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Abnael Machado

A Capelinha do Cemitério dos Inocentes


O Cemitério dos inocentes foi criada em 1915, pelo Superintendente (prefeito municipal), Major Guapindaia, instalando-o em uma quadra de 9.900 m2 , situada na periferia do povoado de Porto Velho, vizinha ao Mocambo, atualmente limitada ao Norte pela rua Almirante Barroso, ao Sul e ao Leste pela rua Treze de maio e ao Oeste pela rua Prudente de Morais.  Era mais uma das obras de estruturação urbana de atendimento social aos seus moradores, superando as dificuldades de acesso ao Cemitério de Santo Antônio  situado a mais de oito quilômetros, e a exigência de Autorização da Madeira-Mamoré para o sepultamento, visto esse situar-se em local de sua propriedade.

Dia 23 de novembro  do ano em curso, fui ao cemitério acompanhando o féretro do cortejo fúnebre do amigo Walter Bártolo.  Ali transitando entre jazigos identificando as de caros amigos, rememorando suas vidas, seus modos de agirem e de serem.

Adentrei na capelinha humilde e silenciosa, alheia à sua relevância histórica, relembrei os episódios relacionados ao planejamento e as ações para sua construção.

A professora Tevelinda expôs ao seu pai sobre a necessidade de ser construída uma capela no cemitério, proporcionando às pessoas um local apropriado para as práticas religiosas e os velórios de seus familiares e de deus amigos.  Ele ponderou, ter ela ciência dos parcos recursos financeiros do município.  Porém ia verificar se havia possibilidade de atendimento.  Posteriormente, lhe informou não dispor de recursos para a execução da obra.

Ela não desistiu do seu objetivo, organizou um comitê prol construção da capela do Cemitério dos Inocentes, o qual definiu as estratégias de ações, competindo a uma equipe angariar donativos em moeda corrente, outra adquirir materiais, o mestre José Riberio de Souza Junior e o empresário Pedro de Renda Alves competia construírem o prédio em alvenaria de tijolo.

A Tevelinda liderando a primeira equipe iniciou a sua coleta de donativos pelas casas comerciais da rua da palha (atual Natanael de Albuquerque), com sucesso, obtendo animado resultado.  Dirigiu-se aos comerciantes da rua dos portugueses (atual Barão do Rio Branco), numa das mercearias, seu proprietário, um português  a destratou com descabidos impropérios.  Ela ofendida foi à Superintendência (prefeitura), comunicando a seu pai sobre a ocorrência.  O major Guapindaia chamou o tenente Aristide leite, delegado de polícia e mandou prender o detrator e quem tentasse impedir, recolhendo-os a cadeia e aplicando-lhes uma corretiva surra com chicote de umbigo de boi, a ordem foi executada.  Os demais portugueses protestaram e revoltados decidiram libertar seus conterrâneos.  Para tanto se armaram com rifles 44 papo amarelo, lhes cedidos pelos administradores da Madeira-Mamoré.

O major Guapindaia se entrincheirou para enfrenta-los.  Porém foi notificado que os revoltosos haviam sequestrado um funcionário municipal, o tendo como refém e o delegado havia fugido.  Mediante tal situação, mesmo contrariando os seus brios de denodado soldado vencedor das batalhas contra  os militares do exército peruano nos confrontos bélicos no alto Rio Juruá, não tinha outra alternativa, a não ser a de aceitar a libertar os presos em troca do sequestrado e do cessamento de quaisquer ações bélicas.  Os beligerantes entraram em acordo restabelecendo-se a paz.

O episódio se revelou favorável ao alcance do objetivo da Tevelinda, visto que os moradores do povoado de Porto Velho dos brasileiros, em solidariedade a Guapindaia e repúdio a atitude dos comerciantes portugueses e dos seus apoiadores da Madeira-Mamoré, passaram a fazer doações, contribuindo para que em três meses a capela fosse construída e inaugurada com celebração de missa festiva pelo pároco de Humaitá.

No decorrer dos seus noventa e sete anos, tem passado por reformas e remodelações, porém mantendo-se no mesmo local no qual foi edificada.

Eu no interior da singela capelinha, recordando o seu nascimento, gerando quase uma tragédia, nesta nossa Porto Velho tão abundante de causos, mitos e histórias, algumas trágicas outras cômicas, e muitos dos seus atores descansam para sempre, ao seu derredor em jazigos suntuosos e humildes sepulturas, quase todos relegados ao umbrático do esquecimento.

O Cemitério dos Inocentes integra o patrimônio histórico de Rondônia, tombado conforme dispõe o artigo 264 da Constituição do Estado de Rondônia.  É uma das mais intocáveis propriedades da comunidade portovelhense.

Abnael Machado de Lima

Membro fundador da Academia de Letras de Rondônia

* O conteúdo opinativo acima é de inteira responsabilidade do colaborador e titular desta coluna. O Portal Gente de Opinião não tem responsabilidade legal pela "OPINIÃO", que é exclusiva do autor.

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