Sábado, 4 de maio de 2024 | Porto Velho (RO)

×
Gente de Opinião

Opinião

OPINIÃO DO CIDADÃO: O CHORO DA RAINHA E O LOBO MAU


  OPINIÃO DO CIDADÃO: O CHORO DA RAINHA E O LOBO MAU - Gente de Opinião

CARLOS NICODEMOS* 

Profecias a parte, pois não são próprias no campo da ciência, o choro da rainha mirim da bateria da escola de samba Unidos do Viradouro, a pequena Júlia de 7 anos, e seu olhar acanhado e constrangido na passagem pela avenida do samba no Rio de Janeiro, conforme exibido pelas emissoras de TV, nos deixa muitos recados e certamente alguns desafios.

Um desses desafios, no vigésimo aniversário (1990-2010) do Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei 8069/90, é entender que a proteção dos direitos humanos infanto-juvenis na sociedade brasileira, não é uma função de determinado órgão, da escola, da Justiça ou mesmo exclusivamente dos pais. A proteção integral e permanente das nossas crianças é função de todos nós, todos os dias e em todos os momentos.

Esta proteção também compreende entender as crianças e os adolescentes como sujeitos em processo peculiar de desenvolvimento, conforme a Convenção das Nações Unidas pelos Direitos das Crianças da ONU de 1989. O caso da pequena Júlia, nomeada rainha da bateria da escola de samba é a demonstração latente que ainda trabalhamos um conceito de proteção, pautado em valores adultocentricos que fazem de nossas crianças verdadeiros depositários de nossos sonhos e expectativas.

Fazer da pequena Júlia Lira a rainha da bateria foi um sonho que terminou em lágrimas. Por oitenta e dois minutos, tempo de passagem de uma escola pela avenida, a pequena, mesmo chorosa e assustada, honrou com as tradições culturais do adulto e cumpriu a agenda que lhe ofereceram. Efetivou-se assim, a agenda do carnaval em detrimento à da criança, conforme anunciamos em outras resenhas.

A participação das crianças no carnaval deve ser considerada sob o manto dos direitos, notadamente, o direito à cultura e ao lazer. Por outro lado, a decisão da Justiça de autorizar o desfile da pequena Júlia, remonta o debate no campo do Direito quanto à relação daquilo que é legal e não necessariamente justo.

Explico. De fato e de direito o desfile (sofrido) da pequena Júlia estava amparado pela lei. Porém, esta decisão não atendeu ao reclame do que efetivamente era justo, qual seja, preservar a condição da criança enquanto sujeito em peculiar processo de crescimento, conforme o Artigo 4º da Lei 8069/90. No lugar da autoridade do argumento (Lei 8069/90) que deveria negar o pedido, prevaleceu o argumento da autoridade, ou seja, o entendimento da Juíza de Direito de que não necessariamente haveria erotização (sic).

Num cenário não tão distante, ainda na esteira do carnaval, na agenda adultocentrica da nossa sociedade, em Salvador, a música Lobo Mau cantada por Ivete Sangalo, ícone da MPB, estimulava sob os encantos da metáfora carnavalesca, subliminarmente, que o “Chapeuzinho Vermelho” fosse devorada pelo “Lobo Mau” , sob o ritmo do “Vou te Comer!!”.

Somos a favor de todos os ritmos de música e qualquer censura deve ser repudiada por tudo aquilo que lutamos para consolidar o Brasil como uma democracia de todos nós. Por outro lado, como compatibilizar uma chamada musical, como esta que ora descrevemos, com valores de proteção dos direitos fundamentais de crianças e adolescentes?

Não caiamos no mesmo erro do caso da pequena Júlia e saiamos por ai buscando autorizações judiciais que protejam o direito à liberdade de expressão. Este direito é cláusula pétrea de nossa Constituição Federal de 1988, especificamente no Artigo 5º. Por outro lado, deve-se extrair do exercício deste direito um sentido positivo e agregador de valores, sob pena de estarmos diante da ponderação de interesses frente a outros direitos.

Por fim, nesta última parte das resenhas que escrevemos neste carnaval, acreditamos que devamos ir além da proteção doméstica que prestamos aos nossos filhos e das decisões judiciais que fazem valer o argumento da autoridade. O maior desafio (porque não aprendizado?!) que nos é colocado neste carnaval quanto aos direitos das crianças e dos adolescentes é a necessidade da construção de uma lógica de proteção que possa implicar toda a sociedade com a compreensão de que é tarefa nossa, de todos nós, assegurarmos a cidadania infanto-juvenil.

Enquanto não chegarmos neste nível de compreensão, o Lobo Mau continuará sendo uma ameaça e as lágrimas de Pierrô( neste caso da Colombina) será um indicativo que devemos mudar o enredo na sociedade brasileira em nome de milhares de crianças e adolescentes, sob pena de sermos todos rebaixados na avenida da humanidade.

CARLOS NICODEMOS é Advogado, Membro da OAB/RJ, Coordenador Executivo da Organização de Direitos Humanos – Projeto Legal e Presidente do Conselho Estadual de Defesa dos Direitos das Crianças do Estado do Rio de Janeiro.

Gente de OpiniãoSábado, 4 de maio de 2024 | Porto Velho (RO)

VOCÊ PODE GOSTAR

Diretório municipal do PT resolveu jogar Fátima Cleide às feras

Diretório municipal do PT resolveu jogar Fátima Cleide às feras

Matéria do site Rondoniaovivo revela que a ex-senadora Fátima Cleide vai representar o Partido dos Trabalhadores na disputa pela prefeitura de Porto

Revanchismo da história em plena acção contra o Ocidente

Revanchismo da história em plena acção contra o Ocidente

O Presidente Rebelo de Sousa juntou-lhe o seu Pó de Mostrada Segundo noticiou a Reuters, Rebelo de Sousa declarou a correspondentes estrangeiros, um

Por que o PT ainda não indicou pré-candidato à sucessão de Porto Velho?

Por que o PT ainda não indicou pré-candidato à sucessão de Porto Velho?

O PT ainda não indicou pré-candidato à sucessão de Porto Velho. Por quê? Analistas políticos, contudo, apontam a ex-senadora Fátima Cleide como even

Lula quer criar um serviço de tele reclamação

Lula quer criar um serviço de tele reclamação

O presidente Lula saiu-se com mais uma das suas bizarrices. Agora, ele quer criar um serviço de tele reclamação, um canal de comunicação entre o gove

Gente de Opinião Sábado, 4 de maio de 2024 | Porto Velho (RO)