Terça-feira, 6 de novembro de 2007 - 06h03
Há pessoas que insistem em dizer que me vanglorio das minhas realizações pessoais e citam exemplos de outros supostamente modestos que não alardeiam seus grandes feitos e as honrarias de que foram alvos. Não poderia haver equívoco maior. Embora nunca me tenha apresentado como um estudioso do tipo beneditino, aquele tipo que se mantém "longe do estéril turbilhão da rua", mais bem admitindo a minha condição de bon vivant e homme à femme que aprecia bons vinhos, bons uísques e até mesmo algumas boas cervejas e que gosta mesmo de dançar no Mandacaru ao aprazível som dos Anjos da Madrugada, sou na verdade um tipo muito discreto, aliás um matuto que passou alguns anos da vida pelas florestas, primeiro como trabalhador rural mesmo e depois como pesquisador de campo de sítios históricos na região do Vale do Guaporé.
Na verdade, para aqueles que acham que me vanglorio de meus feitos, vale lembrar que o pouco que revelo a meu respeito nem de longe reflete a verdadeira história de um menino de origem muito modesta, que nasceu e cresceu no Vale do Guaporé, vivendo num vilarejo onde a escola era de chão batido e construída em regime de mutirão pelos próprios moradores do lugar, aliás lugar que não tinha biblioteca, que não tinha livraria, enfim, sem qualquer infra-estrutura que ensejasse o desenvolvimento intelectual de qualquer jovem. Acontece que, mesmo tendo estudado pelo método de preparatórios à distância (tal como Augusto dos Anjos e outros tantos brasileiros do passado), mesmo havendo passado a infância e a adolescência trabalhando pelas florestas virgens e os seringais, sobrevivendo inclusive ao ataque de uma onça maçaroca quando tinha apenas 17 anos de idade, mesmo havendo deixado o Vale do Guaporé já com 21 anos de idade para obter um Certificado profissionalizante do SENAI que seria o ponto de partida de minha trajetória de homem urbano, eu consegui abrir caminho numa atividade diferenciada que muitos dos que freqüentaram os melhores colégios da mesma época não lograram conseguir. E ninguém poderá jamais esquecer que foi exatamente um homem assim que colocou o nome do Estado de Rondônia no mapa da literatura mundial e nacional. Podem até torcer o nariz e lembrar a minha condição de matuto (que nunca neguei em momento algum), desde que não ofendam a minha raça, podem até tentar esnobar os meus diferenciados conhecimentos de idioma (escrevo correntemente em três, português, francês e espanhol), mas nunca poderão negar que sou de fato um portentoso jabuti encastelado na copa de um frondoso assacu, não porque eu seja excepcionalmente inteligente e sim porque tive de fato excelentes mestres e não desperdicei as poucas oportunidades que tive na vida para acumular conhecimentos. E tais conhecimentos eu os adquiri de fato quando ainda era jovem, por tal razão faço uso deles agora na idade madura.
En revenant à nos moutons, embora eu seja detentor de algumas comendas modestas e até já tenha sido indicado para receber a Medalha do Pacificador, a mais alta condecoração conferida pelo Exército Brasileiro, não sou portador da comenda José do Patrocínio, distinção generosamente distribuída pelo professor Luiz Santos em 1988, durante as festividades do Centenário da Abolição da Escravatura. No entanto, conheço como bem poucos toda a história de tal comenda. Na verdade, os diplomas de tal comenda foram impressos por cortesia na Gráfica Gênese-Top, de propriedade do empresário Ecir Rezende dos Santos ao qual eu prestava assessoria em assuntos de revisão. Supervisionei a impressão do diploma da comenda e até estive relacionado na lista para recebê-la. Contudo, em razão de um fato prosaico, eu não fui agraciado por absoluta recusa de minha parte.
Acontece que, durante os procedimentos de impressão do diploma, eu assisti a um diálogo do professor Luiz Santos com a jovem secretária que o auxiliava, uma senhorita de pouco mais de 17 anos. Eu ouvi quando o professor Luiz Santos disse àquela jovem que iria remunerá-la entregando-lhe um diploma da comenda. Desencantado com aquela situação inusitada, eu cheguei a brincar com Ecir Rezende, dizendo-lhe que a comenda havia nascido já inflacionada e que por isso eu me recusava terminantemente a recebê-la. E recusei de fato a tal comenda. Sei perfeitamente que houve muita gente que recebeu a comenda de boa fé e que por certo também tê-la-ia recusado se soubesse o que eu sabia, mas silenciei por muitos anos a respeito desse folclórico episódio. Prefiro mesmo as distinções que recebi do Exército do Brasil, da Força Naval da República da Bolívia, da Alcaldía de Guayaramerín e de algumas poucas agremiações culturais, bem como a distinção de já haver sido lembrado como candidato à Medalha do Pacificador pelos relevantes trabalhos que prestei ao meu País e à Força Terrestre em atividades para as quais sou competente, mas que nunca fiz alarde delas, prova mais que cabal que nem de longe sou o gabola que alguns apedeutas me acusam de ser. Ego sum qui sum. E o que eu sou mesmo é um jabuti postado na copa de um frondoso assacu. E como jabuti não sobe em árvores, roam-se os monoglotas ressentidos e os poetas menores, porque se estou no alto do assacu e sou um jabuti decerto alguém alçou-me da minha condição de matuto guaporeano para a alta posição de um dos maiores poetas do Brasil, coisa que os franceses já sabiam lá pelos idos de 1999. Alguém ainda deseja tirar o jabuti trepado na árvore? Je ne crois pas...
Fonte: MATIAS MENDES
Membro fundador da Academia de Letras de Rondônia.
Membro correspondente da Academia Taguatinguense de Letras.
Membro correspondente da Academia Paulistana da História.
Membro da Ordem Nacional dos Bandeirantes Mater.
FÉRIAS: Viagem ao Centro do Brasil
Por MATIAS MENDES No mês de julho, de férias, para compensar uma temporada pelas regiões remotas do Guaporé, meti
PEDRAS NEGRAS: Reflexões da Festa do Divino
Por MATIAS MENDES O Distrito histórico de Pedras Negras, no rio Guaporé, entre os dias 15 e 19 de maio, há quase um mês, engalanou-s
BOTAFOGO: O Império da Mística
Por MATIAS MENDES O Botafogo, famoso pela mística que o acompanha, não deixou por menos no ano de 2013, não permiti
Por MATIAS MENDES Dias atrás, neste mesmo espaço de imprensa, eu teci comentários a respeito da situação do muni