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A vingança do indomável Madeira


Professor Nazareno*

            “Mais uma vez estou de volta às manchetes dos humanos. E como de costume, as notícias sobre a minha reputação são as mais trágicas e pavorosas possíveis. Achincalham-me como se eu fosse a mais terrível das criaturas. Colocam-me mais uma vez contra a parede me acusando das mais dantescas ações. Acusam-me injustamente de estar destruindo vidas, lares, plantações, construções e tantas outras coisas de vocês, pobres sofredores. O problema é que sempre fui injustiçado e incompreendido. Desde as confluências de inúmeros outros meus irmãos andinos, venho há milhões de anos, regando a vida e distribuindo riquezas por onde passo. Ainda em formação, sou muito jovem e sempre fui tranquilo e quieto por onde cotidianamente passo. Sou sinônimo de vida, prosperidade e abundância e jamais em minha existência decepcionei alguém.”

            “Não, não estou fazendo mal nenhum a ninguém, pois isto não faz nem nunca fez parte de minha pacífica índole. Esta atual enchente é apenas o reflexo do que fizeram comigo sem a minha permissão. Estou devolvendo aos humanos o que dos próprios homens recebi. Por pura ambição e ganância, vocês rasgaram e dilaceraram meu corpo com duas malditas usinas hidrelétricas nas terras de Rondon. Com pouco ou nenhum conhecimento, alteraram a minha geografia e comprometeram para sempre a minha identidade. São muito hipócritas ou tolos se achavam que eu não reagiria. A montante, por incompetência ou esperteza, seus engenheiros não construíram estradas elevadas o suficiente para se livrar de minhas águas represadas. A jusante, esconderam de todos que me assorearam e por isso minhas águas se esparramam sem controle.”

            “Vocês, malditos humanos, é que são maus. A troco de migalhas, alteraram meu curso, explodiram bombas em meu leito, estraçalharam minhas pedras e mataram meus peixes. Depois, roubaram meu ouro, meus metais, minha madeira e toda a minha riqueza. Vocês próprios enganam uns aos outros sem o menor descaramento. Cadê a transposição que lhes prometeram como cala-boca? Cadê a tão propalada isonomia? Vão é devolver o que já receberam. Cadê, enfim, a limpeza desta imunda cidade que vocês habitam? Todo dia, sem ganhar nada em troca, levo toneladas do seu pútrido lixo. Por isso, nem deixei o cimento de suas usinas secar e lhes dei o troco. Não destruí as peças de seus museus. Foi sua própria incompetência que o fez. Podia, se quisesse, levar suas urnas eletrônicas, mas deixei-as para que possam votar e com isso sofrer mais.”

            “Nada tenho contra o seu Carnaval nem suas bandas e blocos. Divirtam-se, pulem, ganhem muito dinheiro, coloquem sua alegria na avenida, droguem-se e bebam todas. Aliás, levar vantagem com a miséria e a desgraça alheias sempre foi a sua marca maior. Não ligue para seus irmãos alagados em Calama, São Carlos, Nazaré, Abunã e mesmo em Porto Velho. Eles são pobres e na sua hipócrita sociedade, o que vale um pobre? Dê-lhes um mísero quilo de alimento estragado e fique com a consciência em paz, já que é muito difícil rondoniense gostar de rondoniense. Carnaval é cultura, mano. E tem coisa mais importante e cultural do que beber pinga e pular no meio da rua? Mas, por favor, não me olhem mais com esse olhar atravessado nem me culpem pelas suas mazelas. Seus infortúnios podem estar dentro de vocês mesmos. E eu nada tenho a ver com isso. Precisava apenas de respeito e nunca recebi isto dos senhores.”

*É Professor em Porto Velho.

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