PORTO VELHO – A VITÓRIA DO 55

Por Francisco Matias(*)

1. Eis a questão: no dia 28 de fevereiro 2010, os porto-velhenses votaram maciçamente no 55, respondendo Sim à pergunta sobre a criação do município de Extrema de Rondônia. 55 era o Sim, 77 o não. Até aí tudo bem, tudo certo não houvesse uma questão maior embutida na pergunta. O povo foi às urnas e entendeu, cravou o 55 na telinha da urna eletrônica. Deu o 55 na cabeça! Mas, conversando com um grupo de eleitores que moram no baixo Madeira, mais precisamente na Gleba Cuniã, área rural do município de Porto Velho, pude notar o grau de desconhecimento sobre a questão e o voto. Um deles foi taxativo: “votei no 55 porque se desse o 77 Extrema seria do Acre”. Opa!. Epa! Voto é voto, mas consciência eleitoral é mais importante. No dia seguinte, perguntei a um grupo de jovens estudantes aqui da cidade de Porto Velho quantos municípios tem o Estado de Rondônia. A resposta foi curta e grossa; “Agora são 53. Epa! Opa! O grau de desconhecimento aparenta ser bem maior do que se poderia imaginar. Enquanto uns votaram pensando em “evitar que Extrema seja do Acre”, outros votaram “para a criação imediata do município”. Nem tanto ao rio, nem tanto à floresta. A vitória maciça do 55 mostra que o povão continua sendo massa de manobra eleitoreira e, neste caso, plebiscitária. Não houve, por algum motivo, o esclarecimento ao eleitorado porto-velhense, que pela primeira vez participou de um plebiscito deste tipo. Nunca antes neste município se votou para um desmembramento territorial, dos muitos que ocorreram desde 1977. Este era o objetivo do voto: o desmembramento territorial. Mas, alguma coisa impediu que a questão fosse colocada desta forma.

2. Porto Velho é o município mais extenso de Rondônia, com 34.082 quilômetros quadrados. Maior que os estados de Sergipe e Alagoas, por exemplo. Sua população é de 383 mil habitantes, segundo o IBGE 2009, maior que a do estado de Roraima. O contingente eleitoral representa 24% do Estado. Até 1977, era o maior município do mundo em extensão territorial, com 183 mil km². A partir desse ano começaram os desmembramentos territoriais e Porto Velho cedeu terras para a criação dos municípios de Ariquemes, Ji-Paraná, Cacoal, Pimenta Bueno e Vilhena. Na década de 1990, por conta da criação dos municípios de Candeias do Jamari, Itapuã do Oeste, Buritis e Campo Novo de Rondônia, mais uma vez Porto Velho sofreu redução em se espaço físico, na medida em que estes municípios saíram de suas entranhas, totalizando oito os municípios criados em áreas desmembradas Porto Velho. Agora é a vez de Extrema de Rondônia. Mas não tão agora assim. Para ser criado o município será necessário que se altere a constituição federal, depois que seja aprovada uma Lei Complementar Federal e, depois - bem depois - uma Estadual. Até que isto aconteça, muita água vai rolar por debaixo da futura ponte do Madeira. Quem viver, verá.

3. Extrema era um seringal, denominado Extrema do Acre, no vale do Abunã, surgido no final do século XIX, durante o 1º. Ciclo da Borracha. Seu último proprietário foi o seringalista Otávio Reis, que dominava o comércio da borracha na região e foi vereador à primeira câmara municipal de Porto Velho, em 1915. O seringal Extrema tinha várias colocações, como Rosário da Índia, Tracuá, 2 de Dezembro e Maravilha. Mais abaixo, havia o seringal Mocambo, cujo proprietário era Néri Sampaio, juiz de Paz da comarca de Santo Antonio do Madeira,MT. Pois bem. Ao redor dos barracões do seringal Extrema do Acre foram surgindo núcleos de povoamento, marcando o processo inicial de urbanização que resultaria na vila de Extrema, a mais desenvolvida da Ponta do Abunã, que conta ainda com as vilas de Vista Alegre, Fortaleza do Abunã e Nova Califórnia. Eis um problema neste emaranhado todo: Nova Califórnia. Vamos entender o por quê.

4. A vila de Nova Califórnia está situada 64 km acima da de Extrema, bem na fronteira de Rondônia com o Acre. O surgimento deste núcleo populacional deu-se em meados da década de 1980, no entorno da Serraria Califórnia. A região é rica em madeiras nobres. Pois é. Nova Califórnia é um dos distritos porto-velhenses que deverão integrar-se ao futuro município de Extrema de Rondônia. Até aí tudo bem, não fosse um pequeno detalhe: a Assembleia Legislativa acaba de divulgar que o projeto de lei dispondo sobre a criação do município de Nova Califórnia está tramitando naquela Casa de Leis. Epa! Opa! Nem bem se pretende serenar os ânimos políticos da Ponta do Abunã e já surge mais um dado complicador. Nova Califórnia não quer ser distrito. Quer ser município. Não quer pertencer a Porto Velho e nem a Extrema. Quer ter vida própria. E tem lá suas razões. Além de madeira, a região tem outras riquezas, como gado bovino, frigoríficos, laticínios e agricultura. Para ter uma ideia, Porto Velho é o município com o maior plantel bovino do Estado, cerca de 680 mil cabeças. Neste contexto, os distritos de Extrema e Nova Califórnia detêm 50% desse rebanho. Portanto, é justo que Nova Califórnia queira também ser emancipada. Ah!, mais um detalhe: sabe aqueles quase 300 índios que fecharam a BR 364 e botaram policiais rodoviários pra correr? A maioria habita a região do rio Marmelo, na porção territorial de Nova Califórnia. Se o plebiscito foi para serenar ânimos e segurar os índios, Nova Califórnia pode reacender a chama da discórdia. Alguém aí duvida?

Historiador e analista político(*)