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Hiram Reis e Silva

A Terceira Margem – Parte CLXVIII - Foz do Breu, AC/ Manaus, AM ‒ Parte XLIV - Eirunepé, AM – Itamarati, AM I


Comunidade Jacaré - Com. Praia Alta - Gente de Opinião
Comunidade Jacaré - Com. Praia Alta

Bagé, 09.03.2021

 

Foz do Breu, AC/ Manaus, AM ‒ Parte XLIV

 

Eirunepé, AM – Itamarati, AM I

 

Antes de iniciar este artigo, queremos direcionar nossas preces a todos os familiares e amigos envolvidos direta ou indiretamente no trágico incêndio da Boate Kiss, em Santa Maria, RS, e, em especial, pelo pronto restabelecimento de nossos diletos ex-alunos do CMPA Guilherme e Emanuel Pastl. Que o Grande Arquiteto do Universo fortaleça, ilumine e guarde a querida família de nosso grande amigo, parceiro de épicas jornadas pela Laguna dos Patos, Coronel PM Sérgio Pastl e sua dileta esposa Sr.ª Anaclaci de Almeida Pastl.

 

21.01.2013 – Eirunepé – Comunidade Aquidabã

 

Antes das 05h30, eu e o Marçal nos deslocamos até o Posto da Polícia Militar para preparar os caiaques para a nova jornada enquanto o Mário aguardava, no Hotel Líder, a viatura da PM para carregar o material para a lancha de apoio ancorada em um Porto do Lago dos Portugueses. Os policiais só estavam aguardando a hora combinada para iniciar a operação e avisar o Tenente Ricardo que foi pessoalmente se despedir dos expedicionários. Levamos os caiaques para a escadaria da orla, enquanto o Mário foi conduzido na camionete da PM até onde estava aportada a lancha. O Mário, depois de deixar pronta a embarcação para a nova jornada, aportou a “Mirandinha” na orla e concluímos os preparativos.

 

Antes de partirmos, o Tenente PM Ricardo recomendou que, em Itamarati, procurássemos o Sargento PM Barbosa. Despedimo-nos dos prestativos amigos da Polícia Militar, sempre prontos a nos auxiliar nestas amazônicas missões. Uma chuvinha fina nos acompanhou durante todo o percurso arrefecendo salutarmente nossos corpos. Passamos pela Foz do Tarauacá e sentimos nossos caiaques melhorarem seu desempenho graças à energia adicional deste magnífico tributário do Juruá. A navegação continuou sem grandes novidades, exceto pela passagem das barulhentas araras, das magníficas garças jangadeando graciosamente nos troncos levados pela torrente e do coral de guaribas que nos acompanhou durante todo o dia. Pena que a caça indiscriminada destes macacos cantores os tenha afastado das margens do Juruá em todo o Acre e, no Norte do Amazonas, nos Municípios de Guajará e Ipixúna.

 

Confirmamos, na Comunidade Pau D’alho, a localização de Aquidabã, nosso destino, e, novamente, na Comunidade Morada Nova. Nesta última, uma das moradoras alertou-nos que o casarão era mal-assombrado e recomendou que procurássemos abrigo em outro local. Por volta das 12h40, avistamos, no alto de um morro, o grande e majestoso casarão de madeira ([1]). Tínhamos percorrido 72 km. A dificuldade, agora, consistia em carregar nossas tralhas até ele pela trilha íngreme e escorregadia, mas resolvemos acantonar por ali mesmo já que, nestes “ermos sem fim”, as opções de encontrarmos abrigo noutro local antes de escurecer eram pequenas.

 

Ajudei os guerreiros Mário e Marçal a carregar a primeira leva do material e permaneci no casarão para fazer uma limpeza sumária, varrendo a casa com uma vassoura improvisada de cacho de açaí. A quantidade de grandes aranhas, morcegos e penas de urubu cuidadosamente unidas com uma fibra negra espalhadas pelos quatro cantos da morada emprestavam um sinistro ar ao abrigo. O Mário não se abalou e foi para um canto da varanda pedir autorização para o guardião espiritual do local. Se o procedimento foi necessário e se surtiu o efeito desejado ou não jamais o saberemos, o fato é que passamos uma noite bastante agradável neste esplêndido casarão abandonado que possui de seu avarandado uma belíssima vista do Rio. A construção de madeira de lei, os detalhes das amplas aberturas (janelas e portas) sextavadas e a perfeição da construção das tesouras que suportam o telhado de telhas de barro mostravam a qualidade técnica e material de uma residência que foi construída com muito esmero. Nos mapas do DNIT, a Comunidade consta como ativa embora esteja abandonada há anos. Colhemos, para a viagem, no variado pomar, algumas goiabas, açaís, limas e graviolas.

 

22.01.2013 – Com. Aquidabã – Com. Jacaré

 

Quando acordei, por volta das seis horas, meus fiéis parceiros já estavam ultimando os preparativos da “Mirandinha”. A chuva que se iniciara na véspera de nossa partida só havia dado uma pequena trégua quando já havíamos carregado todas as tralhas para o casarão e eu me preparava para colher a água numa calha improvisada para um banho restaurador sem ter de escalar a íngreme e enlameada encosta até o Rio – artimanhas de São Pedro.

 

A chuva parece servir de estímulo aos macacos cantores e o coral de guaribas ecoava de uma e de outra margem, como se grupos rivais estivessem disputando o prêmio de melhor arranjo e harmonia.

 

O mapa do DNIT nos indicava a Comunidade Jacaré como a melhor alternativa para nossa próxima progressão em relação à distância e ao fato de a mesma possuir uma escolinha onde poderíamos acampar sem incomodar os amigos ribeirinhos, opção que foi confirmada em mais de uma oportunidade nas Comunidades pelas quais passamos.

 

Na Comunidade Jacaré ([2]), o Sr. Antônio Francisco Santos Guimarães prontamente autorizou acantonarmos na escolinha. Descarregamos a tralha e o Mário, imediatamente, iniciou a montagem da barraca. Percorrêramos 83 km.

 

Após um revigorante banho de Rio, eu fui atualizar os dados obtidos no trajeto, dentro da barraca protegido dos terríveis piuns; o Marçal foi preparar nosso “almojanta” e o Mário, nosso homem da Comunicação Social, parlamentar com nossos anfitriões.

 

Depois da refeição, fomos até a casa do Sr. Antônio Francisco conversar um pouco. Nesta ocasião, ele disse que nós não devíamos nos preocupar tanto com o fato de a Comunidade selecionada ter ou não escola porque ninguém, nas barrancas do Juruá, deixaria de oferecer abrigo aos navegantes. Verificaríamos, mais tarde, no decorrer de nossa viagem, que o hospitaleiro ribeirinho estava apenas parcialmente com razão.

 

23.01.2013 – Comunidade Jacaré – Praia Alta

 

A chuva persistia e só parou quando nos aproximamos de nosso destino. Os botos continuavam nos acompanhando como de costume. Os tucuxis realizavam audaciosas acrobacias enquanto os vermelhos pareciam se divertir soltando seus bufos ou emergindo muito próximos aos caiaques. Pena que o ruído irritante das rabetas, que de tempos em tempos passavam, interrompesse repentinamente estes idílicos momentos. Pretendíamos estacionar na Comunidade Soledade (mapa do DNIT), mas fomos informados na Comunidade “Praia Alta” ([3]), localizada a 500 m a montante dela, que a mesma não mais existia. O Mário estabeleceu os contatos necessários e imediatamente os ribeirinhos se mobilizaram para deixar a escolinha em condições de nos receber. Praia Alta está localizada, praticamente, na fronteira do Município de Eirunepé e Itamarati. A passarela de madeira precisa de reparos imediatos, pois as tábuas soltas já provocaram alguns acidentes. Tomamos banho no Igarapé Preto, pois as águas contaminadas do entorno da Comunidade não eram, absolutamente, próprias para o banho, depois prosseguimos nossa espartana rotina. Foi um trajeto curto, de apenas 56 km.

 

Solicito Publicação

 

(*) Hiram Reis e Silva é Canoeiro, Coronel de Engenharia, Analista de Sistemas, Professor, Palestrante, Historiador, Escritor e Colunista;

·     Campeão do II Circuito de Canoagem do Mato Grosso do Sul (1989)

·     Ex-Professor do Colégio Militar de Porto Alegre (CMPA);

·     Ex-Pesquisador do Departamento de Educação e Cultura do Exército (DECEx);

·     Ex-Presidente do Instituto dos Docentes do Magistério Militar – RS (IDMM – RS);

·     Ex-Membro do 4° Grupamento de Engenharia do Comando Militar do Sul (CMS)

·     Presidente da Sociedade de Amigos da Amazônia Brasileira (SAMBRAS);

·     Membro da Academia de História Militar Terrestre do Brasil – RS (AHIMTB – RS);

·     Membro do Instituto de História e Tradições do Rio Grande do Sul (IHTRGS – RS);

·     Membro da Academia de Letras do Estado de Rondônia (ACLER – RO)

·     Membro da Academia Vilhenense de Letras (AVL – RO);

·     Comendador da Academia Maçônica de Letras do Rio Grande do Sul (AMLERS)

·     Colaborador Emérito da Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra (ADESG).

·     Colaborador Emérito da Liga de Defesa Nacional (LDN).

·     E-mail: [email protected].

 



[1]   Aquidabã: 06°31’40,7” S / 69°40’04,6” O.

[2]   Comunidade Jacaré: 06°33’17,0” S / 69°21’42,6” O.

[3]   Comunidade Praia Alta: 06°36’24,7” S / 69°08’34,1” O.

Galeria de Imagens

  • Eirunepé – Comunidade Aquidabã
    Eirunepé – Comunidade Aquidabã
  • Eirunepé – Comunidade Aquidabã
    Eirunepé – Comunidade Aquidabã
  • Comunidade Aquidabã - Com. Jacaré
    Comunidade Aquidabã - Com. Jacaré
  • Comunidade Aquidabã - Com. Jacaré
    Comunidade Aquidabã - Com. Jacaré
  • Acantonamento na Comunidade Aquidabã
    Acantonamento na Comunidade Aquidabã
  • Acantonamento na Com. Jacaré
    Acantonamento na Com. Jacaré
  • Comunidade Aquidabã - Com. Jacaré
    Comunidade Aquidabã - Com. Jacaré
  • Comunidade Praia Alta
    Comunidade Praia Alta

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