Quarta-feira, 21 de setembro de 2016 - 08h44
De início, ele nem queria tocar no assunto. Foi convencido de que pegaria muito mal, falar na tribuna da ONU como um paraquedista, sem dizer uma palavra sobre os acontecimentos que ali o colocaram como presidente do Brasil sem ter sido eleito. Ele falou, mas passou ao largo de três palavras que, como explicariam os psicanalistas, açoitam seu psiquismo, provocando culpa ou constrangimento ou qualquer coisa assim. Não pronunciou o nome da ex-presidente Dilma, não mencionou a qualificação de “golpe”, que corre o mundo, sobre o processo que descreveu, e trocou a palavra “impeachment” por impedimento. As duas palavras se correspondem no inglês e no português, mas na práxis política guardam diferença. Explico mais adiante. Disse Temer:
"O Brasil acaba de atravessar processo longo e complexo, regrado e conduzido pelo Congresso Nacional e pela Suprema Corte brasileira, que culminou em um impedimento. Tudo transcorreu dentro do mais absoluto respeito à ordem constitucional."
Impedimento de quem? Sem o complemento nominal, a frase atentou contra a sintaxe. O “impedimento” é sempre de alguém ou de alguma coisa. Mas ele preferiu assim porque foge do nome de Dilma como o diabo da cruz. Como o culpado do nome da vítima. Na recente entrevista ao Globo, quando lhe perguntaram porque nunca diz o nome dela, ele foi corajoso. “Então vou dizer: Dil-ma-Va-na-Rous-seff. Disse mas não gosta de dizer. As palavras e as coisas têm uma forte conexão. A fuga da palavra ajuda e esquecer a coisa, embora ela seja inapagável: foi golpe e foi traição.
A outra palavra evitada foi “golpe”. Apareceram cartazes dizendo isso na porta da sede da ONU, apareceram manifestantes, e delegações latino-americanas se retiraram do plenário num silêncio gritante. Diante de uma plateia de governantes e chefes de Estado, Temer poderia ter aproveitado para refutar clara e corajosamente a caracterização do processo que o levou à presidência como golpe, uma ideia que encontrou seu lugar aqui no Brasil e lá fora. Passou ao largo, limitando-se a dizer que o processo foi legal e constitucional. O fato de ser constitucionalmente prevista não significa que foi legítimo.
Preferiu dizer que o processo “transcorreu dentro do mais absoluto respeito à ordem constitucional” e que “culminou em um impedimento”. Por que não disse “impeachment”? Porque não estaria sendo verdadeiro. Houve aqui o impedimento de fato da presidente por obra do Congresso, com aval do STF. Mas não um “impeachment” segundo as regras dos países democráticos que o preveem em suas cartas constitucionais, a começar dos Estados Unidos, o criador deste mecanismo criado para mitigar a força do presidencialismo, não para derrubar presidentes. Tanto é assim que lá nenhum presidente sofreu tal processo. Nixon renunciou antes e em relação aos outros dois, Andrew Jackson e Bill Clinton, o Senado assumiu seu papel moderador e arquivou os pedidos autorizados pela Câmara. Alegou, principalmente, a desproporção entre a acusação e a pena da deposição, o que bem se aplicaria aqui, diante dos crimes imputados a Dilma, pedaladas e suplementações orçamentárias. Ao falar em “impedimento” e não em “impeachment”, Temer evitou a comparação jurídica e reconheceu a singularidade do processo ocorrido no Brasil. Ele se assemelha ao que houve no Paraguai e em Honduras mas não ao que seria um “impeachment” nos Estados Unidos, por exemplo.
A alma de Oswado Aranha, a quem o Brasil deve o honroso papel de abrir anualmente a Assembléia Geral da ONU, deve ter se divertido. Ou lamentado.
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