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Yêdda Pinheiro Borzacov

O BALÉ DAS ANDORINHAS


O céu de Porto Velho, nas décadas de 50, 60 e 70 do século XX, de julho a agosto, ao entardecer, era palco de um balé aéreo fantástico. Centenas de pessoas se agrupavam na av. Farqhuar, na ladeira, esquina com a rua D. Pedro II, para assistir e aplaudir a coreografia aviária proporcionada gratuitamente pelas pequenas andorinhas, recém-chegadas à então bucólica e pacata Porto Velho, provenientes dos países frios do norte, fugindo dos céus cinzentos e enevoados do gelado inverno, em busca de sol e calor tropicais e de alimentação - as andorinhas nutrem-se exclusivamente de insetos.

Notável é o instinto dessas avezinhas, o modo que elas têm de encontrar certos caminhos e de seguirem por eles, podendo voltar para o mesmo lugar de aninhamento todos os anos, sem bússola, sem rádio e sem postes sinaleiros. Apenas o instinto certeiro as guia.

Em curvas caprichosas e artísticas, as simpáticas andorinhas executavam um balé deslumbrante, fascinante e grinfavam anunciando e saudando o verão tropical. Após vinte a trinta minutos de espetáculo, o bando se recolhia aos trinços, procurando repouso nas cumieiras dos prédios dos Correios e Telégrafos e do Mercado Público Municipal, localizados na av. Presidente Dutra, na parte baixa da cidade. Algumas numerosas famílias dessas avezinhas, desprezando esses locais acolhedores, procuravam a gentil hospedagem de uma frondosa mangueira existente no quintal da residência do casal Hilda e César Augusto Queiroz, na av. Carlos Gomes, entre a av. Farqhuar e a rua Santos Dumont, no bairro Caiary.

Ruidosas e sempre reunidas em grande número, as andorinhas construíam os seus ninhos próximos uns dos outros, medida defensiva contra os predadores naturais, isso porque, quando um ninho é atacado toda a vizinhança se reúne solidariamente em defesa dos ovos e dos filhotes.

Após anos e anos, tolerando as estrepitosas vozes em concerto noturno, compartilhado por toda a vizinhança, sem poder dormir o sono dos justos, o conhecido casal resolveu sacrificar a mangueira, deixando, assim, de hospedar

as avezinhas que além dos incômodos e inconvenientes ruídos, deixavam uma camada de fezes no quintal. O odor nauseabundo penetrava em todos os cômodos da casa perturbando o olfato dos moradores.

Outro sério inconveniente: as andorinhas que já não eram toleradas pelos gregos na Grécia antiga, que as consideravam tagarelas e fofoqueiras, começaram a semear discórdia entre os vizinhos, comadres e amigas. Corria a

história que essas avezinhas escutavam, às portas e janelas, repetindo depois, a todos, o que ouviam, gerando intrigas, desavenças e inimizades. Acontecia o mesmo em Porto Velho antiga. As andorinhas fofocavam e as comadres repetiam o que ouviam, provocando futricas e fuxicos. As conversas futriqueiras sempre começavam com a expressão: "Um passarinho me contou". No outro dia, a confusão estava formada. Por isso, algumas antigas moradoras dessa parte alta da cidade, nutriam ojeriza e antipatia pelas andorinhas. Apesar de toda a habilidade imigratória que essa ave possui, dos bailados sensacionais e elegantes que davam um toque de encantamento aos céus, naquela época livre de queimadas e fumaças e era "azul, sempre azul”, mas as andorinhas não guardavam segredos e por isso não angariavam amizade e simpatia, sendo banidas em razão as suas línguas afiadas. Neste ano de 2012, elas estão retornando timidamente, oferecendo o espetáculo na praça da Estrada de Ferro Madeira-Mamoré. 

Yêdda Pinheiro Borzacov

* O conteúdo opinativo acima é de inteira responsabilidade do colaborador e titular desta coluna. O Portal Gente de Opinião não tem responsabilidade legal pela "OPINIÃO", que é exclusiva do autor.

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