de Opinião Quarta-feira, 22 de outubro de 2025 | Porto Velho (RO)