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BIOPIRATARIA: Morre após tomar vacina do sapo



Após ser noticiada em todo Brasil a morte do comerciante Ademir Tavares, de 52 anos, e a internação do seu filho Luiz Augusto Tavares, de 25, ocorrida no ultimo sábado, 19, depois de terem recebido a "vacina do sapo", tornou público um problema que vem crescendo de forma assustadora, a retirada e venda de produtos da floresta com destinos aos grandes centros.

Segundo as investigações da policia civil de Pindamonhangaba, interior de São Paulo as doses de "vacinas" eram aplicadas pelo empresário do setor de transportes, Jorge Roberto de Oliveira Rodrigues, 40, que se autodenomina "curandeiro". Rodrigues informou as autoridades policiais que manda buscar a substância direto do Estado do Acre, e que não cobrava nada pela aplicação nos amigos.

A difusão do kambô entre os "brancos"

"Vacina do sapo" da Amazônia é aplicada em não índios sem aprovação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Pesquisadores estudam propriedades curativas da substância

O Phyilomedusa bicolor, mais conhecido como sapo verde, é encontrado com freqüência na Amazônia, principalmente no período das chuvas, quando fica coaxando sob árvores próximas a igarapés. Dele é retirada uma secreção cutânea, da qual é feita o kampu, kampô, kambô ou, simplesmente, a vacina do sapo. Conhecimento tradicional de 13 etnias indígenas - como informa a Fundação Nacional do Índio (Funai) de Cruzeiro do Sul (AC), seu uso está se disseminando rapidamente entre os brancos e até em Brasília é possível tomar a tal vacina.

Embora proibido pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), o kambô está cada vez mais difundido nos centros urbanos do País. Apresentando-se como pajé katukina, José Gomes aplicou a "vacina do sapo" em dezenas de pessoas em Brasília, onde visita regularmente. Cobra R$ 75,00 por alguns pontos: a aplicação é feita queimando superficialmente a pele com um pedaço de cipó titica e, em seguida, é depositada na queimadura (ponto) a secreção do kambô, diluída em água para desfazer a cristalização. Nos homens, a queimadura é feita no braço e nas mulheres, na panturrilha.

Existe uma crescente preocupação dos povos da floresta com o aproveitamento do conhecimento e dos recursos biológicos, que eles utilizam tradicionalmente, por parte das grandes empresas e não índios. A "vacina do sapo" é considerada um remédio para muitos males pelas etnias que vivem no Vale do Juruá. Hoje é utilizada pelos seringueiros e por curandeiros nas cidades da região como Cruzeiro do Sul e Rio Branco (AC) e Espigão D'Oeste (RO). Pesquisas científicas também vêm sendo realizadas sobre as propriedades da secreção Phyllomedusa bicolor, desde a década de 1980.

O ministério do Meio Ambiente (MMA), através do Programa Brasileiro de Bioprospecção, Desenvolvimento Substentável de Produtos da Biodiversidade (Probem), busca a organização sustentável do uso da vacina. O trabalho começou em 2003, depois que uma carta dos índios katukina do Acre para o MMA informava sobre venda ilegal e do interesse de laboratórios internacionais pela substância.

As pesquisas revelaram que a secreção Phyllomedusa bicolor contém uma série de substâncias altamente eficazes. As principais já identificadas são as dermofina e a deltorfina. A primeira é analgésico 40 vezes mais poderoso que a morfina e a segunda pode ser aplicada no tratamento de isquemia cerebral. A secreção desse sapo também possui propriedades antibióticas e de fortalecimento do sistema imunológico.

Biopirataria – uma pratica em ascesão
 
Ao contrario do que se pensa a biopirataria é uma pratica antiga, na segunda metade do século XIX, mudas de seringueiras foram levadas ilegalmente para a Malásia, o que ocasionou o declínio do preço da borracha.

A biopirataria não é apenas o contrabando de diversas formas de vida da flora e fauna, mas principalmente, a apropriação e monopolização dos conhecimentos das populações tradicionais no que se refere ao uso dos recursos naturais. Ainda existe o fato de que estas populações estão perdendo o controle sobre esses recursos. No entanto, esta situação não é nova na Amazônia.

Nos últimos anos, através do avanço da biotecnologia, da facilidade de se registrar marcas e patentes em âmbito internacional, bem como dos acordos internacionais sobre propriedade intelectual, as possibilidades de tal exploração se multiplicaram.

Um dos casos mais conhecidos e recente de biopirataria é o da patente do cupuaçu realizado no ano de 2000 pela empresa japonesa Asahi Foods. O fato gerou uma grande polêmica. Passados quase quatro anos, o departamento do governo japonês responsável pelo registro de patentes recusou o pedido da empresa Asahi Foods para o processo de obtenção do cupulate (tipo de chocolate feito com amêndoas de cupuaçu, desenvolvido no Brasil). O órgão acatou o pedido da Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) reivindicando a autoria do processo e reconheceu as provas apresentadas pelos brasileiros.

A falta de legislação é a explicação para os vários princípios ativos de animais e plantas brasileiros patenteados no exterior. Um exemplo muito conhecido é o do medicamento de combate à hipertensão Capoten, cujo princípio ativo, o captopril, vem do veneno da brasileiríssima cobra jararaca.

Os cientistas daqui fizeram a descoberta, mas, como não tinham dinheiro para continuar a pesquisa, apenas publicaram o trabalho. Alguns anos depois, o laboratório Bristol-Myers Squibb usou as informações para desenvolver o medicamento. Hoje, o Capoten é vendido em farmácias do mundo todo (inclusive nas brasileiras) e o País não ganha nada com isso.

Gleydison Meireles – Acadêmico de jornalismo do IesacreFonte:
www.estadao.com.br; www.amazonlink.org
Jornal O Rio Branco - Acre

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