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Paulo Queiroz

Política em Três Tempos - BOM COMBATE


1 – BOM COMBATE

Após se desabalar do sertão para o litoral tentando fugir da seca atroz, mas encontrando pelo caminho apenas dor, miséria e morte, o desvalido está prestes a entregar os pontos quando recebe, ao chegar à foz do rio Capiberibe, a advertência de Seu José, mestre carpina: “Severino retirante, muita diferença faz entre lutar com as mãos e abandoná-las para trás”. Dificilmente aos camponeses remanescentes do “Massacre de Corumbiara” terá sido dada a oportunidade de conhecer o poema de João Cabral de Melo Neto. Hoje, no entanto, após constatar que em pouco mais de um ano conseguiram - ao se organizarem no Comitê de Defesa das Vítimas de Santa Elina (Codevise) para lutar eles mesmos por seus direitos -, comprometer efetivamente o governo federal por uma solução para compensar os traumas que carregam, sabem mais do que ninguém o quanto é verdadeiro aquele verso.

Eis que, no próximo dia 24, se tudo ocorrer como está previsto no termo de compromisso chancelado pelo Chefe do Gabinete da Presidência da República Gilberto Carvalho, depois 12 anos de desdém, abandono e descaso, governo brasileiro deverá anunciar, em Corumbiara, no curso de uma audiência pública de que se comprometeram participar o ministro Paulo Vannuchi (Secretaria Especial de Direitos Humanos) e o presidente do Incra Rolf Hackbart, que providências se decidiu tomar para atender às reivindicações das vítimas da Fazenda Santa Elina. Mas isso só está ocorrendo porque, depois de mais de uma década, os camponeses finalmente decidiram tomar seu destino nas próprias mãos e partir para uma ação organizada, planejada e permanente.

Mas não se tire conclusões apressadas, recriminando os remanescentes daquele massacre por tamanha imprevidência. Afinal, nos dias que se seguiram à carnificina da qual resultaram 11 pessoas mortas, aí incluída a pequena Vanessa (de apenas seis anos de idade) trespassada por uma bala de grosso calibre, o que não faltaram foram promessas de providências várias, todas para ontem.

2 – ESFORÇO E CORAGEM

Atônitos, apavorados e inteiramente desorganizados – na época, literalmente, porquanto o acampamento existia a despeito do MST ou de qualquer tipo mobilização, que não a espontânea -, os camponeses tornaram-se alvo de todo tipo de adjutório, tanto por parte de autoridades oficiais como de organizações não governamentais (ONGs) – destacando-se entre estas a do candidato vitalício do PT à Presidência da República, certo Luís Inácio Lula da Silva. Os mortos de Corumbiara ainda não haviam baixado à campa quando o então pretendente ao Palácio do Planalto, ante o detalhe tenebroso que tinha tudo a ver com quadro de injustiça social cuja denúncia era bandeira do seu partido, jurou para os sobreviventes que, se um dia subisse a rampa daquele edifício, haveria de promover justa reparação – com indenização das vítimas e divisão das terras entre suas famílias.

Depois de mais de uma década de quase esquecimento, tudo que resultou de concreto foi a condenação do Brasil na Corte Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA). E não obstante a sentença ter sido exarada em pleno governo Lula da Silva e incluir a obrigação de o Estado indenizar as vítimas do massacre, a única providência tomada consistiu em relacionar, num levantamento feito de fora, apenas 27 famílias da região que seriam alcançadas pela reparação. Diante deste e de outros disparates, as próprias vítimas decidiram tomar o processo em suas mãos e se organizaram criando o Codevise.

Demandou bastante esforço e coragem até à decisão de montar um acampamento em Brasília, no dia em que o massacre completava o 12º aniversário (09 de agosto), para cobrar do presidente Lula da Silva a promessa feita em 1995. Nesse mutirão, os sobreviventes da carnificina espalhados por Corumbiara, Cerejeiras, Theobroma e até na Bolívia foram assistidos, principalmente, pelo Centro Brasileiro de Solidariedade aos Povos (Cebraspo) e pela Comissão Nacional das Ligas dos Camponeses Pobres (CNLCP).

2 – PRIMEIRAS VITÓRIAS

Enfim, depois que 60 camponeses rondonienses permaneceram acampados durante 19 dias em frente ao Congresso Nacional, a iniciativa culminou com um encontro de 20 deles com o Chefe do Gabinete Civil da Presidência da República, Gilberto Carvalho, ocasião em que foi lavrado o compromisso segundo o qual, no prazo máximo de 60 dias, os representantes governamentais anteriormente mencionados anunciariam, em Corumbiara, as providências que o governo decidisse tomar para efetivar a indenização das vítimas e o corte da fazenda Santa Elina para distribuição das terras entre suas famílias.

Em que importe o sucesso da empreitada, os integrantes do Codevise não se deixam deslumbrar. Comemorar de verdade, mesmo, sabem-no que só podem fazê-lo no que diz respeito ao reconhecimento do Codevise como legítimo interlocutor entre as vítimas do massacre e a sociedade que as produziu. De qualquer modo, como publicaram no folheto com que estão se apresentando em busca de apoio para organizar a audiência do dia 24, consideram que a decisão de ir a Brasília mostrou-se acertada, pois, de outra forma, não teriam conseguido pressionar o governo e divulgar a causa que os move perante a opinião pública.

Testemunhas do massacre, alguns inutilizados para o trabalho por seqüelas de espancamentos, os camponeses Jonas dos Santos, Romiraldo Santos, Elias da Silva, Manoel José da Silva Santos, Valdemar Silva e Rosimeire Rosa Gatti, todos do Codevise, estão em Porto Velho desde terça-feira (25), percorrendo os gabinetes de autoridades, visitando empresários e freqüentando veículos de comunicação em busca de apoio para organizar o evento e mobilizar as famílias das vítimas de modo a reuni-las para participar do encontro, devendo permanecer na capital até nesta sexta-feira (28). E em que pese não terem conseguido cobrar, pessoalmente, do presidente Lula a promessa antiga, o propósito não foi abandonado. A audiência presidencial ocorrerá, conforme o protocolo firmado na ante-sala do promitente, tão logo haja propostas concretas por parte do governo.

Fonte: pqqueiroz@uol.com.br

* O conteúdo opinativo acima é de inteira responsabilidade do colaborador e titular desta coluna. O Portal Gente de Opinião não tem responsabilidade legal pela "OPINIÃO", que é exclusiva do autor.

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