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Crônica

A janela dos setenta


William Haverly Martins - Gente de Opinião
William Haverly Martins

Aos setenta, a janela da vida perde o tamanho e o formato, e se posiciona num espaço entre brumas, que camuflam a vista. Quase sempre, só se vê a vista se o olhar estiver em sentido contrário, voltado para dentro. Na janela invertida dos setenta vê-se o que já passou, as vistas aparecem em forma de memórias.

Não! Não se trata de cegueira gradativa, apesar da catarata existencial, um bisturi a laser e uma nova lente poderão restituir a limpidez das imagens, mas serão imagens viciadas, que não possuem o mesmo valor sentimental das lembranças estacionadas no córtex cerebral.

A inversão não é culpa de ninguém, quando já se trilhou a maior parte da estrada da vida, é normal que se olhe mais constantemente para trás, é lá que estão as cores da infância, o vigor da juventude e os sonhos da maturidade: raízes progressivas e orientadoras da caminhada.

O passado também é a morada de muitos amigos, foram eles que amainaram a travessia. Muitos ficaram às margens, em terras distantes, alguns te viraram as costas, não eram amigos, outros se foram para sempre, sequer tiveram tempo para despedidas. Se ainda te restaram alguns, cuida bem da espécie, pois são a essência do bem, a melhor vista antes de fecharmos as janelas da última morada.

A janela da atualidade, aos setenta, projeta vistas, através de esperanças cansadas, perigosas, que podem levar o homem à loucura. É preciso ocupar o cérebro, que não controla as dores da gota, a expectativa de um infarto fulminante, o temor de um câncer prostático broxante. É preciso vigiar os sonhos, acordado, para que eles, em não se realizando, não te desesperem.

Apesar dos setenta, o tempo e a esperança necessitam ser administrados com vigor produtivo e esforço pessoal, para que, ao serem filtrados pela janela da existência, produzam vistas gratificantes.   

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