Quarta-feira, 17 de setembro de 2025 - 09h06
O chamado
“tarifaço”, de Donald Trump contra o Brasil, tem se consolidado como um dos
principais pontos de tensão no cenário econômico brasileiro de 2025, impactando
diretamente a forma como as empresas nacionais planejam suas estratégias de
sobrevivência e crescimento.
Desde o
início do ano, os Estados Unidos haviam sinalizado a intenção de impor tarifas
mais duras, mas a escalada anunciada em julho, com a aplicação de 50% sobre
praticamente todos os produtos brasileiros a partir de agosto, representou um
choque.
Ainda que
alguns setores tenham sido poupados, como aviões da Embraer, suco de laranja,
fertilizantes e minério de ferro, a medida atingiu 35,9% do valor exportado aos
EUA, o que corresponde a cerca de 4% de todo o mercado externo do país. Existem
setores radicalmente transformados, como por exemplo a exportação de café e
frutas tropicais. No caso do café, por exemplo, agosto marcou um aumento
acelerado de preços do produto junto ao consumidor americano nunca visto
anteriormente.
O governo
brasileiro reagiu de imediato, acionando a Organização Mundial do Comércio e
preparando contramedidas internas. Entre elas, destacou-se a criação de um
pacote de R$ 30 bilhões em créditos para exportadores, adiamento de impostos e
instrumentos de seguro, no âmbito do programa “Brasil Soberano”.
O
ministro Fernando Haddad e a equipe diplomática reforçaram que a
responsabilidade pela solução do impasse caberia aos EUA, ao mesmo tempo em que
o presidente Lula buscava aproximar o Brasil de outros polos de influência,
como os BRICS e a União Europeia, tentando reduzir a dependência de Washington.
Toda essa discussão ainda vem ocorrendo, sem qualquer sinal de solução evidente
no curto prazo.
O impacto
disso no dia a dia das empresas
Enquanto
isso, as empresas brasileiras enfrentam um ambiente de grande instabilidade.
Não é apenas o tarifaço que preocupa. O cenário global carrega uma sequência de
crises: as eleições na Bolívia, ameaças contra o regime venezuelano e o
rearranjo de poder na América Latina, a guerra da Ucrânia e da Rússia, os
conflitos em Gaza e as ameaças do Irã de retomar ações contra Israel são
algumas delas.
Somam-se
as incertezas sobre novas tarifas contra a Índia e o impasse ainda aberto com a
China. Dentro do Brasil, a taxa Selic em 15% encarece o crédito, pressiona o
custo de capital e dificulta o financiamento de investimentos produtivos e mais
ainda no ecossistema de inovação.
Os custos
de aquisição de clientes também aumentam, especialmente no ambiente digital,
onde plataformas de mídia e publicidade elevaram suas tarifas. Para empresas
que precisam conciliar importações, exportações, marketing e financiamento,
trata-se de um cenário quase sufocante.
Nesse
contexto, setores específicos reagem de formas distintas. A indústria química,
representada pela Abiquim, já expressou forte preocupação, alertando para o
risco de demissões em massa e paralisação de investimentos devido ao peso dos
insumos importados. O agronegócio, especialmente carnes e café, prevê perdas
que podem ultrapassar US$ 1,5 bilhão, já que esses produtos não foram
contemplados nas isenções americanas.
Por outro
lado, companhias como a WEG e a Gerdau anunciaram estratégias de mitigação,
ajustando cadeias logísticas e buscando diversificação de mercados. Há também
reações mistas: se alguns setores respiraram aliviados por terem obtido
exceções nas tarifas, outros se veem diante de incertezas que tornam inviável
qualquer planejamento de longo prazo.
Em paralelo,
empresários brasileiros já agendam visitas aos Estados Unidos, em setembro,
para reuniões com a Câmara de Comércio e representantes do governo americano,
numa tentativa de reverter parte das medidas.
Fazer o
básico bem feito
Em meio a
tantos dilemas, as corporações brasileiras têm se voltado para o que chamam de
“fazer o básico bem feito”. Essa máxima ganha força quando as condições
externas se tornam imprevisíveis.
Em vez de
se apoiarem apenas em perspectivas de crescimento pela exportação, muitas
empresas estão focando em monetizar sua base de clientes atual, aprimorar o
relacionamento com consumidores e reforçar a integração entre canais digitais e
físicos. Estratégias omnichannel e programas de CRM e Loyalty são vistas como
fundamentais para fidelizar clientes, evitando que eles migrem para
concorrentes em momentos de crise.
Paralelamente,
os gestores trabalham para ajustar portfólios de produtos e preços à realidade
do consumidor brasileiro, que, mesmo sob pressão inflacionária e alta dos
juros, não deixa de consumir, mas busca alternativas que caibam no bolso.
Empresas
que atuam com clientes de alto valor se esforçam em oferecer diferenciação,
enquanto aquelas voltadas às classes C e D apostam em modelos escaláveis e
soluções de baixo custo de servir, viabilizadas pelo uso intensivo de
tecnologia.
Outro
eixo de adaptação é a adoção de inteligência artificial e automação em
processos internos. Apesar de ainda ser tratada como modismo por alguns, a IA
tem se mostrado promissora na personalização de ofertas em escala, na gestão de
dados de clientes e na busca por eficiência operacional.
Em um
ambiente de custos crescentes e margens comprimidas, qualquer ferramenta que
permita reduzir despesas e aumentar a assertividade na tomada de decisão
torna-se estratégica. Mais do que nunca, as empresas precisam conciliar
inovação tecnológica com pragmatismo, encontrando soluções que sejam viáveis
financeiramente e tragam resultados tangíveis.
Temos
implementado soluções nessa linha junto a alguns de nossos clientes, e é fato
que esses projetos chegam a representar até 20 a 25% do resultado de
faturamento para o ano, principalmente quando a gestão do relacionamento com os
clientes está altamente personalizada e assertiva.
Decisões
unilaterais, impactos globais
O
tarifaço, portanto, não é apenas um episódio pontual de atrito comercial entre
Brasil e Estados Unidos, mas um símbolo da vulnerabilidade das economias
emergentes diante de decisões unilaterais das grandes potências, e que serão
mais frequentes em um contexto de “Guerra Fria 2.0”.
Ao mesmo
tempo, funciona como catalisador para uma mudança de mentalidade dentro das
empresas brasileiras. Se até pouco tempo a aposta estava concentrada na
expansão para mercados consolidados, agora há um movimento crescente de
diversificação, tanto geográfica quanto estratégica.
As
oportunidades com a China, a Europa e os próprios países da América Latina
surgem como alternativas viáveis, especialmente porque, no médio prazo,
depender menos de um único parceiro comercial significa reduzir riscos e ganhar
margem de manobra.
Dessa
forma, embora o tarifaço de Trump tenha ampliado as incertezas e pressionado
setores vitais da economia brasileira, ele também abriu espaço para reflexões
importantes sobre resiliência e autonomia, bem como sobre a vocação futura do
país e seu papel dentro de um planeta altamente interdependente.
O
ambiente é turbulento, os desafios são enormes e a dúvida entre executivos e
conselhos de administração é generalizada. Mas uma certeza permanece: com maior
ou menor renda, os consumidores continuarão comprando. Cabe às empresas, diante
desse cenário adverso, redescobrir sua eficiência, fortalecer sua relação com o
cliente, ajustar seu portfólio, investir em tecnologia e diversificar suas
apostas internacionais. Esse talvez seja o caminho mais realista para
atravessar a tempestade sem perder o rumo. Pelo menos, é aquilo que temos
ajudado empresas líderes a fazer e a obter resultados superiores a seus pares
no curto prazo de forma bastante pragmática.
*Fernando
Moulin é partner da Sponsorb, empresa boutique de business performance,
professor e especialista em negócios, transformação digital e experiência do
cliente e coautor dos best-sellers "Inquietos por Natureza",
"Você Brilha Quando Vive sua Verdade" e “Foras da curva” (todos da
Editora Gente, 2024) E-mail: fernandomoulin@nbpress.com.br.
Sua equipe trabalha ou apenas finge?
Após o fenômeno do quiet quitting (demissão silenciosa), das “férias clandestinas” e da “microaposentadoria”, mais uma tendência impulsionada pela G
A importância da transmissão e percepção da voz dos professores
Quem nunca sofreu algum tipo de julgamento negativo em função da forma como transmitiu uma determinada mensagem oral para alguém? Existem três aspec
Quiromancia, Astrologia e como será o amanhã
É do conhecimento de todos os efeitos do Sol e da Lua na saúde e comportamento das pessoas, assim como esses corpos celestes determinam a conduta
Tarifaço e seu alerta para o Brasil valorizar sua indústria
O recente aumento de tarifas imposto pelos Estados Unidos sobre uma série de produtos importados, o chamado “tarifaço”, teve como objetivo proteger