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Antônio Cândido

2008 – O ANO DO CENTENÁRIO


O ano de 2007 chegou ao fim, levando consigo a oportunidade de comemorarmos o primeiro centenário de um dos fatos mais importantes da história de Porto Velho e de Rondônia: o início da construção da Estrada de Ferro Madeira-Mamoré, fato que tem seu marco no dia 21 de junho de 1907.

Tal festividade foi toda programada para o dia 4 de julho do ano que passou, mas para comemoração do centenário do surgimento de Porto Velho, o que na verdade só acontecerá neste ano de 2008.

Como fui a única voz discordante no que diz respeito a esta última data, e ao que consta também pela causa do cancelamento de tal festividade, vi recair sobre mim o rancor, o desprezo e até mesmo a falta de respeito em relação ao trabalho de pesquisa que venho realizando sobre o assunto.

De qualquer sorte, no entanto, a minha discordância acabou provocando a realização de um seminário que, se não levou, por enquanto, a nenhum resultado prático, deu-me a oportunidade de mostrar ao público o meu ponto de vista, apesar daqueles que, apegados a uma linha de pensamento radical, negaram-se e negam-se a analisar com mais vagar as minhas proposições.

Diante das provas documentais, em meu sentir inquestionáveis, as quais inclusive foram colocadas à disposição do público através de site local, a linha que passaram a adotar foi a de tentar desmoralizar o meu trabalho, às vezes com agressão pessoal e depois com um silêncio maroto em torno do assunto.

O fato é que Porto Velho, no dia 16 de janeiro do corrente ano estará completando cem anos de existência. Tudo está a indicar, mesmo diante da importância da data, que por conta do desentendimento que ocorreu a nossa cidade não será objeto de festividade em seu primeiro centenário, devido a essa birra tola, a qual só serve de galhofa aos que chegam de fora.

A propósito, no dia 26 de dezembro de 2007 tomei conhecimento, através da televisão, de que o município de Fortaleza-CE estará dentro de alguns dias fazendo uma correção histórica de 121 anos.

Pela internet consegui acessar o site da Câmara Municipal de Fortaleza e do pesquisador Adauto Leitão. Este, através de fragmentos encontrados do Fortim de Santiago, construído da Barra do Ceará em 25 de julho de 1604, conseguiu provar que essa foi a primeira construção do município e que, portanto, Fortaleza passaria a ter 403 anos e não 282 como se acreditava.

Diz o historiador que capitais como São Luiz, Recife, Salvador, Rio de Janeiro e São Paulo comemoram seus aniversários na data de fundação. Fortaleza estaria entre aquelas que optaram pela data da Carta Régia que a transformou em Vila. Segundo Adauto Leitão, esta seria, portanto, uma boa oportunidade para que o erro fosse corrigido.

Entre um acontecimento e outro teriam se passado 121 anos, tempo que o silêncio guardou para que alguém descobrisse um pedaço de argamassa por ocasião da construção de uma praça no local, inaugurada em 25 de julho de 2004, e desce início a uma pesquisa que envolveu análise para constatar  a presença de materiais orgânicos, visando encontrar componentes do óleo de baleia utilizado nas construções da época do Fortim de Santiago.

Pois muito bem. Contrariamente à atitude de Adauto, em vez de aprofundarmos as nossas pesquisas para descobrirmos mais verdades da nossa história, estamos em vez disso, como "burros empacados", sem sabermos o que decidir com duas datas em que o tempo decorrido é de apenas 196 dias (aquela de 4 de julho de 1907 e a outra de 16 de janeiro de 1908). Isso se tem dado ora pela falta de diálogo, ora pela falta de humildade em não querermos admitir que estamos errados em alguma coisa, e por culpa disso deixamos de prestar homenagens àqueles que nos precederam e conquistaram aquilo que, graças a eles hoje é nosso, de fato e direito.

Há, também, os que entendem que este é um assunto de importância menor, que não valeria a pena se promover uma discussão sobre isso, julgando existirem coisas mais valiosas para serem esclarecidas. Estes se esquecem, todavia, de que a história é constituída de fatos que se entrelaçam e, portanto, todos os acontecimentos são importantes e devem ser investigados.

Eu, por exemplo, sempre me posicionei contrário à idéia de que ainda existe alguma prova material da construção de Balsemão, povoado que D. Luiz Pinto de Souza Coutinho, governador da Capitania do Mato Grosso mandou construir no ano de 1768, no Salto do Jirau. No entanto, há historiadores que acreditam que se deva constituir uma expedição em busca dessas provas. Por mim, nada a opor. E se as pesquisas dessa expedição, nos moldes do que foi feito em Fortaleza, provarem a existência de algum vestígio do referido povoado, não terei nenhum constrangimento em aceitar os resultados.

Quanto às datas inicialmente citadas, tenho certeza de ter feito a minha parte nessa conturbada discussão. Tornei público as minhas pesquisas e coloco-me, como sempre fiz, à disposição de quem se interessar no sentido de trocar informações ou documentos pertinentes a esse e outros assuntos.

Entre as inúmeras obras que possuo, inclui-se o livro de memórias intitulado "Reminiscências da Madmarly", de Hugo Ferreira. Nessa obra encontramos um capítulo intitulado "A Madeira-Mamoré e suas lendas", e nela a transcrição da carta de Antônio Borges, documento via do qual vários escritores e historiadores se baseiam para justificar o surgimento de Porto Velho no dia 4 de julho de 1907.

A impressão que se tem é de que as pessoas que defendem esse ponto de vista não observaram que o título do livro já nos conduz a lê-lo como um punhado de lembranças, de memórias vagas e vivências do senhor Hugo Ferreira, tanto que o capítulo da obra em questão traz o sugestivo título de "A Madeira-Mamoré e suas lendas".

Nesse particular, a única certeza que fica traduzida é de que não leram a carta do Senhor Antônio Borges, já que em nenhum momento ele ali fala de 4 de julho ou de "prego de prata" para justificar aquilo que nem mesmo lenda é.

Com humildade, portanto, convoco os senhores escritores, historiadores, doutores, professores e pessoas interessadas nesse assunto, para que promovam sem paixão uma releitura desse e de outros temas pertinentes, quando então terão a oportunidade de verificar os equívocos que existem em relação à nossa história, os quais, por obra de muitos, infelizmente terminaram por fazer parte da mesma.

A história de Rondônia, sobretudo àquela que diz respeito a Porto Velho, parece ter várias vertentes, e a maioria dos escritos é constituída de textos ou informações copiados uns dos outros, ganhando depois contornos de verdades absolutas que não podem ser questionadas, investigadas ou reescritas, dando a impressão de que a nossa história é definitiva, quando se sabe que a pesquisa histórica desconhece "o não há mais o que fazer".

Não vamos citar nomes, mas, vale lembrar que todos aqueles que escreveram a respeito do "4 de julho ou prego de prata", buscaram tal informação em Hugo Ferreira ou em alguém que em seu livro tenha feito a mesma coisa.

Porque será que ninguém duvidou dessa informação se o próprio Hugo intitulou o seu livro de reminiscências...?

Que Hugo Ferreira foi um homem íntegro, honesto e merecedor de crédito naquilo que dizia, não há negar e, justamente por isso, escolheu de maneira consentânea o título do seu livro.

O certo é que, por causa da interpretação dada ao texto de Hugo Ferreira, criou-se mais uma "lenda" na história de Porto Velho (esta da data de 4 de julho) para fazer companhia a tantas outras que, infelizmente, encontram defensores entre os responsáveis em passar para a posteridade a verdade histórica das nossas origens.

É hora da Academia de Letras de Rondônia, Instituto Histórico e Geográfico de Rondônia, historiadores, professores e interessados na nossa história, unirem-se para por um fim a essa confusão e assim, quem sabe, se não pudermos comemorar o correto "centenário" de Porto Velho, pelo menos poderemos com certeza soltar fogos e discursar nos seus 101 anos, 102... Se Deus quiser. E Ele há de querer. Saúdo-te, então, Porto Velho, por completares 100 anos. Parabéns, brava gente de Rondônia!

Fonte - Antônio Cândido da Silva
Membro da Academia de Letras de Rondônia
Membro da União Brasileira de Escritores – UBE – RO. 
CONTATO:
[email protected]

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