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Montezuma Cruz

Pedro Paulo um apaixonado pela Amazônia


Juiz do Caso PC Farias pede ao povo que não vote em corruptos
Pedro Paulo Castelo Branco Coelho, um apaixonado pela Amazônia, diz que a sociedade muda o País quando vota certo
Não se passa pela Amazônia em vão. Há sempre uma lição a aprender, uma causa a refletir, um mundo a abraçar. Foi assim, durante três décadas, que o advogado Pedro Paulo Castelo Branco Coelho arregaçou as mangas nos fóruns e tribunais de Porto Velho (RO) e Rio Branco (AC). "O Brasil não precisa de leis; é preciso apenas que as leis sejam aplicadas no devido momento. Aplicando-as corretamente, a corrupção estaria menos arraigada", proclama.
Para Pedro Paulo, acreano nascido no Bairro 2º Distrito, em Rio Branco, primeiro juiz federal concursado do Estado, se o brasileiro "votar corretamente e rejeitar corruptos", o País melhora. Outro acreano, César Augusto Batista de Carvalho, passou no concurso, mas ficou em Brasília.
Após o doutorado na Pontifícia Universidade Católica em São Paulo, atuou na Justiça Federal no Acre, em Rondônia, Roraima e Amazonas. Em janeiro de 1993, já titular de 10ª Vara Federal, respondeu um ano pela Justiça Federal do Acre. "Antes de ser juiz em Brasília, respondi por Rondônia, Acre, Pará, Amazonas e Roraima; depois, com essa experiência vim para Brasília", assinala. Juiz federal do caso PC Farias (tesoureiro de campanha do presidente Fernando Collor de Mello) Pedro Paulo passou 10 anos no cargo.
As imagens de São Francisco de Assis e de Nossa Senhora, em madeira, estão próximas da estante de livros do escritório no 10º andar do Edifício Business Point, onde ele atende diariamente. Tarde de terça-feira, 18 horas. Da vidraça vê-se a terceira ponte sobre o Lago Paranoá e o intenso movimento de veículos no Eixo L2 Sul. A seguir, sua entrevista à Agência Amazônia.
O maior volume de processos de Rondônia que passava por suas mãos relacionava-se com a questão fundiária?
Pedro Paulo
— Sim. A questão fundiária era intensa. Mas havia muitos processos relacionados ao narcotráfico, contrabando, mineração, descaminho de cassiterita, minérios... A mineração era abundante lá.
Como senhor conseguia dirimir os litígios com as questões ligadas à mineração, uma vez que haviam multinacionais envolvidas no Território Federal que proibia a mineração?
Quando chegamos lá [em Rondônia] havia uma empresa nacional que detinha o monopólio da mineração (de cassiterita) em determinada região daquele Estado. Havia também outras empresas que possuíam licença para explorar garimpos de ouro. Essas concessões eram dadas pela União, no entanto, muitas empresas nunca chegaram a fazer a exploração porque não eram de lá. Entre elas estava a C.R. Almeida. Falava-se que havia multinacionais autorizadas a explorar a cassiterita, mas não verificamos isso lá.
É difícil ser juiz na Amazônia?
Não é difícil, apesar de na época em que fui, esses grandes movimentos de não-derrubada da floresta, a lei ambiental estava em pleno vigor. Eu conhecia os problemas da Amazônia, a fauna e a flora, e isso ajudou muito. Conversava muito com as pessoas. Além disso, antes de ser juiz federal fui secretário de Justiça do Acre. Essas experiências facilitaram o meu trabalho de juiz.
O senhor tem um caso emblemático no qual atuou e serviu de exemplo nessa questão da preservação?
Tenho sim. Após a morte de Chico Mendes, no dia 22 de dezembro de 1998, determinei como juiz federal do Acre a desapropriação das terras de Darli Alves da Silva [o fazendeiro foi acusado e condenado a 19 anos pela morte do sindicalista). Acompanhei ainda, como juiz os empates feitos pelo Chico contra as derrubadas da floresta. Esses movimentos foram importantes para frear a onda de devastação da Amazônia, especialmente no Acre. No início dos anos 90, no governo Sarney, a luta desse líder e dos povos das floresta foi reconhecida. O presidente [José] Sarney autorizou a criação da Reserva Extrativista Chico Mendes em uma área de mais de um milhão de hectares. Além dela, participei do processo que criou outra reserva na divisa do Acre com o Amazonas, na região do Céu do Mapiá. Nesse aspecto, os movimentos dos povos da floresta foram importantes; eles ajudaram a criar uma nova consciência ambiental na Amazônia.
Então, o senhor se identifica com esses movimentos...
Sem dúvida. Tenho uma certa identificação. Esses movimentos ajudaram a frear o desmatamento que já era desordenando no Acre, em Rondônia e Mato Grosso. Os movimentos foram fundamentais para a preservação do ecossistema. A Amazônia só ganhou com isso. A região vivia a época da ocupação pelos paulistas (pessoas vindas das regiões Sul e Sudeste para a região).
O senhor conheceu o Raimundo Irineu Serra, fundador da doutrina do Santo Daime. É verdade?
Conheci-o antes de ser juiz federal. Um dia, vindo de uma chácara de Porto Acre parei em sua propriedade. Ele estava sentado em uma árvore, machado do lado, fazendo um cigarro de palha. A cena me vem à mente ainda hoje. Ali naquele momento pude perceber que aquele senhor negro, de quase dois metros, amava a floresta. Conversei algumas vezes com ele e aprendi muito. Seu amor pela floresta me sensibilizou muito quando fui juiz federal. A gente percebia que ele amava a Amazônia. Também aprendi muito com a Contag [Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura] e os sindicatos.
Falando em Chico Mendes, o senhor entrou na Justiça para conseguir uma pensão para a viúva do sindicalista...
Ingressei em 2005 com uma ação em favor da Ilzamar [Gadelha Mendes], viúva de Chico Mendes, para que o governo lhe conceda uma pensão pelo INSS. O valor é pouco mais de
R$ 2 mil mensais. O governo deveria dar preferência ao pedido. Ilzamar vive em situação financeira precária. Usaram o nome do Chico Mendes para fundação, para tudo, mas a família dele está desamparada.
Voltemos aos anos 90, época do governo Collor e aos escândalos de corrupção de PC Farias. Como o caso PC caiu em suas mãos?
Vim para cá [Brasília] como juiz federal. Meus filhos começaram a crescer e a minha esposa queria que fôssemos morar numa cidade com mais oportunidades de estudos. Vim para cá. Aqui assumi a 10ª Vara Federal. Ali estavam vários processos de escândalos de corrupção, processos que envolviam políticos e até empresários. Pensei em vir e voltar para Amazônia, mas assumi uma vara recém-instalada.
E a corrupção daquela época para cá, diminuiu ou piorou?
Piorou. A corrupção no Brasil é sazonal. Seria menor se, diariamente estivéssemos alerta, num estado de profissionalismo seriíssimo — não somente a polícia, mas todas as instituições. Nunca deixou de existir esse lado de querer levar vantagem. O cidadão assume o cargo e não tem condições para nada, e começa a querer a se locupletar, querer levar vantagem em tudo com o dinheiro público. Muitos não assumem o cargo com o múnus público. A grande maioria quer se locupletar, levar vantagem em tudo.
O senhor dá a entender que está na hora de uma Operação Mãos Limpas, a exemplo do que ocorreu na Itália no século passado...
Essa operação mãos limpas a que vocês se referem já começou. Teve no âmbito do Judiciário e da Polícia desde 1993. Porém, é preciso ter em mente que não será só uma geração que vai eliminar esse câncer que contamina a sociedade brasileira. Mas num futuro próximo podemos ver as pessoas vivendo do suor do próprio rosto, sem corrupção, nepotismo, lavagem de dinheiro. Hoje já vemos muitos esquemas desmantelados e quadrilhas presas.
O STF julgou na semana passada os envolvidos no escândalo do mensalão. Além de uma demonstração de independência, o julgamento é uma garantia de que se começa a fazer justiça no Brasil?
O julgamento dos envolvidos no mensalão foi uma prova de independência do Poder Judiciário. É a esperança de que existe justiça. Temos leis fortes, rigorosas e que devem ser aplicadas. O Brasil não precisa de leis; é preciso apenas que as leis sejam aplicadas no devido momento. Aplicando-as corretamente, a corrupção estaria menos arraigada. Quando surgiram esses escândalos do mensalão e sanguessugas eu disse que era formação de quadrilha. Dois anos depois, os ministros do STF confirmaram.
Falta a sociedade se indignar...
A sociedade já está indignada. Prova disso é que muitos políticos não se reelegeram. A sociedade não precisa pegar e armas, ser truculenta. Ela precisa apenas votar corretamente; não votar em corruptos e em pessoas que no seu passado deram demonstração de que querem se locupletar em tudo. Bolsa-Família, vale-gás, vale isso ou aquilo não é solução para reduzir a pobreza. O Brasil precisa de educação, educação, educação. Depois, é preciso garantir saúde e educação. O que falta hoje é pensar o País como um país grande. A sociedade está dando esses sinais quando vai às urnas.
E o Brasil ainda tem jeito?
Tem sim. Para isso é preciso apenas que acreditemos mais em nós. Uma das coisas que nos garante isso é a expressão do voto; o voto correto. E qual é a solução? Criarmos o hábito de não votarmos em corruptos.
Fonte: MONTEZUMA CRUZ E CHICO ARAÚJOwww.agenciaamazonia.com.br

* O conteúdo opinativo acima é de inteira responsabilidade do colaborador e titular desta coluna. O Portal Gente de Opinião não tem responsabilidade legal pela "OPINIÃO", que é exclusiva do autor.

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