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Gente de Opinião

Vinício Carrilho

Definições de Estado


Vinício Carrilho Martinez (Dr.)[1]

            A seguir, há indicações ou definições que se aplicam ao Estado como instituição permanente da Humanidade ou em suas modalidades mais convencionais, como Estado Moderno, Estado de Direito, Estado Constitucional e Estado Democrático de Direito. As definições ou proposições que não carregam indicação bibliográfica são reflexões do autor, ou seja, não são citações. O objetivo é apenas de fixar conceitos ou facilitar a primeira abordagem de assuntos complexos. Inicialmente, pode-se dizer que o Estado é Primordial (urstaat[2]):

  1. Corresponde à organização centralizada e hierarquizada do Poder Político.
  2. É a corporação de um povo, assentada num determinado território e dotada de um poder originário de mando (Jellinek, 2000).
  3. É uma ordem da conduta humana (Kelsen, 1998).
  4. Para Hegel, o Estado é a síntese dos mais elevados elementos éticos (Bobbio, 1989).
  5. É o devir da razão (Deleuze, 2005, p. 23).

 

Para Aristóteles, a finalidade do Estado é a Polis. Pode-se dizer, “metaforicamente”, que Aristóteles já se indagava sobre a Razão de Estado:

  1. Em geral, chamamos interesse público tudo o que é regulado pelas leis para a conservação dos Estados [...] O mais importante meio para a conservação dos Estados, mas também o mais negligenciado, é fazer combinarem a educação dos cidadãos e a Constituição” (Aristóteles, 1991, p. 217-218).

 

Nesta mesma lógica, vemos algumas reflexões e lições de Cícero, vendo que o Estado é a República, como forma de não se permitir o uso de meios de exceção:

  1. a) Os fundadores de Estados estão próximos da divindade; b) A felicidade está na perfeita Constituição Política; c) Na República predomina a Justiça; d) A maior necessidade é a virtude; e) O trabalho e a virtude levam à glória; f) Governar a República é converter a teoria em prática; g) O Governo com justiça eleva a “herança da humanidade”; A virtude está em combater as injúrias e a iniquidade (Cícero, s/d).

 

Diferentemente, firmando uma Ciência Política ou ciência do Estado, que não fosse mais refém da Filosofia do Estado, Maquiavel retrata o Estado como uma instituição forte, definitiva (status). Para Maquiavel, o homem de virtù é aquele que é capaz de formar alianças que perduram na formação dos Estados:

  1. Entretanto, aquele que depende menos da sorte conserva-se mais no poder [...] Mas, para me deter naqueles que pelo próprio valor e não pela sorte se tornaram príncipes, declaro ser os mais excelentes Moisés, Ciro, Rômulo, Teseu e outros semelhantes [...] E examinando suas obras e suas vidas, constata-se que da sorte só receberam a oportunidade que lhes proporcionou a matéria em que puderam introduzir a forma que lhes agradava. Sem tal oportunidade o valor de seus espíritos se teria perdido e sem tal valor a oportunidade teria surgido em vão[3](Maquiavel, 1996, p. 67).

 

Neste sentido, o Estado é um mito. O mito do Estado é aquele de uma força movedora e executora de tarefas infatigáveis em razão de objetivos maiores:

  1. O mito não pode ser descrito como uma simples emoção porque é a expressão de uma emoção. A expressão de um sentimento não é o próprio sentimento — é a emoção tornada imagem (Cassirer, 2003, p. 64)

 

Mas, todo Mito precisa de realidade e é isto que Maquiavel precisou. Porém, contrariamente, como processo de institucionalização do poder, o Estado surge apenas uma criação de um tipo específico de sociedade, não se constituindo em condição humana: O mundo moderno, ao contrário, é construído à base de um poder como dominação. Excluindo-se as sociedades primeiras — sociedades:

  1. Sem fé, sem lei, sem rei [...] Inversamente, toda sociedade não-primitiva é uma sociedade de Estado (Clastres, 1990, p. 143).

 

Para o moderno mundo civilizado do Ocidente, o Estado é pacto e coerção. Consequentemente, a soberania pertence ao Estado Absolutista:

  1. Aqueles que já instituíram um Estado, dado que são obrigados pelo pacto a reconhecer como seus os atos e decisões de alguém, não podem legitimamente celebrar entre si um novo pacto no sentido de obedecer a outrem, seja no que for, sem sua licença (Hobbes, 1983, p. 107).

 

Em contexto e sentidos não muito divergentes Hobbes, Francis Bacon acreditava no Estado-nação, mas também justificou teoricamente o absolutismo. Além disso, Bacon produziu uma pequena obra Nova Atlântida é mais um tipo de anti-república:

  1. Pois, bem o Estado vos concedeu licença para permanecerdes em terra pelo espaço de seis semanas [...] Por isso, não vos preocupeis, o Estado vos manterá durante o tempo que ficardes, nem tampouco precisais abreviar a estadia por isso [...] E se tiverdes qualquer outro pedido a fazer, não oculteis. Pois percebereis que, qualquer que seja a resposta, não ficareis sem a nossa proteção (Bacon, 2005, p. 228).

 

Mais especificamente, em Locke, vimos que a extensão do poder civil decorre da profundidade e da fertilidade docommonwealth, capaz de refrear a ameaça e de se opor à tirania. Em síntese, o Estado como poder civil é o grande objetivo político da humanidade. Mas, Locke ainda definiria o Estado Laico:

  1. É que o Estado não pode atribuir nenhum novo direito à igreja como também não, inversamente, a igreja ao Estado. Assim, a igreja, quer o magistrado a ela adira ou a abandone, permanece sempre a mesma que antes, uma sociedade livre e voluntária [...] O poder civil é o mesmo em toda a parte e não pode conferir uma autoridade eclesiástica maior a um príncipe cristão do que a que pode conferir a um príncipe pagão, isto é, não pode conferir nenhuma [...] Ninguém, nenhuma igreja e até nenhum Estado tem, pois, qualquer direito de atentar contra os bens civis de outrem nem, sob pretexto da religião, de o despojar das suas posses terrestres. Quem pensar de outra maneira, gostaria que pensasse no número infinito de processos e de guerras que assim proporciona ao gênero humano; no incitamento à pilhagem, ao assassínio, aos ódios eternos: em nenhum lado a segurança ou a paz e menos ainda a amizade, poderão se estabelecer e conservar entre os homens, se houvesse de prevalecer a opinião de que a soberania se funda na graça e que a religião deve propagar-se pela força e pelas armas (Locke, 1987, pp. 97-99).

 

Ao definir a legitimidade, Rousseau quer conservar o justo direito da resistência, no Estado Civil. Ironicamente, o Estadodeveria lhe assegurar o direito de reclamar da desigualdade imposta pelo próprio Estado:

  1. Se seguirmos o processo da desigualdade nessas diferentes revoluções, verificaremos ter constituído seu primeiro termo o estabelecimento da lei e do direito de propriedade; a instituição da magistratura, o segundo; sendo o terceiro e último a transformação do poder legítimo em poder arbitrário [...] ver-se-iam os direitos dos cidadãos e as liberdades nacionais apagarem-se pouco a pouco e as reclamações dos fracos serem consideradas como murmúrio sedicioso [...] É do seio dessa desordem e dessas revoluções que o despotismo, elevando-se aos poucos sua horrenda cabeça e devorando tudo o que percebesse de bom e de sadio em todas as partes do Estado, conseguiria por fim esmagar sob seus pés as leis e o povo, e estabelecer-se sobre as ruínas da república. Os tempos que precederiam esta última mudança seriam períodos de agitações e de calamidades [...] pois em todo lugar onde reina o despotismo, cui ex honesto nulla est spes (Rousseau, 1988, p. 81-84).

 

A Revolução Francesa celebraria a liberdade radical, contra toda e qualquer forma de tirania, o que se conheceu como Estado Legal:

  1. A liberdade, a igualdade, a justiça são os princípios necessários daquilo que não é depravado; todas as convenções repousam sobre elas como o mar sobre sua base e contra suas margens [...] na França não há poder, falando sensatamente; só as leis comandam, seus ministros impõem-se a obrigação de prestar contas uns aos outros e todos juntos à opinião, que é o espírito dos princípios [...] Os poderes devem ser moderados, as leis implacáveis, os princípios irreversíveis[4]. A opinião é a  conseqüência e a depositária dos princípios. Em todas as coisas o princípio e o fim se tocam onde estão prestes a se dissolver. Há uma diferença entre o espírito público e a opinião: o primeiro é formado pelas relações de constituição ou da ordem, e a opinião é formada pelo espírito público (Saint-Just, 1989, p. 50-52).

 

Por vezes, alegando-se a necessidade da organização da própria força política, o Estado se converte em absolutismo e ainda que esteja envolto em algum direito. O Estado-Força transforma a necessidade em Estado de Necessidade:

  1. Quem quer que queira reinar sobre os homens busca rebaixá-los, surrupiar-lhes a resistência e os direitos, até tê-los impotentes diante de si, feito animais [...] Tudo o que se come é objeto de poder[5](Canetti, 1995, p. 208- 218).

 

Por tudo isso, o Estado Moderno é uma construção, ficção ou artificialidade da vida moderna e, como Estado Racional, é um equivalente de poder que se mantem pela razão:

  1. O Estado exerce o monopólio do uso legítimo da força física (Weber, 1979)
  2. A modernidade política implica a substituição da autoridade descentralizada, típica do feudalismo, pelo Estado central, dotado de um sistema tributário eficaz, de um exército permanente, do monopólio da violência, de uma administração burocrática racional. A modernidade cultural implica a secularização das visões do mundo tradicionais [...] e sua diferenciação em esferas de valor [...] até então embutidas na religião: a ciência, a moral, o direito e a arte (Rouanet, 2002, pp. 237-8).

 

Já quanto ao Estado Moderno ser fruto do capitalismo, alega-se que:

  1. A Razão de Estado compõe-se de uma articulação orgânica de povo, território e soberania.
  2. O poder político do Estado moderno nada mais é do que um comitê (Ausschuss) para administrar os negócios comuns de toda a classe burguesa (Marx & Engels, 1993, p. 68).
  3. O Estado moderno – na qualidade de sistema de comando político abrangente do capital – é, ao mesmo tempo, o pré-requisito necessário da transformação das unidades inicialmente fragmentadas do capital em um sistema viável, e o quadro geral para a completa articulação e manutenção deste último como sistema global (Mészáros, 2002, p. 123-5).

 

A partir da Revolução Industrial, mas, sobretudo, no pós-Segunda Guerra Mundial, constitui-se em escala global um Estado Cientificista, como um conjunto complexo e contraditório, em que se operam a afirmação histórica do direito à educação e a negação do “direito à exclusão”. A modernidade representava a fase mais desenvolvida da divisão social do trabalho, momento em que se articulam, ajustando-se às necessidades diversas da produção industrial, o trabalho manual e o intelectual, na forma da função homogeneizadora e da função diferenciadora. O papel do Estado seria, portanto, o de regular os contratos estabelecidos e garantir seu cumprimento.

  1. Para Durkheim, a competição capitalista não é o elemento central da ordem industrial emergente, e algumas das características sobre as quais Marx pusera grande ênfase, ele via como marginais e transitórias. O caráter de rápida transformação da vida social moderna não deriva essencialmente do capitalismo, mas do impulso energizante de uma complexa divisão de trabalho, aproveitando a produção para as necessidades humanas através da exploração industrial da natureza. Vivemos numa ordem que não é capitalista, mas industrial (Giddens, 1991, p. 20).

 

Estado e Direito tem uma Função Homogeneizadora, mas antes de tudo o Estado de Direito é força:

  1. Não somente a força é a companheira inseparável do direito, mas é da força que surge o direito[...] Mas logo se descobriu que era geralmente mais econômico não pretender a completa aniquilação do adversário; daí surgiram as instituições da escravidão, os contratos e os tratados de paz, primeiras formas de direito. Todo tratado é, com efeito, uma ordem que determina um limite para o poder do conquistador (Durkheim, 2003, p. 51 – grifos nossos).

 

É difícil falar-se de um Estado anticapitalista, mas, como Estado Socialista, ou embalado pelo socialismo, pode-se falar de uma origem ideológica do direito socialista, para usar de uma frase, haveria possibilidade de se pensar um “socialismo jurídico”:

  1. As reivindicações resultantes dos interesses comuns de uma classe só podem ser realizadas quando esta classe conquiste o poder político e suas reivindicações alcancem validade universal sob a forma de leis. Toda classe em luta precisa, pois, formular suas reivindicações em um programa, sob a forma de reivindicações jurídicas. Mas as reivindicações de cada classe mudam no decorrer das transformações sociais e políticas, são diferentes em cada país, de acordo com as particularidades e o nível de desenvolvimento social(Engels & Kautsky, 1991, p. 65).

 

De outro modo, por isso também é possível dizer-se que o Estado é um fenômeno cultural:

  1. O Estado corresponde à atualização dos valores comunitários por intermédio do Poder, e da legitimação concomitante do Poder graças à atualização dos valores vividos pela comunidade (Reale, 2000, p. 375-6).

 

Pode-se acreditar que o Estado é a síntese da vida moderna, ou seja, trata-se da estrutura do Estado Moderno que sobrevive nos dias atuais:

  1. Estado é a ordem jurídica soberana que tem por fim o bem comum de um povo situado em determinado território (Dallari, 2012, p. 122).

 

Juridicamente, o Estado de Direito se define como estruturas ou garantias institucionais contra o Poder Político, isto, como segurança jurídica de que não haverá abuso do poder:

  1. O Estado de Direito é uma ordem político-jurídica formada pelo Império da Lei, pela consagração dos direitosindividuais e separação dos poderes.
  2. Por Estado de Direito se deve entender um Estado que, em suas relações com seus súditos e para a garantia do estatuto individual, submete-se ele mesmo a um regime de direito, porquanto encadeia sua ação em respeito a eles, por um conjunto de regras, das quais umas determinam os direitos outorgados aos cidadãos e outras estabelecem previamente as vias e os meios que poderão se empregar com o objetivo de realizar os fins estatais: duas classes de regras que têm por efeito comum limitar o poder do Estado subordinando-o à ordem jurídica que consagram (Malberg, 2001, p. 449-461).

 

Do direito regulador do Poder Político, a partir da afirmação da tese da divisão dos poderes, consagra-se o conhecido Estado-Juiz. Na modernidade, o Estado-Juiz se interpõe entre a forma-Estado (coercitiva, repressiva, sob o capital) e a forma-Direito consensual:

  1. A lei, por si, pode apenas, e sempre sob a condição de se apoiar na vontade social preponderante, estabelecer essa limitação, por assim dizer, negativa: que se não façam vigorar normas incompatíveis com as suas, derivadas de outras fontes, de tal maneira que fiquem sempre salvas a coerência e a unidade orgânica do sistema (Vecchio, 2005, p.56-57).

 

Historicamente, confunde-se razoavelmente o Estado Constitucional à luta pelo direito. Em todo caso, há uma correspondência com a necessidade de se afirmar as garantias jurídicas na Constituição:

  1. O Estado Constitucional implica um comprometimento do Estado administrador pelos órgãos legisladores, um “auto-comprometimento do Estado”, e, como sua consequência, direito dos súditos contra o Estado como tal, “direitos subjetivos, públicos” (Radbruch, 1999, p. 167-168).
  2. Estado Constitucional significa Estado assente numa Constituição reguladora tanto de toda a sua organização como da relação com os cidadãos e tendente à limitação do poder (Miranda, 2000, p. 86).

 

O Estado é organização. Desde meados do século XX, a estrutura estatal vem sofrendo embargos propriamente democráticos ao poder central, em que o Poder Político surge em correspondência à sociedade:

  1. A organização estatal é aquele status renovado constantemente pelos seus membros, ao que se juntam organizadores e organizados (Heller, 1998, p. 301).

 

Na atualidade, como concepção jurídica, o Estado é definido como modelo paradigmático de organização e de exercício do poder:

  1. É um modo especialíssimo de organização do pensamento jurídico, de racionalização do poder, de organização e de enquadramento das relações humanas (Alland & Rials, 2012, p. 702).

 

O Estado Democrático de Direito tem aproximadamente quatro décadas. Trata-se do Estado de Justiça, como definido por Elías Díaz:

  1. Socialismo e democracia coincidem em nosso tempo e institucionalizam-se conjuntamente com a proposta do chamado Estado democrático de Direito: o socialismo como resultado da superação do neocapitalismo próprio do Estado social de Direito [...] Isto significa que o velho Estado de Direito, sem deixar de seguir sendo-o, terá que se constituir em Estado de justiça [...] Estado de Justiça tem, sem dúvida, um sentido muito mais abstrato. Ambos os termos só podem considerar-se intercambiáveis se os entendemos no sentido de que o Estado democrático de Direito é hoje o Estado de Justiça, quer dizer, o Estado que aparece atualmente como legítimo, como justo, em função precisamente de alguns determinados valores históricos que são a democracia, o socialismo, a liberdade e a paz[6](Díaz, 1998, p. 133-134).

 

No Estado Democrático de Direito, desde a década de 1970, em luta pelo direito e contra o fascismo recalcitrante, afirmou-se a somatória entre Estado de Direito e democracia (liberalismo+socialismo):

  1. O moderno conceito de Estado Democrático de Direito atrelou-se conceitualmente ao socialismo e à Justiça Social (Canotilho, s/d).
  2. O Estado Democrático de Direito é formado pelo: a) princípio da constitucionalidade, que exprime, em primeiro lugar, que o Estado Democrático de Direito se funda na legitimidade de uma Constituição rígida, emanada da vontade popular, que, dotada de supremacia, vincule todos os poderes e os atos deles provenientes, como a garantia de atuação livre de regras da jurisdição constitucional; b) princípio democrático que, nos termos da Constituição, há de constituir uma democracia representativa e participativa, pluralista, e que seja a garantia geral da vigência e eficácia dos direitos fundamentais (art. 1º); c) sistema de direitos fundamentais que compreende os individuais, coletivos, sociais e culturais (títs. II, VII e VIII); d) princípio da justiça social referido no art. 170, caput, e no art. 193, como princípio da ordem econômica e da ordem social [...]; e) princípio da igualdade (art 5º, caput, e I); f) princípio da divisão de poderes (art. 2º) e da independência do juiz (art. 95); g) princípio da legalidade (art. 5º, II); h) princípio da segurança jurídica (art. 5º, XXXVI a LXXIII) (Silva, 1991, p. 108).

 

Muito mais do que norma (longe, portanto, do normativismo e do pragmatismo jurídico), o Estado Democrático de Direito tem por princípio básico o direito que serve à Justiça. Várias seriam essas condições como direitos essenciais, inalienáveis e intransferíveis (sejam individuais, sejam sociais e coletivos):

  1. (i) Direitos fundamentais (de conteúdo concreto variável), que resultam da configuração autônoma do direito, que prevê a maior medida possível de liberdades subjetivas de ação para cada um. (ii) Direitos fundamentais (de conteúdo concreto variável), que resultam da configuração autônoma do status de membro de uma associação livre de parceiros do direito. (iii) Direitos fundamentais (de conteúdo concreto variável), que resultam da configuração autônoma do igual direito de proteção individual, portanto da reclamabilidade de direitos subjetivos [...] (iv) Direitos fundamentais (de conteúdo concreto variável), que resultam da configuração autônoma do direito para uma participação, em igualdade de condições, na legislação política (Habermas, 2003, 167).

 

Quanto se coaduna a efetivação dos direitos fundamentais sociais às garantias tradicionais do Estado de Direito, temos a abertura para outra dimensão político-social, pois:

  1. O Estado Democrático de Direito Social é a organização do complexo do poder em torno das instituições públicas, administrativas (burocracia) e políticas (tendo por a priori o Poder Constituinte), no exercício legal e legítimo do monopólio do uso da força física (violência), a fim de que o povo (conjunto dos cidadãos ativos), sob a égide da cidadania democrática, do princípio da supremacia constitucional e na vigência plena das garantias, das liberdades e dos direitos individuais e sociais, estabeleça o bem comum, o ethos público, em determinado território, e de acordo com os preceitos da justiça social (a igualdade real), da soberania popular e consoante com a integralidade do conjunto orgânico dos direitos humanos, no tocante ao reconhecimento, defesa e promoção destes mesmos valores humanos (Martinez, 2013).

 

Na atual fase do assim chamado Estado Pós-Moderno, há elementos que se solidificaram e outros que se inscreveram modificando as estruturas envelhecidas, uma vez que:

  1. O Estado Democrático de Direito Internacional, conceitualmente, leva a efeito a Unidade na Diversidade da Humanidade. Também denominado de Estado Pluriétnico ou Estado Democrático de Terceira Geração, assegura relevância jurídica à natureza pluriétnica do espaço público. De modo complementar, pode-se dizer que o direito internacional tem um reflexo interno, pois o Princípio da Autodeterminação dos Povos deveria ser observado como recurso da autonomia requerida pelas culturas. Esta modalidade de Estado Pluralista reconhece e se pauta pela tolerância, diversidade, localismo, descentralização e autonomia (Wolkmer, 2001).

 

Como Estado Pós-Moderno, ao contrário da sistematização da cultura e do Poder Político, a instabilidade institucional desafia três séculos de história do poder:

  1. Essa instabilidade é dramaticamente acentuada pelo declínio do monopólio da força armada, que já não está nas mãos dos governos (Hobsbawm, 2007, p. 87).
  2. Para os Estados Unidos, é a primeira vez, desde a Guerra de 1812, que o território nacional sofre um ataque, ou mesmo é ameaçado [...] Pela primeira, as armas voltaram-se contra nós. Foi uma mudança dramática [...] A Inglaterra não foi atacada pela Índia, nem a Bélgica pelo Congo, nem a Itália pela Etiópia, nem a França pela Argélia (Chomsky, 2002, pp. 11-12).

 

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[1]Professor do Departamento de Ciências Jurídicas da Universidade Federal de Rondônia.

[2]A história da civilização Suméria ilustra a evolução da idéia de governo urbano e sua posterior transformação A primeira fase (3360 a 2400 a.C.) coincide com a construção de Cidades-Estados fortificadas. Já a segunda fase (2400 a 2350 a. C.) narra o surgimento do primeiro Estado Antigo documentado: “Então, o repentino surgimento de um homem importante inaugura uma nova fase [...] O reinado de Sargão I não se baseou na relativa superioridade de uma Cidade-Estado sobre outra: ele estabeleceu um império unificado, integrando as cidades num todo [...] Com Sargão I surgiu um verdadeiro Estado, com autoridades leigas e sacerdotais completamente separadas [...] Se o poder estatal se originou dos desafios e das necessidades especiais da Mesopotâmia, era dever do governante organizar grandes obras de irrigação, controlar as enchentes, reunir mão-de-obra para fazer tudo isto e ainda conseguir soldados. Quando as armas se tornaram mais complexas e caras foi preciso maior profissionalismo” (Roberts, 2003, pp. 90-91).

[3]A esta passagem, segue-se o seguinte comentário de Napoleão, como general: “O valor acima de tudo”.

[4]Liberdade, Igualdade, Justiça formam o tripé da doutrina dos Direitos Humanos.

[5]A próxima guerra mundial será por água?

[6]É óbvio que o Estado de Exceção não coaduna com nenhum desses valores e pressupostos, e ainda que possa ser aventado em sua defesa será sempre uma ação ilegítima.

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